Por Gustavo Porto, enviado especial
Maior celeiro agropecuário do País, Mato Grosso busca no etanol a saída para reduzir gargalos econômicos e logísticos gerados por um excedente anual de 25 milhões de toneladas de milho – 27% da oferta brasileira. Essa é a produção que não é consumida localmente, mas que enfrenta desafios para ser levada para outras regiões. Nessa nova rota do biocombustível, o cenário é animador, mas também aponta desafios.
Ao mesmo tempo em que o processamento do milho para se obter álcool gera subprodutos que proporcionam remuneração extra ao produtor, como o farelo, alimento de qualidade e de menor custo para o rebanho de 30 milhões de bovinos do Estado, a expansão do combustível precisa ser acompanhada de avanços nas questões estruturais. Entraves observados em anos de ampla produção de milho, entre eles dificuldade de escoamento e preço baixo, podem ser um limitador no futuro.
Com 11 usinas, Mato Grosso é autossuficiente em álcool. Consome um terço do 1,4 bilhão de litros que oferta. Três das unidades existentes no Estado são flex e já produzem o biocombustível com o uso de cana-de-açúcar e milho. As outras oito usam apenas cana Em agosto, foi inaugurada em Lucas do Rio Verde (MT) a primeira unidade produtora de álcool exclusivamente do cereal, a FS Bioenergia.
Produtores dessa região, principal polo produtor de milho naquele Estado, sofrem para escoar os grãos. Até o terminal ferroviário mais próximo, em Rondonópolis (MT), são 600 quilômetros ao sul por rodovia. Uma alternativa, ao norte, é enfrentar 1.100 quilômetros pela BR-163, com trechos precários, para exportar pelo porto de Miritituba (PA). O resultado do gargalo logístico é que o preço do frete dobra e a competitividade do milho diminui.
Em Lucas do Rio Verde, distante 330 quilômetros ao norte da capital Cuiabá, há uma mistura de euforia com a FS Bioenergia e desconfiança de produtores sobre o potencial de reação dos preços do cereal. Empresário rural e prefeito luverdense no primeiro mandato, Luiz Binotti (PSD) diz que o primeiro ponto positivo da chegada da FS é a geração de empregos, “com remuneração melhor e profissionais de alto conhecimento”.
Menos otimista, o presidente do Sindicato Rural local, Carlos Alberto Simon, diz que os preços do milho já mostram reação, mas é cauteloso sobre a possibilidade de isso ser uma tendência. Segundo ele, a saca de 60 quilos a ser entregue à FS Bioenergia no segundo semestre de 2018 já foi comercializada entre R$ 16,00 e R$ 16,50, alta de até 22% em relação ao valor de mercado atual, de R$ 13,50. “Ainda é baixo, mas é uma melhora”, pondera
Flex
A 150 quilômetros de Lucas do Rio Verde, em São José do Rio Claro (MT), está a Destilaria de Álcool Libra, uma das três usinas flex mato-grossenses. Lá, já virou realidade aquilo que em Lucas do Rio Verde é uma expectativa. De acordo com o diretor comercial da Libra, Celso Eduardo Ticianeli, o etanol de milho responde por 35% da receita da companhia, o farelo por 25% e o álcool de cana pelos 40% restantes.
Os pecuaristas agradecem. “O farelo de milho tem quantidade de proteína comparada ao de soja, é mais barato e, pelo alto teor de umidade, é mais palatável aos animais”, diz Jefferson Albino, gestor da unidade da empresa de pecuária LFPEC em Diamantino (MT), a 50 quilômetros da Libra.
Mas a cana é considerada indispensável para as usinas flex por gerar o bagaço. A biomassa é queimada em caldeiras e transformada em energia elétrica, insumo fundamental na unidade fabril. Quem não dispõe de cana utiliza eucalipto picado como biomassa para a produção de energia. Estudo feito pelo Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) aponta que a construção de novas usinas do biocombustível a partir do milho terá como fator limitador justamente a oferta restrita de biomassa para a geração de energia.
O governo federal trata o advento das usinas de etanol de milho como “uma revolução”, pelos impactos econômicos, sociais e até fundiários gerados onde as unidades são instaladas. Para o diretor de biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia, Miguel Ivan Lacerda, a rota alternativa de produção do bicombustível “cria uma nova fronteira de desenvolvimento”.
O ex-governador e senador licenciado de Mato Grosso, o ministro da Agricultura Blairo Maggi, diz que, “diferentemente de uma usina de cana, que precisa mudar todo sistema fundiário e social para ser instalada, a implantação de uma usina de milho vem como incremento para a região produtora do grão”.
Apesar do protagonismo estadual, o uso do milho na produção de etanol e de farelo para a pecuária não deverá ser restrito às lavouras mato-grossenses, para o ex-presidente e conselheiro consultivo da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado de Mato Grosso (Aprosoja) Glauber Silveira. “Se o etanol de milho é viável a até R$ 36 a saca, como mostra estudo do Imea, e como unidades flex precisam de menos investimentos, o maior potencial de crescimento da nova rota está em usinas de cana de São Paulo”, diz, referindo-se à principal região canavieira do mundo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.