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Ele se foi

Cada um no seu dia, na sua vez. Chegou o dia de Saulo Go­mes, e ele se foi. Precisou a morte alvejá-lo dormindo porque o resistente resistiria, como resistia nos seus 91 anos de vida.
E, não adianta, por mais que se tenha vivido, como ele a viveu, a morte é um verdadeiro tsunami, na vida familiar e social. Aquele vazio deixado pela presença física raramente é assumido como um sinal de uma passagem abençoada para uma dimensão imaterial e fluídica, que promete retorno.

O Saulo Gomes dedicou-se ao jornalismo, e nessa pro­fissão em que se recolhe o fato para fazê-lo conhecido por mi­lhões de pessoas, foi um exemplo de dedicação, competência, na captura do que podia, sim, interessar, com uma caracterís­tica incomum, e que fica como um trunfo, para quem desejar aprender a fazer jornalismo como verdadeiro cirurgião social, que lanceta o fato capturado para desvendar suas entranhas. Um mestre da investigação.

A vida toda ele foi assim. Do matador de Che Guevara ao meteorito de São Simão, morte de PC Farias, passando pelos jangadeiros do Nordeste, na turbulência do mar, entre Rio de Janeiro e Santos, na viagem inesperadamente prolongada, sob a chuva e o sol clemente, ele, na jangada, vivendo o que seria sua outra grande reportagem, junto aos anseios de justiça daqueles homens do sal, que vieram para pedir ao governo melhores condições de vida para os irmãos pescadores.

A política e seus lideres enriquecem seu patrimônio de re­portagem, que seguramente darão tantos outros livros, além daquele que Adriana Silva divulgou com ele.

Aquela personalidade suave, mas pertinaz, foi cassado pelo golpe institucional de 1964, indo para o Uruguai. Com seu faro de jornalista, na epopeia de 1961, quando Leonel Bri­zola, discursando pela rede da legalidade, levantava a nação brasileira contra a Junta Militar que negava a posse de Jango Goulart, Saulo estava ao lado do governador do Rio Grande do Sul naquela hora.

A morte o surpreendeu como vice-presidente da Associa­ção Brasileira de Anistiados Políticos, o que o obrigava a ir frequentemente a Brasília.

Mas, não falar do que ele representou na divulgação da pessoa e da obra espírita de Chico Xavier, desde o programa da antiga Televisão Tupi, até que a morte o levou, é desprezar um trabalho radiofônico, televisivo, divulgador de livros, é forçar uma redução da verdade, verdadeiramente impossível.

Assim ele nos deixa, para ter dois sentimentos que podem ser declarados como convergentes, apesar de aparentemente contraditórios – o de pêsames pela ausência física e o de pa­rabéns à família enlutada pela obra gigantesca que ele deixa, com o exercício continuado da garantia constitucional da liberdade da palavra, que é fundamental na democracia.

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