Em 2016, Jô Soares (1938-2022) dirigiu “Histeria”, comédia do dramaturgo inglês Terry Johnson, que entregava mais que o prometido para aqueles que esperavam um mero entretenimento. A brilhante montagem promovia uma reunião fictícia entre o psicanalista Sigmund Freud (interpretado por Pedro Paulo Rangel) e o pintor Salvador Dalí (papel de Cassio Scapin) em meio à perseguição nazista aos judeus.
O texto, escrito em 1993, repetia uma fórmula testada pelo autor uma década antes. Definida como “uma comédia relativa”, “Insignificância” se apoia em outro encontro imaginário, desta vez envolvendo quatro celebridades. O espetáculo estará em cartaz no Teatro Municipal de Ribeirão Preto no ano que vem. Serão duas sessões neste domingo, 16 de fevereiro, às 18 e 20 horas.
O físico Albert Einstein (1879-1955, cientista criador da Teoria da Relatividade que levou à criação da bomba H e, consequentemente, à bomba atômica), o senador anticomunista Joseph McCarthy (1908-1957), a atriz Marilyn Monroe (1926-1962) e o jogador de beisebol Joe DiMaggio (1914-1999) se cruzam em um quarto de hotel na Nova York de 1953.
Todos estão exaustos, à flor da pele e só queriam sossego. Mas, por serem quem são e pelo momento que o mundo atravessa, isto é impossível. Encontro que poderia acontecer hoje, trocando os personagens originais por seus pares na atualidade.
O texto do dramaturgo e diretor de teatro, cinema e televisão inglês Terry Johnson foi lançado em livro em 1983. No palco, os atores Cássio Scapin, Amanda Acosta, Marcos Veras e Norival Rizzo assumem os papéis do professor, do senador anticomunista, da atriz e do jogador de beisebol, sob a direção de Victor Garcia Peralta.
Este encontro singular destaca uma das questões mais discutidas na mídia contemporânea: as consequências da fama, tanto na vida pessoal de renomadas celebridades, em relação às concessões necessárias para alcançá-la ou preservá-la, quanto à sua exploração para objetivos políticos.
Através das perspectivas de figuras que simbolizam alguns dos maiores fenômenos de popularidade do século XX, o autor reflete sobre as maneiras de lidar com a fama (ou com a perda dela): a rejeição por parte do cientista, a aceitação hesitante, personificada no mito sexual que Marilyn Monroe continua a representar, e a decepção quando a fama se dissipa, refletida no personagem do jogador.
Outro componente se une ao enredo: a política, representada pelo macartismo no contexto da Guerra Fria, quando o senador McCarthy capitaneou uma verdadeira “caça às bruxas” nos Estados Unidos, com o objetivo de criminalizar o comunismo e seus adeptos, cerceando as liberdades políticas.
A montagem brasileira tem tradução de Gregório Duviviere reedita a parceria entre o produtor Rodrigo Velloni e o autor, após a montagem, em 2016, do espetáculo “Histeria”, com direção de Jô Soares, que recebeu o prêmio Arte Qualidade Brasil de Melhor Produção de 2017. Os figurinos são de Fábio Namatame, o visagismo de Claudinei Hidalgo e as perucas de Feliciano San Roman.
São ingredientes essências na montagem, captando e personificando as celebridades “emprestadas” ao texto. Cassio Scapin, que foi Dalí em “Histeria”, é Albert Einstein, um velho cansado de guerra e quase babão, uma composição técnica que em nada remete ao gênio da física cheio de caras e bocas, considerado por alguns uma mente perigosa para humanidade.
É assim que pensa Joseph McCarthy, interpretado por Norival Rizzo, que substituiu Pedro Paulo Rangel (1948-2022) como Freud naquela mesma outra montagem. Capitão da caça às bruxas na Guerra Fria, o senador ameaça Einstein para que em um depoimento, marcado para a manhã seguinte, nada traia as suas expectativas.
