Edwaldo Arantes *
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Principalmente, ao final, penso sobre as chamadas “festas de fim de ano”, apesar de não ser muito adepto de reflexões, divago sobre as comemorações em todo o seu período.
Começo pelo Natal, termo originário do latim ‘natális’, derivado do verbo nāscor, nascéris, natus sum, nasci.
A data 25 de Dezembro foi determinada pelo Papa Julius, em 337 d.C, depois, tornada oficial pelo Imperador Justiniano, 529 d.C, embora nunca se soube ao certo a data em que nasceu o homenageado.
Dias de encontros, ombros esbarrando-se, pacotes, promessas, marquises e capas, protegendo das finas e frias chuvas de dezembro pelas ruas lotadas.
O mês caminha entre encontros, confraternizações, desculpas, compromissos e, principalmente, compras e tentativas de comemorar ou redimir-se das derrotas, erros e injustiças cometidas no decorrer dos meses.
O Natal possui uma infinidade de símbolos sendo o mais intrigante e importante, um acontecimento ocorrido em uma simples manjedoura, em Belém, Cisjordânia, Palestina, Jerusalém.
Uma criança nasce neste local, talvez como milhares de nascimentos em fétidos casebres ou nos becos e praças em frente às catedrais, sob olhares indiferentes que passam apressados em direção às lojas.
Culminando com uma refeição iniciando-se pontualmente às 00h00, denominada ceia.
Músicas, abraços, pacotes, crianças, doces, brindes, vinhos, perus, nozes e frutas diversas, dentre elas uma bem estranha aos nossos paladares, a tâmara, cultivada ao norte da África e sudoeste da Ásia,
Um velhinho trajando vestimentas dignas de um inverno rigoroso, contrastando com o nosso verão abrasador, transportado por renas aladas, deveriam ser asnos, carregando carvão em sacos lotados ao lombo, conduzidos por crianças esquálidas e subnutridas, infestadas de vermes e misérias.
Este senhor adentra as residências descendo pelas chaminés, talvez encontradas no Sul, chalés na Serra da Mantiqueira ou decorando mansões de milionários.
Os ricos presentes entregues às crianças privilegiadas diferem dos desamparados, recebendo carrinhos, bonecas de pano e quinquilharias, distribuídos pelas chiques senhoras caridosas das entidades filantrópicas.
Finda a noite espera-se o Réveillon, fogos, bailes, oferendas, Iemanjás, areias, uma semana que ficou para trás onde nada alterou.
No primeiro dia um remorso passageiro, um leve arrependimento pelas festanças efêmeras findadas em horas.
O janeiro passa em férias, descansos, viagens, águas-de-coco, cervejas, praias, montanhas, pousadas, aguardando o Reinado de Momo, novamente uma ilusão passageira e fugaz.
Colombinas, arlequins, piratas, jardineiras, desfiles, carros alegóricos, tambores e a certeza do tempo não passar.
A quarta-feira amanhece restando apenas raros confetes, que insistem escondidos nas fantasias guardadas nos baús, agora, são cinzas.
Surge o tempo das reflexões, rezas, silêncios e jejuns após a abundância das bebidas e iguarias.
Quarenta dias, tempo de expectativas, preparos e provas.
Aqueles que acreditam dedicam-se à reflexão e conversão espiritual, normalmente recolhendo-se em orações e penitências, compensando os quarenta dias passados por Jesus no deserto e os flagelos suportados na cruz.
Procissões, Vias-Sacras, Lava-Pés, véus, terços, meditações, Verônicas, andores, abstenções e silêncios.
Tudo cessa em um domingo, bacalhaus, lasanhas, pernis, morangos, mousses, vinhos, chocolates e “Coelhos da Páscoa” residentes apenas na imaginação ou em propagandas dos supermercados abarrotados.
As esperas ansiosas pelas datas, mães, pais, namorados, crianças, mortos, seus cemitérios, túmulos, flores, lembranças e saudades.
Um festival de presentes de todos os tipos e formas, garantidos pelos Pix, cartões de créditos e débitos.
Nutrindo de festejos esquecendo que a vida corre independente, nada altera a realidade dura e crua da existência humana.
Vivemos da espera eterna, almejando algo que provavelmente nunca acontecerá, talvez aos abastados.
São parcos momentos de desprezo pelo velho e a aurora do novo. Ponho-me a pensar sobre as dicotomias das nossas vidas, existindo entre o castigo das tragédias e as compensações das festas.
Vamos novamente aos rojões, vinhos, champanhes, brindes, serpentinas, chocolates, ludibriados pela utopia de que será diferente, mesmo que tudo desapareça em um lampejo que acreditávamos eterno.
* Agente cultural