Perci Guzzo *
[email protected]
O Brasil sediou na semana passada a Conferência Internacional “Espaços Naturalizados para as Infâncias”. Pela primeira vez na América Latina, o evento foi organizado em conjunto pelo SESC, Instituto Alana e Aliança Internacional de Espaços Escolares.Mais de seiscentos profissionais de diferentes formações e atuações estiveram em São Paulo para conversar sobre criança, educação e natureza.
As áreas livres, os pátios e o entorno das escolas, bem como toda a cidade, podem e devem se transformar em territórios educadores para bebês, crianças e adolescentes.
“Precisamos devolver a criança à terra”, chamou-nos a atenção a professora Lea Tiriba da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).“Quando a criança vivencia e experimenta a natureza, são gerados sentimentos de confiança e de esperança; o oposto de preocupação”, refletiu o professor Gersem Baniwa da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). “A natureza é por excelência o espaço do brincar”, ponderou Emma Cortês, coordenadora do Programa “Cidade Brincante” de Barcelona, Espanha.
Ribeirão Preto apresentou a concepção e os primeiros resultados do Programa “Verdejamento das Escolas”, uma parceria da Secretaria Municipal da Educação com o Instituto Ribeirão – 3ºC (menos três graus). Cada uma das 110 escolas municipais recebeu um recurso inicial para transformar sua área livre, seu pátio ou seu entorno imediato com mais natureza. Quase todas as escolas já desenvolveram seus projetos paisagísticos incluindo a remoção de pisos cimentados, a implantação de hortas e composteiras, o plantio de mudas de espécies arbóreas ou mesmo a instalação de telhados adaptados à captação de água de chuva. Agora vem a fase de implantação.
O Programa “Criança e Natureza” do Instituto Alana, propõe o conceito de “Escolas Baseadas na Natureza”, aliando a ideia de centralidade dos espaços escolares para ações de adaptação e resiliência climática com mudanças nas práticas pedagógicas do brincar e do aprender.
Alguns temas centrais evocados durante a Conferência que merecem nossa atenção como educadores e gestores públicos foram o adulto centrismo, a injustiça climática e ambiental e a cidade como território educativo.
Quando a regra possível é definida somente pelos adultos, criam-se ambientes de suspeição que são vigiados permanentemente. O adulto centrismo também investe numa imobilidade do corpo e num isolamento ecológico. O foco do ensino são os processos mentais e a natureza torna-se perigosa. É com essa visão e dessa maneira que emparedamos as crianças e as escolas.
Nos eventos meteorológicos extremos, como ondas de calor, ou em uma condição permanente de poluição do ar, por exemplo, as pessoas que mais sentem e sofrem a hostilidade do clima e do ambiente são as pobres e miseráveis. Isso é injustiça climática. O desafio é adequar os espaços escolares utilizados pela população mais vulnerável para reduzir o desconforto e o risco perante a deterioração do meio ambiente.
Por fim a necessidade premente de mudança no padrão de urbanização. A cidade atual nos cerceia, nos impele a viver como se fôssemos mercadorias e serviços e ainda é palco de reformas equivocadas. Para enfrentarmos as tantas crises que nos atravessam, tais como a da saúde mental e do clima, devemos buscar soluções baseadas nos atributos e processos da naturais. “Precisamos nos conectar com o território a partir de uma pedagogia da terra” – Gersem Baniwa.
Se queremos que bebês, crianças e adolescentes sejam mais felizes; a eles/as deve ser oportunizada a possibilidade de se sintonizarem com os ritmos da natureza. Há muito por fazer neste sentido.
* Ecólogo e Mestre em Geociências. Autor do livro “Na nervura da folha”, lançado em 2023 pelo selo Corixo Edições