São Paulo, década de 1980. O Brasil vive uma de suas piores crises e Hebe Camargo (1929-2012) aparece na tela exuberante: é a imagem perfeita do poder e do sucesso. Ao completar 40 anos de profissão, perto de chegar aos 60 anos de vida, está madura e já não aceita ser apenas um produto que vende bem na tela da TV. Mais do que isso, já não suporta ser uma mulher submissa ao marido, ao salário, ao governo e aos costumes vigentes.
Este é o enredo de “Hebe – A estrela do Brasil”, que estreia nesta quinta-feira, 26 de setembro, nas salas de cinema de todo o Brasil, inclusive em Ribeirão Preto – estará em cartaz nas redes UCI (RibeirãoShopping), Cinemark (Novo Shopping) e Cinépolis (Shopping Santa Úrsula e Shopping Iguatemi). A direção é de Maurício Farias, com sua esposa Andrea Beltrão no papel principal, Marco Ricca, Danton Mello, Daniel Boaventura, Felipe Rocha e Otávio Augusto, entre outros
Durante o período de abertura política do país, na transição da ditadura militar para a democracia, Hebe aceita correr o risco de perder tudo que conquistou na vida e dá um basta: quer o direito de ser ela mesma na frente das câmeras, dona de sua voz e única autora de sua própria história. Entre o brilho da vida pública e a escuridão da dor privada, Hebe enfrenta o preconceito, o machismo, o marido ciumento, os chefes poderosos e a ditadura militar para se tornar a mais autêntica e mais querida celebridade da história da nossa TV: uma personagem extraordinária, com dramas comuns a qualquer um de seus milhões de fãs.
O filme dirigido por Maurício Farias (“O coronel e o lobisomem”), com roteiro de Carolina Kotscho (“Dois filhos de Francisco”), faz um recorte da vida da apresentadora na década de 1980. O objetivo é mostrar a transição da ditadura para a democracia no Brasil, enquanto Hebe é apresentadora na Band e no SBT. Nas cenas do lado profissional, Andrea Beltrão interpreta uma Hebe que, no filme, desafia a ditadura e fala tudo o que pensa, mesmo quando recebe ameaças da censura.
A frase mais famosa está lá: “A Hebe não é de direita, a Hebe não é de esquerda. A Hebe é direta”. Em outra parte, ela abandona uma das emissoras dizendo que não aguenta mais ser censurada. Não queria mais fazer programas gravados. A apresentadora que lutava a favor das minorias também ganha espaço no roteiro, levantando a bandeira LGBT em momentos como na participação da modelo transexual Roberta Close (Renata Bastos). Ela também defende seu cabeleireiro Carlucho (Ivo Müller).
As cenas que mostram Hebe em família talvez sejam as que mais chamem a atenção do público. Elas retratam uma mulher que pouca gente conhecia, longe dos holofotes. Andrea vive com intensidade os momentos em que Hebe sofria com o machismo, agressões e o ciúme excessivo de seu segundo marido, Lélio Ravagnani (Marco Ricco). Marco se destaca na atuação, com um discurso do homem abusivo que faz tudo “por amor”.
Hebe mãe, tia e amiga também são retratadas. O filme mostra bem sua relação com Marcello (Caio Horowicz), seu único filho da relação com o primeiro marido, Décio Capuano (Gabriel Braga Nunes). A história também destaca a relação com o sobrinho e coprodutor do filme Claudio Pessutti, vivido por Danton Mello. Ele foi seu braço direito em toda vida, ajudando a tia a pensar grande.
O trio formado por Hebe, Nair Bello (Claudia Missura) e Lolita Rodrigues (Karine Teles) é lembrado, mas não o tanto que deveria. É natural sentir falta de outros momentos do trio, ainda mais após a viralização na internet de uma divertida entrevista das três para Jô Soares. Outra Hebe apresentada ao público no filme é a que bebia demais. São muitas as cenas em que a apresentadora aparece com copo na mão e embriagada. Os planos de cenas desses – muitos – momentos colocam o telespectador quase como um companheiro de drinques de Hebe.
Chama a atenção também o excesso de cigarro, que era permitido em ambientes fechados. Umas das convidadas de um dos programas até aparece fumando durante a entrevista ao vivo, assim como produtores e diretores. Os selinhos distribuídos por Hebe Camargo na vida real são escassos no filme. O único que ganha o famoso beijinho da apresentadora é o cantor Roberto Carlos (Felipe Rocha, impecável na pele do rei, assim como Otávio Augusto na de Chacrinha).
A quase ausência dos beijos resume bem a Hebe recriada por Andrea Beltrão para o cinema. Diferentemente de outros atores que quase imitam o biografado, Andrea traz uma Hebe com um toque diferente em cena. Não que isso piore sua atuação. A atriz não é a exata personificação da apresentadora (não há sequer o jeito inconfundível de Hebe ao falar “gracinha”), mas aparece sempre com o mesmo tom exagerado e extrovertido.