O adolescente Diego Silva ganhou um fiel companheiro. No dia 7 de abril, ele recebeu, da Polícia Militar de Ribeirão Preto, um cachorro da raça labrador de dois anos de idade. Ivy foi treinado pelo cabo Ricardo Alexandre Cazarotte, da equipe de faro da PM, para auxiliar o jovem de 15 anos, portador de autismo. A família veio de Joinville, Santa Catarina, para buscar o animal. O cão foi treinado nas horas de folga do policial. O adestrador diz que o objeto é ajudar o garoto a se concentrar e ficar menos agitado.
O adolescente tem dificuldade de interação e de concentração. A mãe, Silvana Budal da Silva, afirma que o cachorro pode ajudar o filho a se acalmar nos momentos de agitação, além de contribuir na socialização. Esse resultado já foi comprovado por especialistas. Pesquisadores estudam há algum tempo a relação de pessoas autistas com cães. Cientistas da Universidade de Missouri (EUA), concluíram que crianças com autismo que têm animais de estimação possuem maiores habilidades sociais em comparação àquelas que não têm.
No caso das crianças com cães de estimação, relataram aumento dessas habilidades. Os pesquisadores creditam isso às necessidades afetivas dos cães e de como eles demonstram carinho. Na Universidade de Montreal, no Canadá, os pesquisadores constataram redução nos níveis de ansiedade em crianças autistas. Isso devido a diminuição dos níveis do cortisol, hormônio do estresse das crianças.
Pai do adolescente, José Antônio da Silva afirma que pediu o apoio da PM para treinar o animal porque conheceu um trabalho semelhante em Santa Catarina. Depois, soube que Cazarotte faz esse tipo de adestramento. “A finalidade é detectar o odor do hormônio cortisol, que é ligado ao estresse e à ansiedade. Quando detectado o alto nível desse hormônio, o cão começa a interagir com a criança, melhorando assim a agressividade e isolamento”, diz o PM. Atualmente, no Brasil, cerca de dois milhões de pessoas têm autismo.
O cabo conta que Ivy foi doado especialmente para auxiliar o adolescente. O labrador de dois anos passou a ser adestrado nas horas de folga de Cazarotte. Ante disso, o policial pediu que a família fizesse vídeos mostrando a rotina de Diego Silva. “Falei com o pai e pedi pare ele me enviar vídeos do café da manhã, do garoto dormindo, na hora de levantar, do almoço, jantando, na rua, no restaurante. Então, todos os vídeos são muito importantes para a gente conseguir adequar o cão à rotina dele”, explica o PM.
“A pessoa com autismo fica muito ansiosa. É nesse momento que surgem as reações de autolesão, agressividade, isolamento. Isso é relacionado ao hormônio cortisol. A taxa desse cortisol aumenta tanto que o cão consegue perceber”, afirma. Bastaram poucos minutos ao lado de Ivy, para que o adolescente se apaixonasse pelo novo amigo. No quartel da PM, os dois brincaram pelo gramado e Diego aprendeu como lidar com o labrador.
Este não é o primeiro cão treinado por Cazarotte para auxiliar um jovem autista. Há três anos, o adestrador entregou a cadela Hope para Eduardo Capelo, hoje com 14 anos. Segundo a mãe do garoto, Néia Capelo, de 44 anos, a vida da família mudou para melhor. A labradora entrou na vida do menino como “um anjo de quatro patas”. Cabeleireira, ela tem três filhos, sendo dois gêmeos. Eduardo é um deles. Com três anos de idade os médicos constataram o autismo.
“O Eduardo tinha autismo severo, com graves crises. Ele se tornava violento e tínhamos que contê-lo com o uso de força física”, lembra a mãe. Segundo ela, o menino chegava a agredir o irmão gêmeo, além de se mutilar. “Ele mordia as mãos, arrancava o cabelo. Era muito difícil”, conta. Um episódio fez a família repensar. “Um dia ele deu um soco em uma porta de vidro. Teve lesões no tendão, nervos e cortou artérias. Quase morreu”. Nesse dia, Néia Capelo pesquisou e encontrou algo sobre a ajuda com cães.
“Procurei o cabo Cazarotte, que trabalha com adestramento de animais da PM. Ele se prontificou a ajudar e nos ajudou imensamente. Ele nunca tinha adestrado um cão para autista. Aceitou o desafio”, comenta. O desafio foi transformar a cadela Hope, uma labradora, em protetora e amiga do menino. A mudança foi imediata. “Desde que a Hope chegou o Eduardo não teve mais crise. Ele na verdade se transformou”, diz.
Assim como Hope, o labrador Ivy também usa um colete quando está trabalhando ao lado de Diego Silva. Quando está com a peça o cão não late. Só vai latir se o adolescente estiver em perigo. Vários cães treinados por Cazarotte viraram manchete nacional. Ele treinou Fuzil, um pastor belga, primeiro cachorro a farejar celulares e que está na Penitenciária Masculina de Ribeirão Preto. Adestrou, para a Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Jaboticabal, um cão que fareja fezes de cervo para demarcação do animal em extinção.
Também adestrou o primeiro cachorro a avisar quando uma pessoa tem crise epilética e o primeiro a detectar câncer de próstata. Já formou mais de dez cães que farejam entorpecentes – entre eles a labradora Mel e o springer spaniel Aquiles – e dois que localizam artefatos explosivos, entre outros. Além disso, cachorros sob seu comando já ajudaram a Força Nacional de Segurança nos Jogos Pan-Americanos do Rio (2007) e nas Olimpíadas do Rio (2016). Também colaboraram com a defesa civil na localização de pessoas na tragédia que atingiu a Região Serrana do Rio de janeiro, em 2011, e também em terremotos.