O juiz Lúcio Alberto Eneas da Silva Ferreira, da 4ª Vara Criminal de Ribeirão Preto, condenou a ex-prefeita Dárcy Vera (sem partido) a 18 anos, nove meses e dez dias de prisão em regime fechado por supostos crimes denunciados pelo Grupo de Atuação Especial e de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) no âmbito da Operação Sevandija. A sentença tem 271 páginas onde o magistrado expõe as provas e os motivos da condenação. O Ministério Público Estadual (MPE) vai recorrer.
Ele também determinou que a ex-prefeita fique presa até o julgamento em segunda instância, no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), já que a defesa vai recorrer da sentença emitida no final da manhã desta quarta-feira, 5 de setembro, dois anos depois de a força-tarefa formada pelo Ministério Público e Polícia federal ter sido deflagrada – em 1º de setembro de 2016.
A ex-prefeita também não poderá concorrer a cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, pelo prazo de cinco anos. Silva Ferreira também determinou o bloqueio e o futuro leilão de bens de todos os réus nesta ação penal dos honorários advocatícios, um processo de reposição de perdas inflacionárias da década de 1990 (Plano Collor, ação dos 28.35%) que envolve mais de quatro mil servidores públicos e herdeiros.
O grupo supostamente chefiado pela ex-prefeita teria desviado R$ 45 milhões ilegalmente, inclusive com a fraude de uma ata de assembleia da categoria – o valor que seria destinado ao esquema seria de R$ 69,9 milhões, segundo os promotores. O esquema ainda teria gerado um prejuízo de R$ 120 milhões aos servidores, que foram privados de receber os 6% de juros de mora referentes ao acordo inicial. Dárcy Vera responde por corrupção passiva, organização criminosa e peculato, crime em que o agente público se beneficia do cargo que exerce.
Outros cinco réus também foram condenados, entre eles o presidente destituído do Sindicato dos Servidores Municipais de Ribeirão Preto (SSM/RP), Wagner Rodrigues, que fechou acordo de delação premiada com o Gaeco e vai cumprir onze anos em prisão domiciliar, além de pagar 50 dias-multa.
O ex-sindicalista disse em depoimento que Dárcy Vera recebeu propina de R$ 7 milhões da ex-advogada do SSM/ RP, Maria Zuely Alves Librandi, para acelerar o pagamento dos honorários. Além dos três, também são réus nesta ação o ex-secretário da Administração, Marco Antonio dos Santos, e os também advogados Sandro Rovani e André Soares Hentz – ele e Rodrigues são os únicos que estão em liberdade.
Hentz vai aguardar o julgamento no Tribunal de Justiça em liberdade – o Gaeco vai pedir a prisão dele. Todos respondem por corrupção ativa ou passiva, organização criminosa, lavagem de dinheiro e, no caso de Santos, por peculato. Hentz, Maria Zuely e Rovani foram condenados a 14 anos e oito meses de reclusão, além de 66 dias-multa cada. Marco Antônio dos Santos pegou a mesma pena de Dárcy Vera, de 18 anos, nove meses e dez dias de prisão em regime fechado, além de 88 dias-multa.
O magistrado determinou ainda que imóveis de Dárcy Vera, como a casa no bairro da Ribeirânia, na Zona Sul, e um apartamento na avenida do Café, na Zona Oeste, sejam levados a leilão judicial. Caso a sentença seja confirmada nas instâncias superiores, o dinheiro arrecadado será revertido aos cofres municipais. Ferreira explica na decisão que todos os réus agiram no mesmo nível de culpabilidade e “cada um desempenhou função importante e essencial para o sucesso da empreitada criminosa”. O juiz diz ainda que o bloqueio de bens será suficiente para recuperar apenas 45% do total desviado.
Em sua decisão, Silva Ferreira diz que “Dárcy Vera, obviamente era a ordenadora das despesas da prefeitura municipal, portando, qualquer acordo, que se pretendesse ou cogitasse a saída de dinheiro dos cofres públicos precisava contar com a concordância da corré Dárcy Vera, pois legalmente falando, ela era a única pessoa autorizada, por lei, a emitir ordem de saída de dinheiro dos cofres públicos”, afirma.
Afora Rodrigues, todos os réus desta ação penal da Operação Sevandija negam as acusações feitas pelos promotores do Gaeco e pelos agentes da Polícia Federal. Eles dizem que vão provar inocência. Maria Zuely está presa desde dezembro de 2016. Santos e Rovani foram presos em março do ano passado, e Dárcy Vera está em Tremembé desde 19 de maio de 2017.
