A vida me conduz por caminhos inimagináveis. Às vezes paro pra pensar e quase não acredito. Devo tudo à música, não sou cantor, apenas gosto de cantar. Violão? Sou um modesto tocador de violão, tenho muita dificuldade para harmonizar canções. Costumo dizer que não tenho ouvido e peço socorro musical ao querido amigo Maurício Bailoni, que toca muito bem vários instrumentos.
Seleciono músicas que gosto e que batem com minha voz grave. Cantando, monto meu repertório a minha maneira. Certa noite, no Ponto Chic, eu acabava de cantar uma seleção de sambas antigos quando uma família que ali jantava apresentou-me um empresário de Atibaia. Disse que faria aniversário no mês seguinte e que queria me contratar para animar sua festa. Pediu que eu cantasse tudo que ele tinha ouvido até então de meu repertório, pois havia gostado demais.
Montei um time de músicos de respeito, pois a grana me dava cobertura para tal. Levei até trombone, sax e piston, organizei tudo em um clube de Atibaia, uma verdadeira gafieira carioca, e comecei a soltar o gogó com sambas imortais. Quando terminei a primeira seleção, o aniversariante, na maior felicidade, veio até o palco e disse que um convidado ilustre adorou meu repertório e queria me conhecer.
Disse: “Vamos lá”. Ele me conduziu até sua mesa, e no caminho eu só pensando quem seria o tal convidado ilustre. Já na mesa quase caí das pernas: o convidado era o veterano cantor Silvio Caldas, que me recebeu com enorme sorriso no rosto, abraçou-me muito forte e disse que meu repertório era o que de melhor existia na música popular brasileira. Conversamos um pouco e ele contou que estava morando em Atibaia para tratar seu enfisema pulmonar. “Muito cigarro”, disse.
Depois, batendo carinhosamente a mão em meu peito, emendou: “Menino, se você quiser ter voz boa pro resto da vida, quando entrar no banheiro leve sempre uma camiseta e vista antes de sair de lá, o golpe de vento tem tirado a voz de muitos cantores”. Até hoje sigo este conselho do compositor e cantor de “Chão de Estrelas”, parceria com Orestes Barbosa.
A vida me levou também a ser amigo, sem que fosse preciso um encontro tête-à-tête, do Dr. Nereu Costa, médico pediatra em Jaboticabal. O cara é “o médico”. Vejo suas postagem no Facebook aconselhando mães como cuidarem de seus rebentos. Tiro meu chapéu pra ele. Semanalmente, pelo “zap”, envio minhas crônicas aqui do nosso Jornal Tribuna a ele, e segue o jogo.
Já me contou vários causos. Na semana passada, ao ler o que escrevi sobre o Datena, ele lembrou de quando, no comecinho de carreira na EPTV, Datenão foi fazer uma matéria na cidade de Caconde. A Usina Graminha esvaziava sua enorme represa para a construção de uma maior e mais segura, e até onde se enxergava a água ficou aquela lama seca, tipo da que se vê na seca nordestina.
O pai do Dr. Nereu, Sr. Nereu Coutinho da Costa, mineiro de Bueno Brandão, contador de causos e pescador – e todo pescador tem a fama de ser mentiroso –, tinha um rancho num dos braços da represa. O bom mineiro tinha como vizinho Zé Bento, que criava algumas vacas. Naquele dia elas estavam deitadas a uns 100 metros, tomando sol sobre a lama seca antes de se chegar na água.
Datena, vendo aquela cena, foi logo entrevistando o Seu Nereu, que fez cara de coitado e foi logo contando que, devido à seca, seu gado morreu antes de chegar na água. Datena, chocado, foi com o cinegrafista atolando na lama até as vacas, levou um tempão e ao se aproximar levou o maior susto pois as vacas levantaram, berraram e seguiram rumo à água.
Datenão, muito nervoso, voltou ao Seu Nereu e o enquadrou: “Mas o senhor não disse que suas vacas haviam morrido de sede?” E Seu Nereu, sem perder o tom e sorrindo muito, respondeu: “E você acreditou, menino? Você não sabe que todo pescador é mentiroso?” Ânimos acalmados, o Seu Nereu convidou Datena e a equipe para uma suculenta galinhada em seu rancho à beira da represa de Caconde, e o causo virou uma bela piada. Acunticido.
Sexta conto mais.