Tribuna Ribeirão
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Gratidão infinita! 

Pe. Gilberto Kasper *
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Lembro-me que em 1965, quando eu tinha 8 anos de idade, um de nossos passeios dominicais foi andar 8 Km entre Novo Hamburgo e São Leopoldo no Rio Grande do Sul, seguindo pela BR 116 interditada, porque tomada de água suja em ambos os lados, tamanha a enchente que tomava conta das duas cidades. Uma multidão transitava a pé, pela Rodovia, ainda de pista dupla, com expressões, as mais diversas, vendo aquela enchente que cobria as casas até seus telhados. O Rio dos Sinos, que percorre por todo o Vale dos Sinos onde estão situadas as duas cidades: Novo Hamburgo e São Leopoldo numa distância de 8 Km, transbordara como nunca antes. Outras enchentes ocorriam anualmente, porém aquela, diziam os mais velhos, teria sido a maior desde o ano de 1941. Andávamos perplexos entre a multidão olhando para os dois lados da Estrada. Era, diga-se de passagem, um passeio mais do que estranho. Mas nossos avós e nossa mãe nos levavam para suscitar em nós a sensibilidade e o espírito de solidariedade para com as milhares de pessoas na época chamadas de “flagelados”. Pessoas que perderam tudo para as águas violentas que invadiam e cobriam suas casas.

Em nossas orações, pedíamos pelos desabrigados e que jamais nós passássemos por situações semelhantes. Na medida em que crescemos, as enchentes foram ficando mais intensas, violentas e agressivas, não obstante as promessas dos que governavam o Estado, prometiam repetidamente, que aquilo jamais voltaria a acontecer. Gastaram bilhões incontáveis na construção de Diques, Proteções e Contenções de enchentes, as mais diversas.

Estarrecidos assistimos a devastação do Vale do Taquari em setembro do ano passado. O que não imaginávamos, é que na madrugada do dia 3 de maio passado, meus dois irmãos, Querino e Elário Kasper, também se tornariam vítimas da enchente que assombrou não apenas um dos Vales, mas o Estado inteiro do Rio Grande do Sul. Precisaram sair às 3h50 do apartamento onde residiam no Condomínio Princeza Isabel no Bairro Santo Afonso, há 2 Km do Rio dos Sinos. O apartamento deles fica no Térreo e as águas invadiram o Condomínio onde residem 1.500 pessoas até o andar superior. Saíram com a roupa do corpo e tudo que havia no apartamento se perdeu. Também meus primos que residem na cidade de Três Corôas (minha cidade natal), aos pés de Gramado perderam tudo; tiveram suas casas invadidas pelo Rio Paranhana e o imenso barro dos deslizamentos das montanhas que desceram de Gramado. Meus irmãos e meus primos perderam tudo, mas não perderam a fé e a esperança. Até eu escrever este artigo não tiveram condições de limpar o apartamento invadido. Se encontram alojados numa sala de um prédio misto (comercial e residencial) no Centro de Novo Hamburgo, onde meu irmão mais novo trabalhava. Quem os salvou foi o Síndico do Condomínio, Sr. Lara e quem zela para que o apartamento não seja invadido, mesmo tão cheio de lama, é o Zelador, Sr. Roberto.

Eu procurei não somatizar, mas fiquei muito apreensivo com tudo que se via pela televisão. Mesmo falando com meus irmãos diariamente, a apreensão é tão grande quanto a distância de mais de mil quilômetros de distância entre Ribeirão Preto e Novo Hamburgo. Mais uma vez a solidariedade de nosso povo brasileiro tão querido se manifestou grandemente. Milhares de voluntários e doações intermináveis revelaram mais uma vez a verdadeira identidade de nossa Nação.

Já eu não precisei pedir e nem recorrer a ninguém para ajudar meus irmãos a se alojaram com o mínimo de dignidade naquela pequena sala comercial. Em menos de um dia, tantos amigos e amigas queridos e lindos, dispuseram de valores significativos para que meus irmãos pudessem adquirir o mínimo necessário para viverem salvos da maior enchente já registrada naquele amado Estado do Rio Grande do Sul. Muitas coisas começaram a faltar: água potável, combustível, alimentos e utensílios. Com a ajuda de tantas pessoas generosas, eles conseguiram atravessar os primeiros dias, ainda traumatizados, com serenidade e uma gratidão infinita. As pessoas que por meu intermédio ajudaram meus irmãos a se instalarem, não querem seus nomes divulgados. Porém, tenho certeza de que estão inscritos no coração do Criador. Não encontro palavras para expressar, especialmente em nome dos meus irmãos, a gratidão infinita a cada um, cada uma e a todos que de alguma maneira os socorreram nesta tragédia: a gratidão infinita é pelas orações, pelas palavras de conforto, pelo carinho manifestado e nem por último pela partilha dos valores em dinheiro necessário para a aquisição do necessário. Deus recompense e abençoe grandemente a todos. Nossa Gratidão Infinita!

* Teólogo, reitor da Igreja Santo Antônio, Pão dos Pobres; pároco da Paróquia Santa Teresa D’Ávila, presidente do Fraterno Auxílio Cristão de Ribeirão Preto e jornalista 

 

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