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Estamos no pico da pandemia e a manada volta às ruas

Estamos em total colapso sanitário e hospitalar. Não há precedentes em nossa história. Assim também passamos a semana com sucessivos recordes nos números de infectados, internações e mortes. O Brasil se transformou o epicentro mundial da pandemia e se tornou uma ameaça global à gestão da crise pela Covid-19. Foi o que falamos em nosso último artigo. Mas é estar­recedor como ainda existem seres humanos que conseguem ter a coragem de sair às ruas em manifestação pública a favor da morte, como aconteceu até aqui em Ribeirão no domingo passado, 14/03. Estamos no pico da pandemia e a manada volta às ruas. São os eleitores do bolsodória nas eleições de 2018.

É surpreendente que, depois de um ano de pandemia, no rumo de 300 mil mortes, uma minoria de amantes da morte tenha doado horas do seu do­mingo para participar de eventos que, sob o manto político, prega a negação das únicas medidas disponíveis para conter a disseminação ainda maior do Coronavirus. Esses atos se tornaram protestos pró-Covid! No pico da pande­mia, a manada volta às ruas. Estamos em uma guerra. Uma guerra contra um inimigo invisível que ceifa vidas preciosas ao nosso lado. Mas uma parte das pessoas não se deu conta disso.

Trata-se de um bolsão assustador de reacionarismo de classe. Ficam cla­ras as razões pelos quais prospera no país a mais vil defesa da desigualdade social baseada em uma nem sempre escamoteada defesa do sistema de privi­légios. Nessas manifestações, inclusive na de Ribeirão, não se viam claramen­te os mais pobres e assolados pela face mais cruel da pandemia. A resistência às restrições para conter o avanço da pandemia vai ganhando abertamente contornos fascistas e de defesa de privilégios de classe. O discurso contra a liberdade de ir e vir se torna, nesse momento, um discurso a favor da morte.

Na prática, para quem acompanhou as manifestações de domingo, o que se viu foram “cidadãos de bem” que recusam as medidas de contenção de circulação supostamente em nome de direito ao trabalho, ao deslocamento, às liberdades públicas e, em resumo, à tentativa de suicídio mesclada com atos homicidas, na medida em que expor-se em aglomeração ou frequentar local público sem medidas de proteção cria, cientificamente, riscos para o indivíduo e para todos no seu redor. E, mais uma vez, no pico da pandemia, a manada volta às ruas.

Até o contido governador de Minas, Romeu Zema, fala agora que não quer que seu estado se transforme em filme de terror. E chama de “assassi­no” quem desafia as restrições impostas e vai pra rua em confronto aberto com as medidas baseadas na ciência e exigidas pelas autoridades sanitárias. Todos reconhecemos os enormes prejuízos às empresas e ao comércio, em particular. Reconhecemos a ausência nefasta de políticas de socorro por parte das autoridades. Mas causa espécie assistirmos uma tropa de insanos ir até à prefeitura e destilar seu ódio contra o prefeito – e não tenho nenhuma simpatia por essa figura.

Essas manifestações da extrema-direita alcançam, na verdade, uma condição desumana. Elas se enquadram enganosamente numa luta pela so­brevivência e seus participantes ignoram os princípios de solidariedade com os mais fracos. Tomam como bandeira a máxima de Bolsonaro: “todos vão morrer um dia, todos podem contrair”. E como escreveu Marcos Emílio Go­mes na revista Veja, “o melhor, diante da inevitabilidade, é que isso aconteça o quanto antes para que os mais fortes estejam logo liberados para manter-se no jogo da selvageria. Nada pode ser mais perverso em termos de hipocrisia diante de um quadro social como o brasileiro.”

Na quarta-feira, chegamos ao lockdown, uma medida extrema e tardia, cercada de descuidos de toda sorte. Isso demonstra a política errática dos go­vernos municipal e estadual durante toda a pandemia e também agora. Mas também a total ausência de qualquer política de combate à pandemia por parte de Bolsonaro e sua camarilha, o que deixa sem rumo todos os estados e municípios. Não temos uma liderança nacional de combate à pandemia. Temos, pelo contrário, o negacionismo da própria doença, o discurso de terapias ineficazes regadas a fakenews, a sabotagem às vacinas. E tudo isso apoiado pela manada que, mais uma vez, saiu às ruas.

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