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Esperança sem remédios para os estressados

Adriana Dorazi – especial para o Tribuna
*com informações do Jornal da USP

Vem dos laboratórios da Universidade de São Pau­lo (USP), na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), uma nova espe­rança de tratamento com menos efeitos colaterais para pacientes de todo o mundo que sofrem com doenças da mente como estresse, ansie­dade e depressão.

As pesquisas investigam as atividades neurais envol­vidas no processamento de controle sobre o estresse. Foram reconhecidas e pu­blicadas no The Journal of Neuroscience, um dos mais importantes periódicos in­ternacionais.

Os trabalhos são condu­zidos pelo Dr. Danilo Be­nette Marques com orienta­ção dos professores Dr. João Pereira Leite e Dr. Rafael Naime Ruggiero. Também têm a colaboração de Dr. Matheus Teixeira Rossignoli e Dr. Lézio Soares Bueno-Jú­nior. Entre outras questões, querem responder por que alguns indivíduos são resi­lientes e outros vulneráveis às adversidades.

Segundo a pesquisa mui­tos fatores – biológicos, psico­lógicos e sociais – influenciam em como cada pessoa reage às dificuldades. O controle ou a falta dele, que se percebe dian­te situações de estresse, é um dos fatores mais importantes já descobertos até hoje. Po­rém, ainda pouco se sabe so­bre como o cérebro processa esta informação.

Os trabalhos são conduzidos pelo pesquisador Danilo Benette Marques (esquerda) com orientação dos professores João Pereira Leite (centro) e Rafael Naime Ruggiero

 

Questão de controle?
A equipe está na fase de realizar experimentos em ratos, nos quais um grupo de animais recebia choques moderados nas patas, dos quais podiam escapar se pulassem por cima de um pequeno muro. De maneira equivalente, outro grupo de animais recebia as mesmas quantidades, intensidades e durações de choques, porém de forma inescapável. E, por fim, outro grupo de sujeitos não recebia choques.

Enquanto isso, os pesqui­sadores registraram a ativi­dade elétrica do hipocampo e do córtex pré-frontal, duas regiões do cérebro que já ha­viam sido amplamente asso­ciadas aos efeitos do estresse e da depressão por estudos anteriores.

“Este desenho experimen­tal consegue separar os efei­tos do estresse por si, ou seja, que ocorrem tanto para es­tressores controláveis quanto incontroláveis. Também con­segue distinguir os efeitos do controle e da falta de controle, o que poderia ser entendido como um ‘fator psicológico’ pois depende apenas de como o indivíduo percebe aquela si­tuação” explica Danilo.

Os pesquisadores deta­lham que a maioria dos ani­mais que passam por cho­ques incontroláveis falha em escapar de estímulos aversi­vos apresentados no futuro, mesmo quando estes novos estímulos são escapáveis. Este é um fenômeno bastante clás­sico da psicologia, conhecido como desamparo aprendido. Por outro lado, os animais que passam por uma primeira exposição a choques contro­láveis se tornam resistentes a estressores futuros, mesmo que estes novos estressores se­jam incontroláveis e escapam normalmente em testes reali­zados dias depois.

Originalmente, este fe­nômeno foi chamado de “imunização comportamen­tal”, pois se assemelha à re­sistência imunológica que o corpo adquire por enfrentar e vencer um agente infeccioso ou ao tomar uma vacina. Hoje em dia, este comportamento é mais conhecido como resis­tência aprendida.

Um aspecto importante revelado é que o estresse in­controlável foi associado ao aumento de ansiedade, apatia social, medo exagerado, úlce­ras estomacais, sensibilidade a drogas de abuso, déficits cog­nitivos, déficits de neuroplas­ticidade e até mesmo cresci­mento de tumores.

Resiliência
Descobertas do estudo mostram que há uma neuro­fisiologia complexa por trás de processos associados à resili­ência e que a vulnerabilidade ao estresse pode, na verdade, se dar pela falta destes processos. “Há pouco tempo se acreditava que indivíduos resilientes es­capavam dos efeitos deletérios do estresse que ocorriam nos indivíduos mais vulneráveis. Buscando tais alterações, fo­ram se acumulando evidên­cias de que, na verdade, são os resilientes que apresentam atividades biológicas particu­lares, que estão ausentes nos mais susceptíveis. Nesse senti­do, cada vez mais se reconhece que a resiliência é constituída por processos neurobiológicos ativos, únicos e complexos”, afirma Danilo.

Estes resultados apoiam a hipótese da rede neural, a qual propõe que depressão e resili­ência estão relacionadas ao processamento de informa­ções em redes neurais de uma forma mais ampla e complexa e não meramente a desequi­líbrios neuroquímicos como antigamente se acreditava.

A pesquisa também apon­ta um papel específico das oscilações teta na resistência ao estresse. Estas oscilações representam um dos ritmos biológicos mais estudados em mamíferos e já haviam sido amplamente relacionadas a processos cognitivos, aprendi­zado e memória e emoções. O presente trabalho ajuda a es­clarecer o significado desta ati­vidade neural e mostra que ela está relacionada ao aprendiza­do de resistência, ao estresse e aos aspectos adaptativos de enfrentamento a adversidades.

Doença mental x covid
Experiências traumáticas são fatores de risco para a origem de transtornos mentais bastan­te comuns na atualidade, como depressão maior, ansiedade generalizada e transtorno de estresse pós-traumático. Um estudo recente mostrou que nos últimos dois anos as pre­valências de ansiedade e de­pressão aumentaram global­mente devido às decorrências da pandemia de covid-19.

Embora parte dos pa­cientes responda a tratamen­tos de primeira linha, uma parcela significativa não res­ponde ou responde apenas depois de várias tentativas de diferentes tratamentos. Neste sentido, a identifica­ção de marcadores biológi­cos de resposta a tratamen­to (“biomarcadores”) pode contribuir em decisões tera­pêuticas mais eficazes para transtornos psiquiátricos.

“A descoberta de uma atividade elétrica do cérebro associada à resistência e ao estresse pode servir como um biomarcador, que poderia ser verificado por eletroencefalo­grafia (EEG), e que ajudaria a decidir melhores tratamentos personalizados para depres­são, ansiedade e transtorno de estresse pós-traumático”, afir­ma Rafael Ruggiero.

“O achado de um ritmo neural associado à resistên­cia ao estresse também pode ajudar a otimizar tratamen­tos psiquiátricos baseados em estimulação cerebral, de modo a aproximá-los de processos neurofisiológicos ‘naturais’ envolvidos na re­siliência”, afirma João Leite.

Por fim, o grupo acredi­ta que a combinação entre análises da atividade elétrica do cérebro e ferramentas de aprendizado de máquina em pacientes pode ajudar a de­cidir e otimizar tratamentos para transtornos mentais re­lacionados ao estresse. Atual­mente, o grupo estuda como oscilações neurais estão en­volvidas em outras dimensões comportamentais relaciona­das à resiliência ou vulnerabi­lidade ao estresse e pretende investigar o potencial tera­pêutico da modulação destes ritmos neurais.

Ainda não há previsão de quando a pesquisa passará à fase de teste em humanos.

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