O drama humano, recolhido em processos judiciais, revela as paixões, os interesses, os direitos pelos quais se movem as pessoas. A ética, no profissional, às vezes, é arquivada.
A história, acontecida em algum lugar desse machucado planeta-terra, é da mulher que foi declarada divorciada, sem o saber.
Naquela relação pouco civilizada, até a irmã do marido, se constituía num martelo de ofensas humilhantes, dignas de transtornar o espírito da mulher, porque seguidas e duradouras.
Certamente, muito antes, em dia de distração, na relação conjugal trepidante, ela assinara uma procuração (mandato) com espaços em branco.
Através de falas e indiretas da irmã, seu interesse em saber a verdade confirmou-a, através da terceira pessoa com a qual pedira para desfazer a dúvida. Era verdade, ela estava divorciada.
Como se deu tal artimanha, judicialmente tratada e consumada?
O marido em sua petição inicial declarou que a procuração dela estava anexada. Não estava. Na verdade, ele esperou a distribuição da ação, para ter o número do processo e a Vara que o julgaria.
Os espaços foram preenchidos à mão, com o número e a Vara.
Como ambos manifestaram, aparentemente, a vontade do divórcio, não foram ouvidos em juízo. Nesse sentido falou o Ministério Público, assim ficou declarado na sentença homologatória, que transitou em julgado.
A regulamentação das visitas, na guarda compartilhada, tal como ele escreveu na petição inicial, ficou capenga, a favor dele, uma semana os dois filhos menores podiam ficar com ele, outra com ela. Na prática, ele determina o fica ou não fica. Ela sem trabalho e sem renda ficou sem pensão, ainda que temporária.
Descoberta. Ela ingressa com o pedido de nulidade da sentença homologatória do divórcio. Opta pela jurisprudência que diz ser caso de declaração de nulidade e não ação rescisória, cujo ingresso seria no Tribunal Superior.
O fundamento dessa ação de nulidade? No direito brasileiro para se casar, por procuração (mandato), esse documento deve ser público, com poderes especiais, e com validade por noventa dias. E um contrato (e procuração é um contrato), só pode ser rescindido pela mesma forma jurídica pela qual ele foi constituído. No caso, o divórcio só poderia ser realizado mediante mandato (procuração) público e com poderes especiais.
Mais ainda. A teoria do mandato (procuração) ensina que aquele que outorga e aquele que recebe um mandato (procuração) pratica um ato de amizade, de confiança e até de amor.
No caso, o marido, à época da data da assinatura da procuração, que ele utilizou na ação de divórcio, respondia ação penal, no Anexo da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, na qual foi condenado.
Fica provado, só com a existência da ação penal, que não existia nem confiança, se valesse procuração particular para o ato do divórcio.