Se o total de resíduos recolhidos nas ruas e avenidas de Ribeirão Preto -, principalmente da construção civil – entre janeiro e agosto, fosse colocado em caminhões com capacidade de carga de 6,5 toneladas cada um, e eles fossem enfileirados formariam uma longa fila com 1.050 caminhões. Depositado irregularmente em locais públicos este material totalizou 6.825 toneladas de entulhos, o que equivale a uma média diária de 28,5 toneladas e quatro viagens diárias dos caminhões da prefeitura até a usina de reciclagem de construção civil localizada na zona norte da cidade. A capacidade de carga dos veículos do município que realizam este serviço é de seis toneladas e meia, cada um. Os dados fazem parte de levantamento feito pela prefeitura ao pedido do Tribuna.
Moradora da Vila Virgínia e proprietária de uma salgadeira na avenida Luzitana com a avenida do Andradas, Isabel Cristina Bueno, convive com parte desta “montanha de entulho”,desde que abriu seu estabelecimento no local, há quatro anos. Próximo ao seu comércio um terreno é utilizado como local de descarte e a comerciante é enfática ao afirmar que tanto a população e – principalmente o poder público – precisam fazer sua parte para acabar com estas irregularidades. No caso de donos de terrenos abandonados Isabel diz que eles devem ser penalizados por não construírem muros e calçadas evitando assim, que sejam utilizados para depósitos de lixo. Já a prefeitura, segundo ela, tem que dar o exemplo e conservar as áreas públicas limpas. “Pagamos muitos impostos e ainda temos que conviver com este descaso”, afirma. Seu vizinho de bairro, Willian Moura também tem opinião semelhante. Para ele um exemplo de que o poder público precisa agir rapidamente é a área existente entre as ruas Arthur Ramos, Paulo de Frontim e João Guião que se transformou em um grande depósito de lixo. “É preciso que o governo faça alguma coisa para acabar com este depósito irregular”, diz.
Tentativas frustradas
O depósito clandestino de entulhos em Ribeirão Preto não é algo recente e nem parece próximo do fim. Em 2014 para tentar acabar com esta irregularidade a administração municipal da ex-prefeita Dárcy Vera, criou o programa “Caçambas Sociais” que consistia na instalação destes equipamentos em varias regiões da cidade para que a população fizesse o descarte de entulhos. A iniciativa, contudo, não resolveu o problema por vários motivos. O primeiro, o fato de que em vários locais as caçambas não suportaram a grande demanda, o que acabou criando verdadeiros lixões no entorno delas.
Outro fator é que parte da população não leva o material até as caçambas e prefere depositá-los em locais próximos aos imóveis de onde foram retirados. As caçambas sociais foram criadas a partir de um TAC – Termo de Ajustamento de Conduta – assinado pela Prefeitura que estabelecia a instalação de seis eco pontos para entulhos.
De acordo com a prefeitura este problema só terá fim se houver a conscientização de que estes equipamentos foram instalados para o descarte de pequenos volumes de resíduos, principalmente de construção civil. Já grandes quantidades, segundo o governo, precisam ser descartadas de maneira correta com a contratação de caçambas particulares pelos usuários.
Atualmente as caçambas sociais estão instaladas na Avenida Patriarca, próximo à rua Pedreira de Freitas, no Jardim Branca Salles; na Avenida Octávio Golfeto com a Rua Américo Batista, no Jardim Procópio; na Avenida Ettore e Aurora Coraucci, no Jardim Orestes Lopes de Camargo; na Avenida Francisco Massaro com Avenida Rio Pardo, no Jardim Paiva e na Avenida Monteiro Lobato.
Multas
O descarte irregular em locais públicos ou particulares prevê multas. Os donos de terrenos que não cuidam de sua propriedade são multados de acordo com o tamanho da área e as penalidades variam de R$ 899,50 a R$ 1.542,00. O cálculo tem como base a Ufesp – Unidade fiscal do Estado de São Paulo, que vale hoje R$ 25,70. Já o descarte de materiais relacionados à construção civil tem penalidades que variam de R$ 2 mil a R$ 5 mil.
Um levantamento da administração municipal revela que os locais com maior descarte irregular são os seguintes: ruas Wanderley Taffo com Arthur de Jesus Campos no bairro Quintino Facci II, avenidas General Euclydes Figueiredo e Wilquem Neves, no bairro Adelino Simioni; rua Primo Tronco, na Vila Virgínia, avenida dos Andradas no cruzamento com avenida Luzitana; avenida Patriarca e estrada de terra para o Distrito de Cruz das Posses.
Cata-trecos recebe sete pedidos por dia
O serviço de “Cata-trecos do município atendeu de janeiro a agosto 1.363 solicitações de munícipes, uma média de sete solicitações por dia. Realizado pela CLU – Coordenadoria de Limpeza Urbana – o serviço faz o recolhimento de materiais, como sofás, eletrônicos e outros eletrodomésticos.
Na prática funciona da seguinte maneira: o munícipe solicita o serviço através do telefone 156 e a equipe da Prefeitura vai até o local fazer a remoção. Os materiais recolhidos são levados para a área de transbordo e depois para o aterro sanitário de Ribeirão Preto.
Na década de 70, personagem ‘porcalhão’ virou sucesso nacional
Em 1974 o hábito de se jogar lixo em locais impróprios e de “emporcalhar” as cidades ganhou destaque nacional graças ao personagem de desenho animado “Sujsmundo”. Criado pelo publicitário Ruy Perotti,o personagem foi idealizado pelo Governo Federal da época, para estrelar uma campanha publicitária exibida nas emissoras de televisão e nos cinemas, neste caso, antes da exibição dos filmes.
O objetivo da campanha feita pelo regime militar era valorizar o civismo. Nos comerciais da série “Povo limpo é povo desenvolvido” o personagem mostrava seus maus hábitos, entre eles, jogar lixo no chão. Os comerciais foram exibidos numa série de quatro filmes, que variavam entre 70 e 90 segundos de duração. Também foram produzidos cartazes e jingles.
O sucesso do personagem foi tanto que novas animações, não previstas no projeto original, foram feitas, incluindo novos personagens, como o “Sujismundinho”, o filho que aprende os bons hábitos de limpeza, e o “Doutor Prevenildo”, que dava um tom didático à campanha. Os comerciais saíram do ar no final da década de 70, mas o hábito de jogar lixo em locais públicos urbanos parece continuar “vivo” pelo país afora.
Só para exemplificar na década de 70, o Brasil tinha 90 milhões de habitantes e, segundo dados do IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada –,55,9% % vivia nas cidades e 44,1% na zona rural. Atualmente este percentual, segundo o Censo de 2010 é de 15,65% da população vivendo em situação rural, contra 84,35% em situação urbana, o que implica na necessidade de ações mais arrojadas do poder público e da população para a manutenção e conservação das cidades.