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Deixe-me outro dia, porém hoje não

Os admiradores da boa música já estão saudosos do talentosíssimo Agnaldo Timóteo, mais uma vítima da Covid-19. Em 1968 ele gravou Deixe-Me Outro Dia, Menos Hoje, composição de Erasmo Carlos e Roberto Carlos, que começa com um apelo: “Se você está pensando em deixar­-me, por favor, eu quero lhe pedir deixe-me outro dia sim, porém hoje não”. É uma canção de amor que fala da tentati­va de evitar uma partida, que pode ser definitiva.

Nos últimos doze meses o que mais observamos no mundo e, especialmente no nosso país, foram pessoas tentando salvar seus entes queridos e, lamentavelmente, muitos não conse­guiram a oportunidade de manifestar amor, carinho e dar o último abraço. Quando os números ganham rostos e nomes, observamos que, além dos 345.287 óbitos, existem milhares de familiaresde pacientes suplicando nas portas dos hospitais: “deixe-me outro dia sim, porém hoje não”.

No esporte, em 2002 Cleber Machado entrou para a his­tória ao narrar o Grande Prêmio da Áustria de Fórmula 1. Todos sabiam da estratégia da Ferrari em privilegiar Micha­el Schumacher, exigindo que Rubinho Barrichello, mesmo estando melhor, deixasse o alemão ultrapassá-lo. Naquele dia parecia ser diferente e, na última volta, o narrador empolgado com a iminente vitória do brasileiro dizia: “Hoje não, hoje não, mas derrepente soltou um decepcionante: “Hoje sim, hoje sim?”.

Com a troca ocorrida no Ministério da Saúde, acredita­va-se que a pasta iria incrementar a vacinação da população, valorizar as medidas de isolamento social e dotar todos os municípios com estrutura, profissionais e medicamentos. Na prática isso, ainda, não ocorreu e a guerra de braço entre o presidente da república e os governadores continua. A cada dia pensamos que ele não soltará um impropério, mas no final… Hoje sim!

Na semana da Páscoa o judiciário foi movimentado com uma ação para garantir a abertura dos templos e a realização de cultos. Em nome de Deus e das ideologias políticas sur­giram teorias e justificativas de todos os tipos e a preser­vação da vida ficou em segundo plano.Um ponto positivo foi que polêmica serviu para resgatar uma manifestação didática de Martin Lutero – pai da reforma protestante – que durante a peste bubônica que assolou a Europa no século XVI matando milhões de pessoas, defendeu que fé e ciência caminham juntas. “Então farei vapor, ajudarei a purificar o ar, a administrar remédios e a tomá-los. Evita­rei lugares e pessoas onde minha presença não é necessária para não ficar contaminado e, assim, porventura infligir e poluir outros e, portanto, causar a morte como resultado da minha negligência”. Pena que atualmente a religiosidade esteja tão distorcida.

Para terminar, hoje tem uma boa notícia sim. Em comemoração ao Dia Mundial da Saúde, a Casa do Poeta e do Escritor de Ribeirão Preto lançou um lindo projeto, onde escritores locais escreveram textos poéticos que foram transformados em vídeos e serão postados sema­nalmente, prestando justa homenagem aos profissionais da saúde e da educação. Em meio a tanta dor e desalento, doses homeopáticas de amor e gratidão certamente com­põem uma ótima receita.

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