Perci Guzzo *
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A Conferência das Partes sobre o Clima (COP) de 2023 em Dubai, capital dos Emirados Árabes Unidos, tem sua atenção voltada para a questão da transição energética. Sediada em uma cidade que utiliza uma fábula de energia para refrigerar ambientes internos de edifícios monumentais e num dos maiores países produtores e exportadores de petróleo, parece haver um grande contrassenso já que o objetivo do encontro é avançar em metas e ações para conter o aquecimento global.
Nossa necessidade diária de energia – 2.000 calorias, pode ser suprida bebendo um copo de petróleo ao invés de ingerirmos alimentos. Os combustíveis fósseis possuem grande densidade de energia; 10.000 kcal/quilo. Já a energia solar possui baixa densidade. Na região equatorial, onde a intensidade da radiação solar é maior, não é possível coletar 1.000 quilocalorias/dia em um metro quadrado. Uma pessoa que vive em uma grande cidade consome mais de 250 kcal/dia, sendo uma pequena fração em alimentação e grandes frações em moradia, transporte, serviços, agroindústria e comércio.
As cidades modernas e contemporâneas possuem forma e funcionamento sustentados pela disponibilidade barata de energia. A cidade em que vivemos é um ambiente improdutivo na perspectiva ecológica, pois desperdiçacombustíveis, eletricidade, esforços e espaços. Para alguns de nós há ambientes refrigerados onde quer que estejamos; para outros de nós, pontos de ônibus mal projetados e conservados, residências desconfortáveis e calçadas desarborizadas. Como resolver ou minimizar a injustiça climática?
É incorreto pensar que a única solução para resolvermos o problema energético é o aumento das fontes primárias (carvão, petróleo, gás natural, urânio, luz solar, quedas d’água, ventos, biomassa, marés etc.). Há outros caminhos que merecem nossa atenção: a eficiência energética, ou seja, a transformação eficaz das fontes primárias em serviços energéticos; a substituição de máquinas e veículos que demandam muito consumo; e a mudança comportamental do ser urbano para que não desperdice energia.
Nesta semana, enquanto eu lia alguns trechos do livro “Energia e Desenvolvimento Sustentável”, de José Goldenberg, em uma sala muito confortável de uma biblioteca pública da cidade, um funcionário chegou e perguntou “está muito calor, não é?”, e logo em seguida, apertando botões do controle do condicionador de ar, diminuiu a temperatura ambiente de 25 para 21 graus. Eu respondi “não, estava bom; calor está la fora”. As outras pessoas que se encontravam na sala concordaram comigo e o moço nos atendeu. Quantas vezes em nosso cotidiano acontece o oposto?
Ontem, ao chegar no trabalho me dirigi com dois colegas para o anfiteatro do prédio. Encontramos o ambiente fechado, sem ninguém, e com temperatura de 21 graus. Lá estavam os trambolhos ligados refrigerando o ar para vivalma. Em outro ambiente de trabalho, todos os dias chego e desligo dois grandes ventiladores barulhentos instalados em área externa ao prédio que ventila o chão para secá-lo rapidamente que acabou de ser lavado – todos os dias – com muito sabão e muita água. Poupe-me de tamanha insensatez; para ficar em palavras polidas.
Aqui em Ribeirão Preto foi realizada a primeira COP Local no último dia 6 na Câmara Municipal. Disposição final de resíduos sólidos e mobilidade urbana foram os temas debatidos já que ambos somam a maior parte das emissões de gases de efeito estufa (GEE) no município. Contribuições importantes foram feitas pelos presentes, resultando no documento “Pacto da COP Local”. Precisamos modificar nossos territórios locais para gastar menos energia, menos esforços e colhermos máximos benefícios ambientais, sociais e econômicos. Bora estudar, se organizar e planejar?
* Ecólogo e Mestre em Geociências. Autor do livro “Na nervura da folha”, lançado em 2023 pelo selo Corixo Edições