A juíza Roberta Steindorff Malheiros Melluso, da 1ª Vara da Fazenda Pública, concedeu liminar (tutela antecipada) em ação civil movida pela Promotoria de Defesa do Consumidor e pelo Núcleo Rio Pardo do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente (Gaema), e determinou que o Departamento de Água e Esgotos de Ribeirão Preto (Daerp) regularize o abastecimento de água em toda cidade em 48 horas, de forma permanente, sem interrupções, aos consumidores residenciais e não residenciais. A decisão abrange o distrito de Bonfim Paulista. Em caso de desobediência, a multa diária será de R$ 10 mil.
A magistrada ainda exige que, em caso de falta d’água, a autarquia abasteça os locais atingidos com caminhões-pipa, em um prazo máximo de quatro horas, sem ônus aos usuários. A ação data de 2014 e foi impetrada pelos promotores Carlos Cezar Barbosa, hoje vice-prefeito da cidade, e Cláudia Habib e Ramon Lopes Neto, do Gaema. A ação foi motivada por causa das constantes denúncias de desabastecimento em diferentes bairros de Ribeirão Preto.
A juíza concedeu a liminar depois de o Ministério Público Estadual (MPE) comprovar que a falta d’água na cidade não está associada à estiagem ou à escassez de recursos hídricos no Aquífero Guarani, de onde o Daerp retirar o produto por intermédio de 114 poços artesianos. Segundo os laudos apresentados pelo Gaema, o problema do abastecimento em Ribeirão Preto é de infraestrutura falha e má gestão operacional – o desperdício é notório e a autarquia não consegue conter os vazamentos.
Além da multa diária de R$ 10 mil, em caso de desobediência a ordem judicial prevê a proibição de instalação de novos pontos de ligação de água em qualquer novo empreendimento imobiliário na cidade e no distrito de Bonfim Paulista, de qualquer natureza e sob qualquer denominação, sejam loteamentos urbanos ou rurais, abertos ou fechados, residenciais, comerciais ou industriais, enquanto não for regularizada a oferta de abastecimento de água no município, com qualidade comprovada por meio de estudos técnicos por prazo não inferior a um ano. Esses estudos devem demonstrar capacidade de fornecimento de água frente à demanda da população. O valor da multa será revertido ao Fundo Estadual dos Interesses Difusos Lesados.
Questionado pelo Tribuna, o Daerp informou apenas “que a liminar se refere a uma ação civil pública proposta em 2014” e que a autarquia “ainda não foi notificada da decisão da Justiça”. O Daerp iniciou um trabalho de modificação do sistema de abastecimento na cidade para garantir a segurança hídrica e a solução de todos os problemas que se arrastam há décadas em alguns bairros do município. A previsão é que nos próximos três anos sejam investidos cerca de R$ 150 milhões para corrigir a rede.
A própria autarquia já informou que alguns bairros de Ribeirão Preto estão sofrendo com a falta de água. Foram detectados problemas de abastecimento em cinco dos 38 setores da cidade – a média diária supera 30 ocorrências. Além de problemas técnicos e estruturais, a estiagem e o calor intenso dos últimos quatro meses elevaram o consumo e sobrecarregaram o sistema.
A média de consumo per capta recomendada pela Organização das Nações Unidas (ONU) é de 110 litros de água por dia por pessoa. A média nacional é de 167 litros, enquanto que em Ribeirão Preto está em 366 litros diários de água por habitante – o número já desconta as perdas físicas do sistema. A média municipal é 232,7% superior à mundial e está 119,1% acima da brasileira.
Em 2016, as perdas reais do sistema foram de 42,10% da produção. Nos oito primeiros meses deste ano, o desperdício esté em cerca de 39,38%. O Daerp já foi cobrado pelo Gaema para reduzir as perdas para 20%, mas a meta apresentada ao Ministério Público Estadual (MPE) é de redução para 32% até 2021.
Segundo o diretor técnico do Daerp, o engenheiro Waldo Villani Júnior, nos últimos 30 anos a maior parte do sistema de distribuição de água em Ribeirão Preto foi invertido. Ao invés do poço jogar a água para os reservatórios e depois ela ser distribuída deles para a rede por gravidade, os poços na cidade fazem o abastecimento em marcha, injetando a água diretamente na rede e depois, se houver sobras, ela abastece os reservatórios.