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Dois contos de réis

Primeiro:

Nas terras da minha infância incrustadas nas Gerais, dois indivíduos se revezavam para ocupar a cadeira de primeiro man­datário da província, pertencentes às nefastas Arena 1 e Arena 2, dignos representantes da Ditadura Militar e seu braço da calúnia, UDN, minha família era do extinto PSD e militava no MDB, um emaranhado de esquerda, direita, centro e demais grupos.

Um destes indivíduos resolveu construir uma fonte lumi­nosa no vilarejo, a obra caminhando, a população contente, sonhando com o bolo, advindo do milagre do “Delfim Neto”, que seria repartido entre todos, mas que foi comido como sempre por meia dúzia de ungidos.

Ao chegar o grande dia do teste, o burgomestre, seus capa­chos, sabujos, lambe-botas, bajuladores e áulicos, moradores e curiosos, atônitos com as águas subindo e dançando num festival de cores, tal qual as bandeirinhas de “Alfredo Volpi”.

Em um determinado momento, o alcaide, visivelmente de­cepcionado chamou o engenheiro ao lado e exigiu: Quero que a água suba muito mais. O professor da UFMG, contratado especialmente para a empreita, explicou que era impossível devido à “Teoria da Gravitação Universal – Lei da Gravidade”. O ignaro e ditatorial senhor vociferou:

Se esta lei for municipal, revogo já, se for estadual, falo com o Rondon Pacheco e se for federal, iremos ao coronel, o tenente brigadeiro do ar, o almirante de esquadra, e quiçá, o general do Exército no Palácio do Planalto.

Isaac Newton deve ter revirado na cova.

Segundo:

Na província comandavam poucos homens, o padre, o prefeito, o juiz, o delegado, o coletor de impostos e o gerente do Banco do Brasil, com a chegada da ditadura o sargento do “Tiro de Guerra”, passou a fazer parte da seleta “trupe”.

Os funcionários do banco quase sempre vinham transferidos de outras cidades, considerados “um bom partido” e, quase sempre, contraíam núpcias com as jovens e virgens senhorinhas do lugar.

Em uma manhã ensolarada de segunda-feira, adentra a agên­cia, lotada com seus cafeicultores, produtores de leite, pecuaristas e toda a elite rural, uma senhora, na meia idade, com uma som­brinha e um vestido multicoloridos, um imenso batom vermelho na boca, toda empetecada, dirigindo-se à primeira mesa, ocupada por uma bela morena cor de jambo, dois olhos de jabuticabas e um cabelo mais negro que a asa da graúna, caindo sobre seus ombros, lembrando as noites escuras de trovoadas, indagou:

Aqui que é o Banco do “Brasilis”?

Moça, quero falar com o Seo Haroldo (nome fictício), o funcionário era bem casado com donzela de destaque nos acontecimentos sociais do Distrito, filha de um abastado “coronel do café”, afeita aos quitutes, chás e cafés em seus rega-bofes nas tardes de completo ócio.

O conhecido servidor, que era caixa, jogou-se imediatamente ao chão, ficando em posição fetal, bem no fundo do mobiliário.

A bela atendente do Norte de Minas, sob os olhares atôni­tos de funcionários, clientes e curiosos, todos balançando os dedos em negativas para a assustada funcionária, que assim respondeu à senhora.

O Haroldo viajou, está de férias e licença-prêmio, como posso ajudá-la?

Com aquela voz de locutor de novelas radiofônicas no último volume ela fez as paredes seculares da instituição financeira tremerem.

Vim buscar o dinheiro que ele “drumiu” com a “Das Do­res” e não pagou.

A sociedade e o Banco do Brasil jamais foram os mesmos na região.

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