Dárcy Vera foi presa pela primeira vez em dezembro de 2016 na segunda fase da Operação Sevandija, batizada de Mamãe Noel, que identificou fraudes em licitações até então avaliadas em R$ 203 milhões na prefeitura de Ribeirão Preto, além de pagamento indevido de honorários advocatícios e esquema de corrupção envolvendo nove ex-vereadores.
Nove dias após ser presa, a ex-prefeita obteve a liberdade provisória em caráter liminar, concedida pelo ministro do STJ Sebastião Reis Júnior. Em maio de 2017, o ministro Rogério Schietti Cruz, da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, relator dos processos da Operação Sevandija em Brasília, cassou a liminar que a mantinha em liberdade.
Segundo os promotores do Gaeco, o valor total desviado dos cofres públicos apurado nas três frentes de investigação da Operação Sevandija – Companhia de Desenvolvimento Econômico (Coderp), honorários e a do Departamento de Água e Esgotos de Ribeirão Preto (Daerp) – passou de R$ 203 milhões para R$ 245 milhões. A sentença desta quarta-feira é a primeira a ser emitida. Os réus vão recorrer da decisão ao TJSP.
Em 2 de julho, a defesa entregou ao juiz Lúcio Alberto Enéas da Silva Ferreira um calhamaço com 129 páginas com a defesa da ex-chefe do Executivo ribeirão-pretano. A defesa diz que o Gaeco rastreou contas e propriedades e não encontrou o suposto dinheiro ilícito que ela teria recebido. Alega, ainda, que Dárcy Vera era prefeita na época em que a operação foi deflagrada, por isso teria foro privilegiado e a delação de Rodrigues deveria ter sido homologada pelo TJSP depois de analisada pela Procuradoria-Geral de Justiça.
Em 4 de abril deste ano, os promotores entregaram o relatório final da investigação que envolve a suposta fraude no pagamento de honorários advocatícios. São 193 páginas. O Ministério Público Estadual pedia pena máxima para Dárcy Vera. Em sua delação, Rodrigues disse que além dos R$ 7 milhões supostamente pagos à ex-prefeita, Maria Zuely teria repassado R$ 11 milhões ao sindicato (por meio de Rovani, que dividiria o montante com o delator), mais R$ 11 milhões iriam para Hentz e R$ 2 milhões para Santos. O ex-sindicalista admite ter recebido R$ 1,2 milhão. Os demais negam.
Defesas
A advogada Maria Cláudia Sexias, que representa a ex-prefeita, disse que está viajando ao exterior, respeita a posição do juiz, mas não concorda com a pena aplicada e vai recorrer. O advogado Júlio Mossin, que defende Sandro Rovani, afirmou que a sentença é bastante extensa e ainda está lendo todo o conteúdo, mas vai recorrer da pena aplicada ao cliente. O advogado de Wagner Rodrigues, Daniel Rondi, disse que estuda a sentença para decidir se recorrerá, ou não, da pena.
Recentemente, o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu liberdade a Marco Antonio dos Santos e Sandro Rovani ação penal da Coderp, mas como eles têm outros mandados de prisão expedidos, continuarão presos. O promotor Leonardo Romanelli, do Gaeco, diz que o grupo entende que a decisão é satisfatória, mas poderia ser melhor, por isso vai entrar com recurso para elevar as penas dos condenados, principalmente a de Dárcy Vera.
Suposta fraude dos honorários
De acordo com o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), o termo de aditamento da ação dos 28,35% (Olano Collor) previa redução dos juros de mora de 6% para 3%, e esse valor seria destinado à Maria Zuely, cerca de R$ 58 milhões. Entretanto, o então secretário de Administração, Marco Antonio dos Santos, se utilizou de um jogo de planilhas e elevou o valor para R$ 69,9 milhões. Para os promotores, todos os documentos apresentados induziram a Justiça a erro e o pagamento dos honorários milionários foi autorizado.
Com isso, a suposta quadrilha manteve os desvios planejados por anos a fio, inclusive porque o desvio do dinheiro público foi executado em parcelas mensais e o plano criminoso exigiu cumplicidade e organização de janeiro de 2009 a agosto de 2016. A partir da delação premiada de Wagner Rodrigues, a força-tarefa da Operação Sevandija apreendeu provas de que Maria Zuely Alves Librandi e André Soares Hentz procuraram os outros envolvidos e passaram a prometer vantagens para que pudessem receber o dinheiro.
