Boa parte do mundo, e principalmente o Brasil vivem momentos de discórdia e escuridão, e os menos culpados estão sofrendo e pagando apenas por terem vindo a este mundo. O sofrimento da maioria das crianças nascidas no ceio das famílias vulneráveis a pobreza e a exclusão social começa ainda no ventre de suas mães. Mas a desigualdade social não está, e nunca esteve na pauta dos nossos governantes – cuidam apenas do trivial, e lutam com ardor para manter as suas riquezas longe do alcance dessa gente miserável.
A luta das mães por uma vaga em creche vem se arrastando há décadas, mas a educação básica não recebe o tratamento equânime previsto na Constituição – não faz parte do projeto de governo de gente acostumada a lamber as botas dos poderosos. E vamos caminhando neste calvário de desilusões esperando que algum dia tudo seja diferente.
Não há uma educação para a cidadania; nem na família e nem na escola, e com isso os pequeninos vão percorrendo os seus caminhos autonomamente, e descobrindo através do sofrimento uma maneira mais “suave” para sobreviver. São tratados com violência física e psicológica desde tenra idade – no seio das famílias, nas comunidades e muitas vezes nas escolas, o que mais ouvem, principalmente das mães: “eu vou te bater, e você vai apanhar”, e com isso a violência passa a ser encarada com naturalidade – a vida miserável que as crianças são submetidas desde a concepção, se alarga após o nascimento. Convivem em um ambiente insalubre durante toda a infância, e muitas vezes por falta de oportunidade pelo resto de seus dias.
A escola básica pública prevista na Constituição, e nas leis complementares que dão as diretrizes para o seu funcionamento não se materializa – vive marcando passo presa ao passado – com algumas e raras exceções que destoam da mesmice tradicional, e por este motivo são ignoradas.
A escola vive presa e preocupada com a rigidez de horários, com o cumprimento de metas que foram estabelecidas por quem não vive o dia a dia, e não sabe a realidade de cada comunidade. O aluno é o principal ator da educação, mas é tratado como um número frio, ainda se preserva a ideia que o aluno não traz nenhuma contribuição para a construção do Projeto Político Pedagógico da escola – é apenas um ouvinte que vai decorando as matérias que são impostas, que não têm nada a ver com a realidade das suas comunidades – apenas decoram as matérias do bimestre para não serem jogados na vala comum da repetência – viram estatísticas.
Conversando com a meninada salta aos olhos a quantidade de talentos que são desperdiçados, pois são expulsos das escolas públicas por não se enquadrarem a um sistema cruel e ultrapassado – isso mostra o quanto à escola pública é excludente. Mas é mais fácil criminalizar a criança e seus familiares do que cumprir a lei. Ouvir o aluno o tempo todo, talvez seja a principal ação pedagógica dos docentes e da escola.
Havia um aluno que estudava no período da tarde, e para fazer jus à rotulação que recebem os alunos deste período – era considerado como um indisciplinado, e que não conseguia absorver os conteúdos. Ele chegava à escola antes das 12 horas, mas o portão só abria 12h50. Quando alguém saia ou chegava ele tentava entrar e não tinha êxito.
Um dia alguém vendo esta situação perguntou ao menino por que ele chegava tão cedo, sabendo que o portão estaria fechado – respondeu que não tinha almoço na sua casa, e achava que se chegasse mais cedo conseguiria almoçar. A partir daquele dia a diretora que autorizou a sua entrada mais cedo, e que fosse servido o almoço para ele. Depois desse dia seu comportamento mudou, e também o seu aprendizado. Eles têm que serem ouvidos, pois não são os culpados!