O promotor aposentado, advogado e professor livre-docente do curso de Direito da Universidade do Estado de São Paulo (Unesp), Antonio Alberto Machado deverá ser o candidato a prefeito de Ribeirão Preto pelo Partido dos Trabalhadores. Ele foi escolhido como pré-candidato da legenda, no começo do ano, em votação junto aos filiados da cidade. As eleições municipais estão marcadas para 4 de outubro, mas por causa da pandemia do novo coronavírus poderá ter sua data alterada para novembro ou dezembro.
Promotor de Justiça, durante trinta e um anos, dos quais vinte e cinco em Ribeirão Preto, ele está filiado ao PT há dois anos. Por força do cargo público que ocupava, antes disto não tinha filiação nem militância partidária.
Em entrevista ao Tribuna, Machado garante que seu foco é propor uma nova filosofia de governo para a cidade. “Que atenda as necessidades fundamentais da população, sobretudo no que diz respeito à saúde, saneamento básico, moradia, transporte público, segurança e educação”.
Tribuna Ribeirão – O que o levou a colocar seu nome à disposição do Partido dos Trabalhadores como pré-candidato a prefeito de Ribeirão Preto?
Antonio Alberto Machado – O que me motivou, fundamentalmente, foi o desafio de continuar fazendo na política o que fazia e fiz por trinta anos no Ministério Público: lutar pela efetivação dos direitos básicos das pessoas em geral, sobretudo das mais carentes. Ou seja, melhorar a qualidade de vida da população para tornar Ribeirão Preto uma cidade justa, sustentável e participativa – efetivamente democrática e para todos. Me motivou muito, também, o desejo de contribuir para com o debate político neste momento de muitas ameaças à nossa democracia.
Tribuna Ribeirão – Várias lideranças importantes do partido foram condenadas por corrupção e isso acabou atingindo a imagem da legenda. Como o setor pretende reverter isso?
Antonio Alberto Machado – Não pretendo reverter isso. Minha intenção é rever o passado do PT, e, quando for o caso, reconhecer os seus erros. Mas também os inúmeros acertos. A ideia é evitar os equívocos do passado e seguir em frente, resgatando o legado e o modo petista de governar, com políticas públicas de inclusão e justiça social, colocando as demandas das pessoas, notadamente as mais necessitadas, no orçamento do município, sempre com propostas criativas e realistas, factíveis.
Tribuna Ribeirão – No caso específico de Ribeirão Preto o partido encolheu muito sua representatividade eleitoral. É possível reverter isso?
Antonio Alberto Machado – Vamos reverter isso. Vamos ampliar a nossa representatividade. É curioso que, mesmo neste momento de crise da política e dos partidos, mesmo com toda a pancadaria seletiva que o PT sofreu por parte de setores da mídia, do Judiciário e do Ministério Público, mesmo assim, a militância petista em Ribeirão Preto aumentou muito – o número de filiados cresceu sintomaticamente nos últimos dois anos. Com propostas inovadoras e com o legado das gestões petistas bem-sucedidas, aqui e no Brasil todo, vamos voltar à cena política, renovados e confiantes.
Tribuna Ribeirão – Uma das frases repetidas no meio político é a de que o PT precisa se reinventar para extirpar da imagem ligada as lideranças condenadas por corrupção. O senhor concorda com essa afirmação?
Antonio Alberto Machado – Todos os partidos precisam se reinventar. Vivemos uma crise política que exige autocrítica e reinvenção por parte de todas as agremiações político-partidárias. O nosso sistema envelheceu, apodreceu. E isso não é responsabilidade exclusiva do PT. O partido foi responsabilizado por seus erros e pelos erros dos outros. Foi, como se diz, o bode-expiatório. Queremos reconhecer o que os petistas fizeram de errado, assumir responsabilidades, porém, reafirmando os acertos e avanços das administrações do PT no campo político e socioeconômico.
Tribuna Ribeirão – O que sua candidatura propõe de novo em relação às outras até agora cogitadas pela imprensa e pelos próprios políticos?
Antonio Alberto Machado – Propomos uma nova filosofia de governo, ou seja, um governo para as pessoas, e não exclusivamente para as obras. Que atenda as necessidades fundamentais da população, sobretudo no que diz respeito à saúde, saneamento básico, moradia, transporte público, segurança e educação. Todos dizem isso, mas a nossa prioridade é acolher, cuidar das pessoas. Acolher e garantir a dignidade delas. Neste momento de pandemia, vamos reforçar o sistema de saúde, valorizando nossos servidores e demais serviços públicos, para atender as necessidades básicas dos vulneráveis. Com uma gestão presente e participativa, vamos compartilhar com a população as decisões sobre investimentos públicos e políticas de proteção social. Voltaremos com o orçamento participativo, fortalecimento dos conselhos populares e gestão de governo nos bairros.
Tribuna Ribeirão – Que avaliação o senhor faz da atual administração e quais os principais problemas da cidade?
