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DIA INTERNACIONAL DA MULHER – Violência mata uma mulher a cada hora e meia no Brasil

ALFREDO RISK

Nesta segunda-feira, dia 8 de março, comemora-se o Dia Inter­nacional da Mulher. A data, além de ser comemorada, é potencializada pelas reflexões e lutas das mulheres. Assim como em outros anos, apesar de avanços, pesquisas indicam que o caminho a ser percorrido, na bus­ca por respeito, direitos e igualdade, é longo. De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a cada noventa minutos, ou seja, uma hora e meia, uma mulher morre no Brasil por causas relacio­nadas à violência. Estudo feito pelo mesmo órgão, a partir de 2011, com base em dados retirados do Sistema de Informações de Agravados de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde, mostra que cerca de 527 mil pessoas são vítimas de violên­cia sexual por ano no país e apenas 10% desses casos chegam ao conhe­cimento da polícia. Os registros do Sinan demonstram que 89% das ví­timas são do sexo feminino e pos­suem, em geral, baixa escolaridade.

A psicóloga Renata Mafra, coor­denadora da Faculdade de Psicologia da Estácio, comenta a chamada “cul­tura do estupro” e afirma que educa­ção e as políticas públicas são a cha­ve para rechaçar o problema. “Já nos anos 1970 a cultura do estupro era tratada em movimentos feministas americanos; em uma segunda onda, veio para apontar comportamentos sutis e explícitos que silenciam ou relativizam a violência sexual con­tra a mulher. No Brasil, ganhou for­ça pelo novo movimento feminista, após um estupro coletivo ocorrido numa favela no Rio de Janeiro, em maio de 2016. Nesse fato, uma me­nina de 16 anos foi violentada por 33 homens; cuja ação coletiva foi filmada e fotografada, e repercutida na imprensa e nas redes sociais”, diz.

Apesar das lutas diárias, mulheres continuam sendo vítimas e mortas

Segundo a psicóloga, a cultura do estupro é um conjunto com­plexo de crenças que encorajam agressões sexuais masculinas e sustentam a violência contra a mu­lher. “A cultura do estupro tolera a violência física e emocional contra a mulher como normal. Em uma cul­tura do estupro, tanto homens como mulheres assumem que a violência sexual é um fato da vida, tão ine­vitável quanto a morte. E o termo cultura do estupro vem justamente para demonstrar que não é algo na­tural, e sim cultural. Se é cultural é porque foi criado e se criamos, po­demos modificá-lo”, descreve.

A psicóloga Renata Mafra explica que a cultura do estupro é um conjunto complexo de crenças que encorajam agressões sexuais masculinas e sustentam a violência contra a mulher

Renata Mafra observa que as mu­lheres se sentem desencorajadas a denunciar devido ao sentimento de culpa e de vergonha. “A cultura do estupro coloca na mulher a responsa­bilidade pelo ocorrido: ‘mas também, com essa roupa’; ‘aposto que você be­beu’; ‘mas também, andando por es­ses lugares sozinha, estava pedindo’; ‘você não pode contar isso, afinal, é seu padrasto, seu pai… ele pode ser preso’. As mulheres também têm a cultura do estupro internalizada e acabam reproduzindo dentro de si o eco da sociedade. Sem contar a forma como são tratadas pe­las autoridades ao denun­ciarem, quando não se trata de uma delegacia ou serviço especializa­do de atendimento à mulher”, reitera.

A coordenado­ra acrescenta que é preciso ter em men­te que o conceito de estupro é amplo no código penal brasi­leiro, sendo conside­rado o ato de constran­ger alguém mediante violência ou grave amea­ça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.

Mulheres são mais instruídas, mas ocupam apenas 37,4% dos cargos gerenciais

Embora mais instruídas que os homens, as mulheres ainda têm dificuldades de acessar cargos de chefia e gerência no mercado de trabalho. No Brasil, apenas 37,4% dos cargos gerenciais existentes em 2019 eram ocupados por mulheres, segundo os dados do levantamento Estatísticas de Gênero: indicadores so­ciais das mulheres no Brasil, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A desigualdade era ainda mais elevada entre os 20% dos trabalhadores com os maiores salários. Nessa faixa de renda, as mulheres eram apenas 22,3% dos ocupados, enquanto os homens respon­diam pelos demais 77,3%.

Segundo o IBGE, o dado revela que as mulheres estão ainda mais sub-repre­sentadas em cargos gerenciais mais bem remunerados e com potencialmen­te mais responsabilidades. Em 2019, as mulheres receberam 77,7% do rendi­mento dos homens.

“As mulheres são mais instruídas que os homens. Então a menor inserção no mercado de trabalho não se deve à instrução, porque é justamente o contrário”, disse Bruno Mandelli Perez, pesquisador do IBGE.

