Mesmo em situações geográficas distantes, os impactos da guerra envolvendo diretamente Rússia e Ucrânia provocarão consequências que, mais cedo ou mais tarde, chegarão ao bolso e à mesa dos brasileiros. O principal temor é com relação ao agronegócio, uma vez que o Brasil importa 90% dos fertilizantes usados em diferentes tipos de culturas agrícolas e uma parte significativa vem da região de conflitos ou passa por portos que não estão conseguindo escoar a produção.
Mas e em Ribeirão Preto e região? Esses impactos serão sentidos diretamente? Segundo avaliações da Associação Comercial e Industrial (Acirp), os efeitos da guerra podem ter impactos negativos diretos para alguns setores da economia da cidade, que mantém comércio bilateral com a Rússia. De modo geral, no entanto, os efeitos deste impacto no comércio são suportáveis.
“O principal problema que observamos é a inflação, algo que já vem acontecendo devido às dificuldades na cadeia do trigo, milho, fertilizantes e, principalmente, dos combustíveis”, afirma o presidente da Acirp, Dorival Balbino.
O comércio bilateral com a Ucrânia é pouco relevante de modo geral: por exemplo, entre 2019 e 2021, Ribeirão Preto importou cerca de US$ 160 mil (cerca de R$ 900 mil) daquele país. As exportações, por outro lado, não chegam a US$ 400 mil e estão basicamente resumidas à venda de amendoim in natura.
A situação com a Rússia, no entanto, é mais preocupante. Nas importações, por exemplo, o país presidido por Vladimir Putin é o sexto parceiro comercial de Ribeirão Preto, atrás de China, Estados Unidos, Itália, Israel e Argentina.
De acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior do Ministério da Economia, em 2021 as empresas instaladas no município importaram US$ 9 milhões da Rússia. “Cerca de 90% das importações estão ligadas à compra de fertilizantes ou produtos químicos utilizados na fabricação de adubos. Portanto, a nossa relação comercial com a Rússia reflete a que o próprio Brasil tem, que é ter grande parte das importações ligadas à compra de fertilizantes.”, afirmou a assessora de Comércio Exterior da Acirp, Thayná Rais.
Segundo ela, quanto mais a guerra entre os dois países permanecer, maiores as dificuldades para a importação desses produtos, sobretudo se as sanções econômicas adotadas por Estados Unidos e União Europeia se intensificarem. “Também é importante levarmos em conta que, atualmente, fala-se das importações de fertilizantes como vindos, quase que exclusivamente, da Rússia. No entanto, no caso de Ribeirão Preto, o município importa da Bielo-Rússia cerca de US$ 3,4 milhões, que é praticamente o mesmo valor que se paga à Rússia. Essa informação é importante porque a Bielo-Rússia também é alvo de sanções internacionais, pelo apoio ao governo russo na invasão da Ucrânia”, completa a responsável pelo Núcleo de Comércio Exterior da Acirp.
Portanto, segundo ela, a guerra deve ser acompanhada com atenção, sobretudo no caso dos fertilizantes. Afinal, quase dois terços de todos os fertilizantes importados por Ribeirão Preto vêm de dois países que são alvo de sanções internacionais. Isso, segundo Thayná, pode se refletir não apenas no encarecimento dos preços dos produtos, como também no próprio processo de importação, justamente por causa das sanções atualmente existentes.
A alternativa, portanto, pode ser a busca de mercados alternativos, como China, Estados Unidos, Bélgica ou Nigéria.
Indústria
No ponto de vista do Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustíveis (Ceise Br), que representa as indústrias de transformação, metal mecânico, indústria de base – de máquinas e equipamentos, a guerra no leste europeu, impacta principalmente sobre o preço do aço no mercado internacional.
“Lembramos que a Rússia é o terceiro maior produtor de níquel, que é utilizado na fundição, sobre tudo na formação do aço inox, o preço do níquel já ultrapassou 100 mil dólares a tonelada, então há uma expectativa que falte esse componente e com isso, consequentemente abale os preços praticados no mercado do aço. Porque a guerra mexeu com as commodities, os minérios estão em alta, isso acaba impactando mesmo”, disse o presidente da entidade, Luís Carlos Júnior Jorge.
“Também observar que este cenário abre espaço para as usinas siderúrgicas brasileiras para ampliar o fornecimento de aço para os Estados Unidos, em razão do embargo econômico americano em relação aos produtos da Rússia, que também poderá afetar o mercado interno, porque as usinas siderúrgicas, considerando o câmbio do dólar em alta, vão priorizar o mercado internacional, criando um possível cenário de escassez do aço no mercado interno. Há expectativa de grande aumento no preço desta matéria utilizada em diversos segmentos da economia”, finaliza o dirigente.
Importações em Ribeirão Preto: cerca de 5% vêm da Rússia
As relações comerciais bilaterais de Ribeirão Preto com a Ucrânia são mínimas. No entanto, com a Rússia isso não ocorre, embora o comércio desse país com o município não seja vital. Do total de importações feitas em 2021 por empresas de Ribeirão Preto, cerca de 5% vêm da Rússia, segundo dados da Associação Comercial e Industrial de Ribeirão Preto (Acirp).
Para se ter uma ideia, com a China, que é o principal país de onde Ribeirão Preto importa produtos, esse percentual é de 25%.
Nas exportações, a situação é praticamente idêntica, mas com uma diferença importante: embora o que Ribeirão Preto exporta para a Rússia seja de cerca de 5%, as vendas entre o município e o país de Putin vêm crescendo de forma significativa desde 2019.
Naquele ano, a Rússia representava apenas 0,27% das exportações do município, com vendas estimadas em cerca de US$ 800 mil. No ano passado, no entanto, esse valor passou para quase R$ 13,5 milhões, em um aumento de quase 17 vezes em apenas três anos.
Portanto, caso o conflito no norte da Europa permaneça por mais tempo, Ribeirão Preto teria mais a se preocupar como vendedor do que como comprador, mas em uma área muito específica: o comércio de amendoim. Dos US$ 13,5 milhões que Ribeirão Preto exportou para a Rússia em 2021, quase US$ 12 milhões são de amendoim in natura.
Ou seja, tendo em vista o cenário geral das exportações para a Rússia, o efeito da guerra na economia local é baixo. No entanto, pode representar um problema bastante sério para as empresas que atuam especificamente na venda de amendoins para aquele país.
Amendoim
A reportagem do Tribuna Ribeirão entrou em contato com a Coplana – Cooperativa Agroindustrial – entidade formada por produtores de cana-de-açúcar, culturas em rotação com cana, como amendoim e soja, além de outras culturas em menor escala, com atuação regional e sede em Guariba. Segundo informações da área técnica da entidade, por meio de sua assessoria de imprensa, no momento ainda não há impactos da guerra, pois não há carregamentos destinados para aquela região neste período. A entidade é uma das principais exportadoras de amendoim.