Por Mariane Morisawa, especial para o Estadão
Quando pipocaram as notícias de que Encanto se passaria no Brasil, Lin-Manuel Miranda gelou. “Eu sei como os brasileiros são apaixonados”, disse o criador de Hamilton em entrevista ao Estadão. “Mas tínhamos acabado de voltar da nossa viagem à Colômbia para fazer pesquisa.” Miranda avisou a Disney de que era melhor esclarecer logo. “Falei: os fãs brasileiros são os que mais vibram. Eu ouvi um monte sobre a demora das legendas de Hamilton em português no Disney+”, afirmou. “Eu não sei como começou o boato e lamento muito.”
Encanto, nova animação da Disney que acabou de estrear nos cinemas no Brasil, mas sem data de chegar ao streaming, surgiu da vontade de Lin-Manuel Miranda, nova-iorquino filho de porto-riquenhos, de fazer o musical latino-americano. Os diretores Byron Howard e Jared Bush – que colaboraram com a codiretora Charise Castro Smith – queriam fazer um musical juntos, e Bush tinha acabado de trabalhar com Miranda na trilha de Moana. “Mas não sabíamos onde seria na América Latina, que é tão grande e diversa”, falou Howard ao Estadão. Um amigo sugeriu a Colômbia como um cruzamento de culturas, de tradições, de dança e música e de diferentes etnias e cores de pele.
Sendo uma história da Disney e da América Latina, o centro de tudo não poderia ser outro que não uma família – no caso, uma grande família. Os Madrigal moram em uma casa encantada, a Casita, escondida nas montanhas. A Casita concede poderes mágicos às crianças a partir de uma certa idade. A exceção é Maribel (Stephanie Beatriz na versão original e Mari Evangelista, na brasileira).
CASA MÁGICA
A Casita abriga a Abuela Alma (voz de María Cecília Botero), que é mãe dos trigêmeos Pepa (Carolina Gaitán), que controla o clima, Julieta (Angie Cepeda), que cura pela comida, e Bruno (John Leguizamo), que vê o futuro e vive afastado. Julieta tem com Agustín (Wilmer Valderrama) três garotas: Isabela (Diane Guerrero), que faz as plantas desabrocharem, a superforte Luisa (Jessica Darrow) e Maribel, que se sente mal por não ter nenhum dom. Pepa e seu marido Félix (Mauro Castillo) são pais de Dolores (Adassa), dona de uma audição extraordinária, Camilo (Rhenzy Feliz), capaz de mudar sua aparência, e o pequeno Antonio (Ravi Cabot-Conyers), que se comunica com os animais.
Como tantos outros latino-americanos, Miranda sabe bem o que é ter a casa cheia. “Minha família é pequena: meu pai, minha mãe, minha irmã e eu. Mas nunca éramos só nos quatro morando na casa”, explicou ele, que compôs oito canções para a animação, pesquisando ritmos e instrumentos tradicionais da Colômbia. “Meu pai foi o primeiro a se mudar de Porto Rico para Nova York, então sempre foi uma casa de passagem para porto-riquenhos. Sempre tinha um primo, uma tia, minha avó que não é realmente minha avó, mas a babá do meu pai em Porto Rico que veio cuidar da gente.” Ele brincou que, se um dia fizessem um filme sobre sua família, o nome seria Mi Casa, Su Casa.
Howard e Bush, que não têm ascendência latino-americana, também vieram de famílias grandes, em que nem todo mundo se dá bem. “E sempre tem essa coisa: eu conheço minha mãe como minha mãe, mas não como uma pessoa completa”, ressaltou Bush. “Fiquei pensando se não deveríamos tentar entendê-los melhor e compreender suas escolhas.”
AUTENTICIDADE
Era importante que o filme fosse universal, mas preservasse a autenticidade da cultura colombiana. Para isso, formaram um grupo de consultoria colombiano e fizeram uma viagem ao país. “Foi um foco desde o princípio”, contou o brasileiro Renato dos Anjos, chefe de animação. “Levamos um bom tempo nos educando sobre gestos, expressões, comunicação corporal.” Por ser um musical, havia também a preocupação de registrar com fidelidade os movimentos da dança. “Um grupo de bailarinos fez a coreografia para a gente usar como referência para animar os personagens”, lembrou.
Para Lin-Manuel Miranda, Encanto encerra um ano cheio, que teve Em um Bairro de Nova York, dirigido por Jon M. Chu e baseado em sua primeira peça, In the Heights, e o documentário sobre Rita Moreno que produziu, além do lançamento da animação A Jornada de Vivo, em que é produtor, compositor e ator, e sua estreia na direção de cinema com tick, tick… BOOM!, adaptação do musical autobiográfico de Jonathan Larson. “Eu não planejei assim. Foram 13 anos para fazer Em um Bairro de Nova York, cinco para Encanto”, concluiu. “Estou tão feliz que a 60ª animação da Disney é uma celebração de uma família latina multigeracional.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.