Num discurso de cerimônia de posse em que não citou expressamente a operação Lava Jato e em que fez questão de ressaltar a atuação múltipla do Ministério Público Federal (MPF), a nova procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmou na manhã desta segunda-feira que o povo brasileiro “não tolera a corrupção” e que o país “passa por um momento de depuração”.
“O país passa por um momento de depuração. Os órgãos do sistema de administração de justiça têm no respeito e harmonia entre as instituições a pedra angular que equilibra a relação necessária para se fazer justiça em cada caso concreto — disse Raquel após ser empossada como procuradora-geral.
Na mesa da cerimônia que deu posse a Raquel no cargo, no começo da manhã desta segunda-feira, estavam o presidente da República, Michel Temer, e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE).
O primeiro foi denunciado pelo antecessor de Raquel, Rodrigo Janot, por corrupção passiva, organização criminosa e obstrução de Justiça. Os outros são investigados em dois inquéritos cada, dentro da Lava-Jato, também por pedido de Janot.
Temer, Maia e Eunício, alvos da Lava-Jato, ouviram a procuradora-geral fazer uma citação ao papa Francisco, numa passagem sobre corrupção:
“O papa Francisco nos ensina que a corrupção não é um ato, mas uma condição, um estado pessoal e social, no qual a pessoa se habitua a viver. O corrupto está tão fechado e satisfeito em alimentar a sua autossuficiência que não se deixa questionar por nada nem por ninguém. Construiu uma autoestima que se baseia em atitudes fraudulentas. Passa a vida buscando os atalhos do oportunismo, ao preço de sua própria dignidade e da dignidade dos outros. A corrupção faz perder o pudor que protege a verdade, a bondade e a beleza.
Raquel fez uma segunda citação em seu discurso de posse, da poeta goiana Cora Coralina. A procuradora-geral também é goiana. A citação encerrou o discurso:
“Neste início de mandato, peço a proteção de Deus para que nos momentos em que eu for colocada à prova, não hesite em proteger as liberdades, em cumprir o meu dever com responsabilidade, em fazer aplicar a Constituição e as leis, para entregar adiante com segurança o legado que recebo agora, e que eu então possa dizer, parafraseando a grande poetisa Cora Coralina, de meu amado estado de Goiás, que contribuí para que haja mais esperança nos nossos passos do que tristeza em nossos ombros.
STF e Congresso – Em seu discurso, Raquel defendeu que “o devido processo legal é um direito” e que a harmonia entre os poderes “é um requisito para a estabilidade da nação”. A procuradora-geral fez deferências ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Congresso Nacional:
“Os órgãos do sistema de administração de justiça têm no respeito e harmonia entre as instituições a pedra angular que equilibra a relação necessária para se fazer justiça em cada caso concreto.
Ela deixou claro que a atuação do Ministério Público vai além do combate à corrupção. A Operação Lava Jato foi o carro-chefe da gestão de Janot.
“O Ministério Público deve promover justiça, defender a democracia, zelar pelo bem comum e pelo meio ambiente, assegurar voz a quem não a tem e garantir que ninguém esteja acima da lei e ninguém esteja abaixo da lei”, disse Raquel.
Raquel e Janot são integrantes de alas opostas dentro da PGR. Ela cumprimentou seu antecessor “por seu serviço à nação”. Foi a única frase dirigida explicitamente à Janot, que não compareceu à cerimônia de posse.