Professor aposentado da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP) – campus de Ribeirão Preto -, o professor, escritor e especialista Alberto Borges Matias, afirma que é preciso mudar a ideia de que a participação do cidadão deve se restringir a votar ou criticar as ações de seus representantes.
Presidente do Observatório Social de Ribeirão Preto, ele acredita que até o final do ano a Prefeitura deve zerar todo o ‘restos a pagar’ com os fornecedores e alcançar superávit operacional de cerca de R$ 200 milhões. “Só que, com a cobertura do déficit do IPM, de cerca de R$ 360 milhões, fechará no vermelho em R$ 160 milhões”, diz.
Em entrevista ao Tribuna o professor falou sobre as ações e projetos do Observatório Social de Ribeirão Preto, e sobre política nacional e ribeirão-pretana. O Observatório Social de Ribeirão Preto (OBSRP) é uma entidade sem fins lucrativos, associada ao Observatório Social do Brasil – OSB, e um espaço apartidário, que atua em favor da transparência e da qualidade na aplicação dos recursos públicos, com o objetivo de contribuir para a melhoria da gestão pública.
Tribuna – De um modo geral, é tido como “voz corrente,” que a maioria da população desconhece o que as entidades da sociedade civil realizam. O senhor concorda com este raciocínio?
Alberto Borges Matias – Infelizmente, historicamente, a população não foi preparada e incentivada a participar ativamente das questões que envolvem a administração pública. Essa postura está mudando, mas é necessário que a população tenha consciência de sua participação na confecção de seu próprio futuro.
O que precisamos mudar é a ideia de que a participação do cidadão deve se restringir a votar ou criticar as ações de seus representantes. É possível acompanhar as ações e propor melhorias justamente por meio de entidades da sociedade civil como é o caso do Observatório Social, mas também por meio de associações como a ACIRP, entidades como CIESP, Instituto Ribeirão 2030, sindicatos e movimentos sociais legítimos.
A participação da sociedade por meio da união de forças é fundamental. Talvez o cidadão não se dê conta, mas ações como as Novas Medidas Contra a Corrupção, surgiram da mobilização de entidades da sociedade civil como a Transparência Internacional, Observatório Social do Brasil e Instituto Ethos.
Tribuna – Quais são os principais projetos do Observatório Social de Ribeirão Preto?
Alberto Matias – Ele atua em várias frentes sempre com um objetivo único: contribuir para a melhoria da gestão pública atuando na promoção da transparência e na qualidade dos gastos públicos. Por meio de voluntários, temos grupos de trabalho que acompanham e sugerem melhorias nas áreas de Gestão Pública, tanto do Executivo quanto do Legislativo, promovendo também Educação Fiscal, Transparência e melhorando o Ambiente de Negócios no município.
Temos promovido diversas ações que ganharam bastante destaque como o Transparenciômetro da Câmara Municipal, que mede o nível de transparência da Câmara por meio do cumprimento ou não de metas estabelecidas. Da mesma forma, nossa Comissão de Acompanhamento Legislativo tem acompanhado e questionado os gastos da Câmara. Também oficiamos a Prefeitura para que realize, de forma eficiente, o chamado “tapa-buraco”.
O procedimento que observamos na maior parte da cidade é um enorme desperdício de dinheiro público, existente há décadas.
Para o acompanhamento dos gastos públicos municipais utilizamos o software RevelaGov que utiliza inteligência artificial para levantar os gastos do poder público e comparar com outros municípios, por exemplo. Desta forma conseguimos identificar onde está o mau uso do dinheiro do contribuinte.
Também acompanhamos de perto o gravíssimo déficit do Instituto de Previdência do Município (IPM) e junto com outras entidades como a Associação Comercial e Industrial de Ribeirão Preto (ACIRP) e o Instituto Ribeirão 2030 elaboramos propostas que precisam ser discutidas entre administração municipal, população e servidores. Nosso grupo de trabalho de Educação Fiscal está engajado na campanha de incentivo à destinação de 3% do Imposto de Renda devido pelas pessoas físicas, diretamente no momento da declaração.
