Luiz Paulo Tupynambá *
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“A esperança dança / Na corda bamba de sombrinha/ E em cada passo dessa linha/Pode se machucar…” Trecho da canção “O bêbado e a equilibrista” – de Aldir Blanc e João Bosco
Semana passada, comecei a falar do ano de 2024 e da profusão de eleições que acontecerão espalhadas pelo mundo. Seus resultados afetarão todo o desenrolar da próxima década. A economia e, principalmente, a geopolítica, mudarão num movimento de placas tectônicas. Esperam-se terremotos econômicos e sociais em todos os cantos do mundo.
Hoje quero fechar a análise do cenário da eleição presidencial nos Estados Unidos. Apesar dos percalços jurídicos que vem enfrentando, Donald Trump está perto do seu objetivo principal, o qual é o de ser oficialmente candidato à presidência. Está convencido de que, a partir daí, os tribunais não poderão alcançá-lo. Já conseguiu os 1.125 delegados necessários para a indicação do Partido Republicano. Na prática, Trump já é candidato. Assim como Joe Biden, é candidato à reeleição, pois conseguiu o número necessário de delegados pelo Partido Democrata. Convenções Gerais dos dois partidos, em julho, são meras formalidades, verdadeiros shows midiáticos para lançar as campanhas dos candidatos.
Biden é um governante previsível, não deve apresentar ideias ou propor projetos novos, que provoquem grandes debates nacionais. Vai tentar destacar a economia, que atravessa um bom período, recuperada da crise causada pela pandemia. Isso e mais ações pontuais de seu governo nas áreas de saúde, cidadania e educação. Sua linha de campanha tentará traçar uma divisória entre um governo tranquilo e economicamente estável que propõe com um provável governo polêmico, instável e ameaçador ao sistema democrático estadunidense tradicional, visto pelos democratas como o futuro com Trump. É uma abordagem perigosa, pois é nesse tipo de embate que Trump se sai melhor.
A política exterior de Biden vem sendo questionada com veemência. É considerado tíbio no enfrentamento comercial com os chineses e de ser péssimo negociante. A iniciativa democrata de proibir o Tik-Tok, plataforma de mídia social mais utilizada pelos estadunidenses, acabou sendo um tiro no pé em termos eleitorais. Em vez de agradar à turma anti-chinesa, que na verdade, quer que o Tik-Tok passe para mãos de empresários dos Estados Unidos e não o seu fim, a aprovação da proibição em primeira instância na Câmara dos Deputados causou um rebuliço popular, com manifestações até na porta da Casa Branca. Na terra do Facebook e Instagram, a maioria do povo prefere o concorrente chinês para mostrar a cara e faturar algum com visualizações e vendas, sem ter que pagar nada para o Zuckerberg. Alguns deputados republicanos mais desavisados votaram com os democratas, desobedecendo à orientação do partido, e acabaram “levando um sabão” público de Trump, que não perdeu tempo para ganhar uns pontos, mesmo que fosse nas costas de correligionários.
Biden também acabou enroscado com a demora da definição da situação na Ucrânia, pois está “torrando” muito dinheiro público para ajudar os ucranianos em sua guerra com os russos. A população dos Estados Unidos não aprova mais esses gastos e isso está refletindo nas pesquisas de intenção de voto. O apoio imediato a Israel, com fornecimento de armas e dinheiro, num primeiro momento rendeu dividendos eleitorais para Biden. Porém, a contraofensiva insana do exército de Israel, o radicalismo sionista das lideranças políticas no poder, o bombardeio indiscriminado que mata civis, na maioria mulheres e crianças, tudo acabou por torpedear a candidatura Biden, principalmente entre os jovens mais ligados às teses democratas e imigrantes de origem árabe. Trump vem trombeteando que, se eleito, vai reativar os Acordos de Abraão, negociados com israelenses, sauditas e egípcios pelo seu genro Jared Kushner e salvar a paz na região. Não falou onde os palestinos, libaneses e sírios entram nessa equação.
Hoje, o cidadão comum estadunidense encara o imigrante como a maior ameaça à sua vida. Ele não quer saber de gastar dinheiro para defender sul-coreanos, japoneses, ucranianos ou quaisquer outros. Muito menos gente de pele mais (mesmo que pouco) escura que a dele próprio. Trump não tergiversa como Biden, vai direto ao ponto. Pau no lombo dos imigrantes. Isso o eleitor dele entende e apoia. A idade de Biden, seu jeito comedido de andar e falar, denotando insegurança, vão ser explorados à exaustão pela campanha de Trump.
A vitória de Trump não significará desta vez apenas a derrota de um candidato democrata. Quatro anos atrás, Biden venceu e tinha tudo para fazer uma administração que sequer permitisse a volta de Trump à disputa de um tira-teima. Não fez. Se perder em novembro, a derrotada será a democracia liberal americana. Aquela dos quatro fundadores, pensada por John Adams e companheiros. Qual democracia um segundo mandato de Trump deixará? Aquela que vimos no 6 de janeiro de 2021?
Na próxima semana, falarei um pouco sobre a nova ascensão do nacionalismo na Europa. E lembrar um pouco sobre os desastres que isso já provocou no Velho Continente.
* Jornalista e fotógrafo de rua