“Hoje é uma noite de merda e amanhã vai ser um dia de merda”, diz McCarthy a Einstein, na tentativa de convencê-lo a aceitar um copo de uísque. O físico, que não bebe, pensa que pode ter um pouco de tranquilidade quando se livra do algoz, porém entra pela porta uma loira de vestido branco esvoaçante. É Marilyn Monroe, ou melhor, a atriz Amanda Acosta, em pânico latente.
Ela acabou de rodar a cena de um filme em uma movimentada avenida em que sua saia é levantada pela ventilação do metrô e se sentiu um pedaço de carne exposto no açougue. “Eu sei que tá no meio da madrugada, mas te conhecer é a coisa mais maravilhosa”, fala a estrela a um Einstein confuso, quase ausente. “Você não está me reconhecendo?”, pergunta ela.
O último a chegar, praticamente derrubando a porta do quarto, é Joe DiMaggio, o astro do beisebol aposentado e amedrontado com a possibilidade de ser visto só como o marido de Marilyn. O tipo violento e abusivo, capaz de aumentar a desestabilização da deusa das telas, ganha uma representação surpreendente de Marcos Veras.
O ator, tão associado às comédias e mais ainda ao stand-up, aparece em cena econômico, longe de forçar qualquer traço raivoso e pouco modula o personagem – o que é positivo. É uma criança tosca, decepcionada com a vida, que sofre por não estampar mais as figurinhas das embalagens de chicletes. Mais de 40 anos nos separam da escrita de Insignificância.
Outros 70 anos nos afastam da época em que se passa o enredo, mas as situações e os personagens continuam muito atuais. A estrela de cinema hoje seria musa das mídias sociais. O jogador de beisebol, para nós, brasileiros, seria o jogador de futebol, com milhões de seguidores e sem muita noção. O senador poderia estar sentado no plenário brasileiro, dizendo e fazendo o mesmo que o escroque do texto de Johnson.
O único que, se estivesse ainda entre nós, estaria trazendo contribuições à sociedade seria o cientista. O espetáculo é realizado através da Lei de Incentivo à Cultura Lei Rouanet, Ministério da Cultura e Governo Federal União e Reconstrução, e do Programa de Ação Cultural (ProAC) do Governo de São Paulo, por meio da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas.
Ingressos – Os ingressos custam R$ 60 e R$ 30 – meia-entrada para estudantes e professores de escolas públicas e particulares (mediante apresentação de documento comprobatório como carteirinha da instituição, boleto de mensalidade ou holerite), aposentados (com documento específico) e idosos acima de 60 anos (com cédula de identidade, o RG).
Estão à venda no site Mega Bilheteria (www.megabilheteria.com) e no guichê da hora das sessões. O Teatro Municipal fica na praça Alto do São Bento s/nº, Jardim Mosteiro. Para compra online há taxa de serviço. O local tem capacidade para receber 515 pessoas – o estacionamento tem 40 vagas. Mais informações pelo telefone (16) 3625-6841. O espetáculo não é recomendado para menores de 16 anos. O uso de máscara é opcional.
Serviço
Espetáculo: “Insignificância”
Texto: Terry Johnson
Tradução: Gregório Duvivier
Direção: Victor Garcia Peralta
Produção: Rodrigo Velloni
Cenário: Chris Aizner
Figurinos: Fábio Namatame
Elenco: Cassio Scapin,
Amanda Acosta,
Marcos Veras e
Norival Rizzo
Quando: domingo, 16 de fevereiro
Sessões: 18 e 20 horas
Ingressos
Inteira: R$ 60
Meia: R$ 30
Vendas: site
www.megabilheteria.com
Local: Teatro Municipal
Onde: praça Alto do São
Bento s/nº, Jardim Mosteiro
Telefone: (16) 3625-6481
Capacidade: 515 pessoas
Estacionamento: 40 vagas
Censura: 16 anos