Tribuna – O que tem sido feito para ampliar a inserção do Observatório junto à população?
Alberto Matias – O Observatório está sempre aberto a receber novos voluntários que podem entrar em contato pelo site (http://www. observatoriosocialrp.org.br/) ou por meio da página do Observatório no Facebook. Ano passado, realizamos uma palestra com o Procurador do Ministério Público Federal em Curitiba e coordenador da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, que contou com a participação de centenas de pessoas. Convidamos o público presente no evento e conseguimos reforçar nossa equipe com voluntários de excelente perfil.
Tribuna – Qualquer pessoa pode ser membro da entidade?
Alberto Matias – Existem várias formas de participar e pessoas de diversos perfis são bem-vindas. O mais importante é que possuam os mesmos valores que a entidade defende: ética, responsabilidade social e ambiental, respeito pela constituição e apartidarismo. Nosso estatuto também limita a participação de pessoas que ocupem cargos eletivos ou de confiança na administração pública municipal e pessoas que sejam filiadas a partidos políticos.
Tribuna – Um dos objetivos que o Observatório defende é a justiça social. De maneira mais específica, no caso de Ribeirão Preto, o que isso significa?
Alberto Matias – Os objetivos do Observatório são ligados ao monitoramento dos princípios constitucionais da Administração Pública, em especial com relação à transparência e ao bom uso do dinheiro público e também promovendo a educação fiscal. Entendemos que a participação da sociedade nestes pontos, melhorando a aplicação dos recursos disponíveis, colabora para que os objetivos da Constituição Federal sejam atingidos em sua plenitude e isso inclui dentre tantos pontos a Justiça Social.
Tribuna – O senhor há muito tempo acompanha a vida política da cidade. Que avaliação faz da classe política ribeirão-pretana?
Alberto Matias – A classe política ribeirão-pretana representa a sociedade e tem debatido e incentivado as atividades do Observatório de forma muito positiva, como no caso do Transparenciômetro.
Tribuna – O senhor foi um dos membros da comissão de transição da antiga para a nova administração municipal em Ribeirão Preto. Por que não faz parte do governo?
Alberto Matias – Foi um trabalho relevante no qual pude contribuir com o diagnóstico da situação financeira da Prefeitura e prognóstico de algumas ações. Fui convidado para ocupar Secretaria, pelo que agradeci, mas considero ser mais útil fora da estrutura pública.
Tribuna – Quais são os principais erros e acertos da administração atual?
Alberto Matias – A administração recebeu uma organização desestruturada e em péssima situação financeira. Nestes poucos anos de governo conseguiu tapar muitos buracos, não todos, tanto nas ruas quanto nos diversos setores, com a participação de inúmeros bons gestores e funcionários públicos.
Tribuna – Como especialista na área de administração, o que Ribeirão Preto precisa fazer para sair da crise financeira que enfrenta?
Alberto Matias – Inúmeras ações foram realizadas com efeito positivo nas finanças municipais. Durante este ano de 2019, a Prefeitura deve zerar todo o restos a pagar e ter, até o final do ano, um superávit operacional de cerca de R$ 200 milhões. Só que com a cobertura do déficit do IPM de cerca de R$ 360 milhões, fechará no vermelho em cerca de R$ 160 milhões.
Tribuna – Em sua opinião o atual governo federal está no caminho certo?
Alberto Matias – Em apenas três meses foram privatizados inúmeros portos e aeroportos, o enorme déficit primário foi reduzido e o mercado financeiro já prevê que zere em 2021. A projeção de inflação é de cerca de quatro por cento para este e os próximos três anos. O Brasil voltou a crescer. Na maioria dos municípios há contratações maiores do que as demissões. Enfim, voltamos a acreditar no futuro.