“Brasilestes stardusti”. Assim se chama o mais antigo mamífero conhecido para as terras brasileiras. Viveu entre 87 milhões e 70 milhões de anos atrás no fim da era Mesozoica, onde hoje é o noroeste do Estado de São Paulo. Trata-se do único mamífero brasileiro que, sabe-se até o momento, conviveu com os dinossauros.
A descoberta foi anunciada nesta quarta-feira, 30 de maio, pela equipe do professor Max Langer, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da Universidade de São Paulo (USP), que teve apoio de colegas da Universidade Federal de Goiás, da Universidade Estadual de Campinas do Museu de La Plata e do Massachusetts Institute of Technology.
“Brasilestes” foi descrito a partir de um único fóssil: um dente pré-molar de 3,5 milímetros. “O dente de Brasilestes é pequeno e se encontra incompleto, pois lhe faltam as raízes”, diz a paleontóloga Mariela Cordeiro de Castro, a primeira autora do trabalho que acaba de ser publicado na Royal Society Open Science.
“Pequeno mas nem tanto. Apesar de só ter 3,5 milímetros, o dente do ‘Brasilestes’ é três vezes maior do que quase todos os dentes conhecidos de mamíferos do Mesozoico. No tempo dos dinossauros, a maioria dos mamíferos tinha o tamanho de camundongos. ‘Brasilestes’ era bem maior: do tamanho de um gambá”, disse Castro.
O nome da nova espécie homenageia o roqueiro inglês David Bowie, morto em janeiro de 2016, um mês após a descoberta do fóssil. “Brasilestes stardusti” faz alusão a “Ziggy Stardust”, ou “Ziggy poeira estelar”, personagem vindo do espaço que Bowie criou para uma canção de 1973. O pré-molar de 3,5 milímetros foi encontrado em rochas ricas em restos de dinossauros e crocodilos, no município de General Salgado, oeste do estado de São Paulo.
Além de identificar o animal, a equipe estudou detalhadamente o esmalte de seu dente, reconstituiu o paleoambiente em que viveu, além de ter datado (pela primeira vez a partir de estudos radioisotópicos) as rochas arenosas de reconhecida riqueza paleontológica que cobrem boa parte do Oeste Paulista.
Com isso foi possível saber, dizem os pesquisadores, que o Brasilestes stardusti teria vivido aproximadamente entre 80 e 75 milhões de anos atrás, o que corresponde ao fim do período Cretáceo, pouco antes da grande extinção dos dinossauros. Muito abundantes e diversos após a extinção desses grandes répteis, os mamíferos eram muito mais raros na Era Mesozoica. “Em geral possuíam pequeno tamanho, ocupando nichos não explorados pelos dinossauros, como os de animais noturnos, arborícolas ou fossoriais”.
Apesar de pequeno, com um comprimento equivalente ao de um gambá atual (estimado em cerca de 50 centímetros), “Brasilestes stardusti” teria sido um dos maiores mamíferos da sua época, quando os representantes do grupo geralmente não ultrapassavam os 15 centímetros. Segundo Mariela Castro, pertence ao grupo de mamíferos chamado “Tribosphenida”, que também inclui os marsupiais (gambás, cangurus) e placentários viventes, mas não os monotremados (mamíferos que botam ovos, como o ornitorrinco).
Os tribosfênidos contam com diversos registros no Cretáceo do hemisfério norte, mas no hemisfério sul foram encontrados apenas na Índia, Madagascar e norte da América do Sul, estando ausente nas ricas faunas de mamíferos registradas no sul do nosso continente (principalmente na Patagônia Argentina). “Assim, a descrição de Brasilestes stardusti vem a preencher uma importante lacuna no registro de mamíferos mesozoicos, ressaltando a importância do Brasil para a compreensão da história evolutiva do grupo”, finaliza Mariela.