Entre a população com 25 anos ou mais de idade, 40,4% dos homens não tinham instrução ou não concluíram o ensino fundamental. Essa proporção foi menor entre as mulheres, 37,1%. Por outro lado, 19,4% da população feminina com 25 anos ou mais já tinha concluído o ensino superior, contra uma fatia de 15,1% entre os homens.

A única faixa etária em que havia mais homens com ensino superior do que mulheres é a mais avançada, de 65 anos ou mais, reflexo da dificuldade da inserção do acesso feminino a institui­ções de curso superior décadas atrás.

A taxa ajustada de frequência escolar líquida – que mostra a quantidade de pessoas que frequenta ou já concluiu o nível de ensino adequado à faixa etária – mostra que as crianças de ambos os sexos iniciam o ensino fundamental em proporção semelhante, 95,8% deles na idade correta para sua etapa escolar.

Desigualdade de gênero prevalece em âmbito profissional

No entanto, os rapazes vão acumulando atrasos ao longo da vida escolar. Nos anos finais do ensino fundamental, a taxa de frequência escolar líquida das mulheres era de 89,3%, enquanto a dos homens caía a 85,8%. No ensino médio, elas tinham taxa de 89,3%, contra um resultado deles de 66,7%. No ensino superior, 29,7% delas cumpriam essa etapa de instrução na idade adequada, contra 21,5% deles.

O resultado, porém, é bastante desigual quando considerada a cor ou raça do estudante. As mulheres pretas ou par­das entre 18 e 24 anos apresentavam uma taxa ajustada de frequência líquida ao ensino superior de 22,3%, quase metade dos 40,9% registrados entre as brancas, além de inferior também à taxa verificada entre os homens brancos, de 30,5%. A menor taxa ajustada de frequ­ência escolar líquida foi a dos homens pretos ou pardos: 15,7%.

Há também barreiras em determinadas áreas do conhecimento, especialmen­te no acesso às ciências exatas e de produção. As mulheres correspondiam a apenas 13,3% das matrículas nos cursos presenciais de graduação na área de Computação e Tecnologias da Informação e Comunicação e 21,6% na área de Engenharia e profissões correlatas. Por outro lado, na área de bem-estar, que inclui cursos ligados ao cuidado, como Serviço social, a parti­cipação feminina nas matrículas foi de 88,3% em 2019.

Embora mais escolarizadas, as mu­lheres ainda são minoria entre os professores de nível superior de ensino, apenas 46,8% deles.

Afazeres domésticos e falta de creches
A presença de crianças nos lares brasileiros reduz significativamente a participação da mulher no mercado de trabalho, segundo IBGE. A situação é um indicativo da necessidade de políti­cas públicas voltadas para a ampliação do número de vagas em creches no País.

“Existe uma relação entre uma menor participação das mulheres no mercado de trabalho e uma maior participação das mulheres no trabalho menos produ­tivo, os afazeres domésticos e cuidados de pessoas”, apontou André Geraldo de Moraes Simões, pesquisador do IBGE.

Entre as mulheres de 25 a 49 anos de idade com crianças com até 3 anos de idade vivendo na mesma casa, apenas 54,6% estavam ocupadas em 2019. Entre as que não viviam com crianças pequenas, 67,2% delas trabalhavam.

“Isso está relacionado a políticas públi­cas, políticas de expansão de creches, para que essas crianças possam ir para a creche”, defendeu Simões.

A situação é mais grave entre as mulhe­res negras: apenas 49,7% das mulheres pretas ou pardas com crianças de até três anos de idade em casa estavam trabalhando, enquanto que essa pro­porção subia a 62,6% entre as mulheres brancas. Se consideradas mulheres sem crianças pequenas em casa, 63,0% nas negras trabalhavam, enquanto essa fatia subia a 72,8% entre as brancas

A diferença entre as mulheres negras e brancas estaria ligada à renda e à falta de acesso a creches públicas. As mu­lheres com renda mais elevada tendem a terceirizar os afazeres domésticos e cuidados de parentes, contratando profissionais ou pagando creches privadas, enquanto que as negras são mais sobrecarregadas com esse tipo de trabalho doméstico na própria casa, explicou o pesquisador Simões.

Entre os homens de 25 a 49 anos com crianças até 3 anos de vida em casa, 89,2% trabalhavam fora de casa. Entre os que não viviam com crianças peque­nas, 83,4% trabalhavam.

Em 2019, as mulheres dedicaram 21,4 horas semanais aos cuidados de pessoas ou afazeres domésticos, quase o dobro de tempo que os homens, que despendiam apenas 11,0 horas se­manais com esse tipo de trabalho não remunerado.

As mulheres pretas ou pardas gastavam 22,0 horas semanais envolvidas com os cuidados de pessoas e os afazeres domésticos, ante 20,7 horas para mu­lheres brancas.

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