Depois de mais de dez anos sem passar o Natal com a família, a ex-moradora de rua, Telma Candido da Costa, passou um final de ano diferente, junto com o marido Juninho, a mãe Juraci de 70 anos, a irmã Zilani e os filhos Rian, de 18 anos e Ana Luisa de 16.
O encontro em Ribeirão Preto, segundo Telma, significou mais uma etapa na batalha diária que trava para recomeçar e reconstruir os laços familiares destruídos pelo longo período de dependência química da qual ela foi vítima. A família reside na cidade Mineira de Uberlândia e ficou uma semana na casa de Telma em um bairro da periferia Oeste da cidade.
Já a filha, Ana Luisa, há três meses deixou Uberlândia para morar com a mãe. Aqui, se prepara para matricular-se em uma escola pública e continuar os estudos. Ela está no quinto ano do Ensino Fundamental.
Para dona Juraci, que reencontrou a filha em 2018, passar as festas de final de ano com Telma foi um presente de Deus e marca o começo de uma nova fase para a família. Evangélica, diz que em todos estes anos nunca perdeu a esperança de reencontrar a filha.
“Ela sempre esteve em minhas orações. Sempre pedi para Deus cuidar dela onde estivesse”, conta. Ela garante que esta reunião familiar foi apenas a primeira de muitas outras. Os outros familiares também endossam a afirmação dela.
Como o Tribuna publicou em recente reportagem, Telma deixou a família em Uberlândia em 2006 após se tornar alcoólatra e viciada em drogas e, desde então, viveu grande parte deste tempo nas ruas de Ribeirão Preto. Aqui, apesar do vício, trabalhou por pequeno período em um hotel na região da baixada da cidade. Quando tinha oportunidade utilizava o quarto em que morava para usar drogas com amigos.
Quando foi demitida do estabelecimento, acabou indo para o antigo Centro de Triagem e Encaminhamento do Migrante de Ribeirão Preto (Cetrem). Como era uma pessoa que, apesar da situação de vulnerabilidade e dependência química, tinha um comportamento considerado gentil, Telma acabava realizando faxinas em vários locais.
Foi em uma dessas ocasiões que acabou sendo contratada para trabalhar e morar na casa de uma senhora que vivia sozinha. Ficou no emprego até o dia em que a patroa morreu.
Também foi no Cetrem que ela conheceu Juninho, seu atual companheiro, também ex-dependente químico. Entretanto, na época, depois de muitas brigas eles se separaram e Juninho acabou se internando em uma clínica de recuperação. Ao sair foi acolhido pela Organização Não Governamental (ONG) Projeto Mãos Dadas que trabalha na reinserção de dependentes químicos.
O projeto nasceu em 2014, fundado por Ricardo Rogério Tostes, um ex-dependente químico. Ficou conhecido por dar suporte aos acolhidos que terminavam o tratamento e que não tinham para onde ir e tentar recomeçar a vida.
O reencontro de Juninho e Telma só aconteceria em 2016, quando ele já recuperado decidiu procurá-la pela cidade. No primeiro contato ela preferiu continuar nas ruas. Mas em janeiro de 2017, após ter o que classifica como surto de consciência e, segundo ela, fazer um reexame de sua vida, decidiu procurar ajuda.
Virando livro
A história de Telma e de outras mulheres alcoólatras virou tema de um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de jornalismo na Faculdade Cásper Líbero, em São Paulo. Elaborada e escrita pelas formandas Bárbara Gil Marques e Vanessa Nagayoshi, a obra “A Ressaca – Histórias de mulheres alcoólatras”, narra a história delas e as especificidades física, biológica e psicológica das mulheres que acabam no alcoolismo e nas drogas. Ainda não existe data prevista para o lançamento da obra.