Antonio Alberto Machado – A atual administração tem vários problemas, tanto administrativos quanto políticos. Pecou muito no campo da zeladoria, deixou a cidade num estado de abandono e desconforto. Há também um grave problema de endividamento que o atual prefeito deixará para a próxima administração. Mesmo com dinheiro do PAC 2 para fazer as obras necessários, o prefeito mais que dobrou a dívida da administração anterior – de R$ 300 para R$ 700 milhões. No campo político, a administração faz opção por obras e não por gente, revelando que o seu compromisso não é com as pessoas e classes populares, que mais necessitam do Estado. Além do que, é uma administração muito tecnocrática, distanciada do povo, por isso, autoritária e elitista.
Tribuna Ribeirão – Como o PT de Ribeirão Preto pretende conseguir de novo o voto e a adesão dos eleitores que colocou o partido duas vezes no comando da prefeitura de Ribeirão Preto?
Antonio Alberto Machado – Note que na última eleição presidencial o candidato do PT, Fernando Haddad, teve em Ribeirão Preto 92 mil votos no segundo turno. Ou seja, no pior momento do PT, que estava sob pancadaria, e no melhor momento do Bolsonaro, da Lava Jato e da coalizão midiática que o elegeu, quase cem mil pessoas na cidade escolheram o PT. Agora, quando se constata as muitas manobras da Lava Jato, as injustas perseguições ao Partido dos Trabalhadores, e o fracasso do governo Bolsonaro, vamos buscar o voto daqueles que não abandonaram o partido no pior momento, e também o daqueles que se decepcionaram com as enganosas promessas dos falsos heróis, fabricados para iludir o povo. Contamos ainda com os democratas e os progressistas em geral, independentemente da posição que ocupam no espectro ideológico.
Tribuna Ribeirão – A pandemia do coronavírus deverá mudar o jeito e a forma de se fazer campanha. O PT está preparado para uma campanha mais virtual do que presencial?
Antonio Alberto Machado – Na verdade, ninguém estava preparado para enfrentar um cenário eleitoral com crise sanitária, econômica e política ao mesmo tempo. Todos os partidos terão de mudar suas estratégias de campanha que, a meu ver, se dará quase toda ela no âmbito digital, mesmo com o adiamento das eleições para dezembro. O PT está se preparando para essa realidade; mas vamos continuar próximos das nossas bases, da nossa militância – seja nas ruas seja nas redes. Nossa campanha será pobre, mas será forte e limpa, sob todos os aspectos.
Tribuna Ribeirão – O Brasil vive atualmente um momento de polarização politica muito intensa. Isso pode afetar as eleições municipais e transformar a disputa numa espécie de Fla-Flu?
Antonio Alberto Machado – Infelizmente pode. Essa polarização tende a se manter e se refletir também nas eleições municipais. Estamos preparados para enfrentar isso, mas sem ódio, sem diversionismo, apenas com argumentos e racionalidade. Porém, queremos sobretudo fazer uma campanha propositiva para Ribeirão Preto, enfrentando os nossos problemas e demandas locais. A política nacional, naturalmente, virá à tona. Mas a nossa intenção não é embarcar no Fla-Flu, é propor as soluções político-administrativas que realmente interessam, de perto, ao nosso povo.
Tribuna Ribeirão – Em seu blog o senhor faz críticas políticas contundentes. Num artigo recente o senhor disse “Jair Bolsonaro não entende muita coisa, e uma das coisas que ele não entende é que o Brasil tem um “presidencialismo de coalizão”, e que, portanto, o chefe do Executivo precisa dialogar com o Congresso, se quiser governar. Bolsonaro, estúpido como é, optou por xingar o Congresso (e outras instituições). Deu no que deu – até agora não governou um dia sequer”. O Brasil está tão mal de presidente como o senhor descreve?
Antonio Alberto Machado – Acho que sim. Bolsonaro não desce do palanque; não governa e estimula o diversionismo na sociedade. Por exemplo, no momento em que estamos em uma verdadeira guerra contra o coronavírus, Bolsonaro resolve fazer guerra aos governadores, prefeitos, Supremo Tribunal Federal, Congresso Nacional, a Ciência entre outros setores e instituições. Ele está em guerra contra todo o mundo, menos contra o vírus. Já trocou de ministro da Saúde duas vezes, promove aglomerações públicas que disseminam a doença, e insiste na cloroquina, um fármaco que a Organização Mundial de Saúde não recomenda para o tratamento da covid-19 e a França até já proibiu seu uso contra essa doença. Bolsonaro vai sempre na contramão, levantando polêmicas e atiçando o ódio. Não consegue negociar com o Congresso e quer impor um governo autoritário. É por essas e outras que mais de 50% da população já avaliam seu governo como ruim ou péssimo, e o percentual de seus apoiadores caiu para menos de 30%. Não apenas eu, mas as pesquisas revelam que a maioria dos brasileiros desaprova o governo Bolsonaro.