Na sentença publicada nesta quarta-feira (5), o juiz Lúcio Alberto Eneas da Silva Ferreira, da 4ª Vara Criminal de Ribeirão Preto, define a atitude como “Plano B” de Maria Zuely, em busca dos honorários que, na realidade, não lhe eram devidos. Entre janeiro de 2013 e agosto de 2016, a ex-advogada do Sindicato chegou a receber R$ 38,4 milhões.
Em reuniões na prefeitura de Ribeirão Preto e no escritório do advogado André Hentz, Sandro Rovani, Wagner Rodrigues e Marco Antônio dos Santos definiram como seria feito o “termo de aditamento de acordo” para incluir o pagamento dos honorários a Maria Zuely. Ainda de acordo com o delator, o documento foi assinado por Dárcy Vera no gabinete na prefeitura. A ex-chefe do Executivo tinha pleno conhecimento da manobra feita para garantir os pagamentos para que o grupo fosse privilegiado.
“Dárcy Vera, obviamente era a ordenadora das despesas da Prefeitura Municipal, portanto, qualquer acordo, que se pretendesse ou cogitasse a saída de dinheiro dos cofres públicos precisava contar com a concordância da corré Dárcy Vera, pois legalmente falando, ela era a única pessoa autorizada, por lei, a emitir ordem de saída de dinheiro dos cofres públicos (…)”, diz o magistrado.
Rodrigues informou que a ata de uma assembleia realizada no dia 20 de março de 2012 foi adulterada por ele e pelo então advogado do sindicato, Rovani. Isso porque, em votação anterior, os servidores já haviam decidido que não pagariam honorários advocatícios. O MPE entende que por ser funcionária do sindicato Zuely não teria direito ao pagamento, já que recebia salário.
O juiz lembra ainda que Dárcy Vera recebeu R$ 120 mil de Maria Zuely sem oferecer nenhuma garantia para pagar o suposto empréstimo. As duas rebatem a tese e dizem que foi uma ação baseada na confiança. O magistrado também ressalta que a advogada deveria ter em seu patrimônio mais R$ 17 milhões, mas que esse dinheiro deve ter sido diluído em “propina”.
As penas dos seis réus da Sevandija Suposta fraude dos honorários
Dárcy Vera
Pena: 18 anos, nove meses e dez dias de prisão
Marco Antonio dos Santos:
Pena: 18 anos, nove meses, dez dias de prisão e 88 dias-multa
Mariz Zuely Alves Librandi
Pena: 14 anos e oito meses de reclusão, além de 66 dias-multa
Sandro Rovani
Pena: 14 anos e oito meses de reclusão, além de 66 dias-multa
André Soares Hentz
Pena: 14 anos e oito meses de reclusão, além de 66 dias-multa
Wagner Rodrigues:
Pena: onze anos em prisão domiciliar e 50 dias-multa
Ex-prefeita quer prisão domiciliar
A ex-prefeita Dárcy Vera (sem partido), condenada nesta quarta-feira, 5 de setembro, a 18 anos, nove meses de dez dias de prisão por corrupção passiva, organização criminosa e peculato – crime em que o agente público se beneficia do cargo que exerce – na ação penal dos honorários advocatícios, uma das três frentes da Operação Sevandija, deve passar por perícia médica em breve.
A defesa, representada pela advogada Maria Cláudia Seixas, pede que a prisão preventiva de sua cliente seja transformada em domiciliar. Alega que o quadro clínico da ex-prefeita, que tem problemas renais e já foi internada duas vezes, um em estado grave no ano de 2013, quando participava de um evento em Brasília, tem apresentado piora e que há risco de morte. Em prisão domiciliar, Dárcy Vera poderia ser melhor assistida pelo plano de saúde.
O juiz Lúcio Alberto Eneas da Silva Ferreira, da 4ª Vara Criminal de Ribeirão Preto, responsável pelas ações penais da Operação Sevandija, determinou na última segunda-feira (3) que a ex-prefeita seja submetida, com urgência, à avaliação de um médico da Secretaria de Estado da Administração Penitenciária de São Paulo (SAP).
O laudo vai apontar a gravidade de uma infecção urinária que, segundo a defesa, é persistente aos tratamentos ministrados na Penitenciária Feminina Santa Maria Eufrásia Pelletier, em Tremembé, no Vale do Paraíba, onde ela está presa desde 19 de maio do ano passado.
A Justiça autorizou a transferência de Maria Zuely Alves Librandi para unidade prisional da região para tratar da saúde. A suspeita é de que a ex-advogada do Sindicato dos Servidores Municipais esteja com câncer de mama. Ela passará por exames.