Na manhã do dia 23 de outubro, a jovem Giovanna Bezerra da Silva, de 17 anos morreu e outras duas ficaram feridas em um ataque a tiros na Escola Estadual Sapopemba, na Zona Leste de São Paulo. O autor dos disparos, um aluno de 16 anos do 1º ano do Ensino Médio, apreendido pela polícia, justificou o crime ao bullying que sofria por parte de outros estudantes. No dia 24 de abril desse ano, ele já havia registrado uma ocorrência, alegando ter sido vítima de agressões e ameaças.
O episódio reacendeu a discussão sobre como as escolas têm tratado o bullying e que ações têm sido efetivadas para coibi-lo. O bullying compreende todas as atitudes agressivas, intencionais e repetidas, que ocorrem sem motivação evidente, adotadas por um ou mais estudantes contra outros, causando dor e angústia, sendo executadas dentro de uma relação desigual de poder.
No Brasil, cerca de um em cada dez estudantes afirma sofrer bullying regularmente, um problema sério que compromete o bem-estar e o desempenho acadêmico dos jovens, segundo dados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA). O levantamento é realizado pela Organização Intergovernamental para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Já de acordo com os dados do 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 38% das escolas brasileiras dizem enfrentar problemas com bullying.
Para a advogada Ana Paula Siqueira especialista em bullying e bullying digital, a ausência de ações efetivas de combate ao bullying pode ter causado a tragédia em Sapopemba. “O jovem autor dos tiros relatou o problema, porém, a situação continuou evoluindo até o desfecho fatal, hoje pela manhã. É o 11º caso no Brasil somente em 2023. Na grande maioria, os agressores alegaram vingança contra casos de bullying ocorridos anteriormente”, explica Ana Paula.
Para a especialista, o bullying tem efeito psicológico tão devastador sobre a vítima, que resulta, muitas vezes, em suicídio ou vingança. “E nesse sentimento de vingança, a vítima de bullying se torna algoz, cometendo esse tipo de ataque. “O bullying está ceifando a vida de nossos jovens, e escolas que permanecem inertes, sem programas eficazes de combate nos termos da Lei, são cúmplices dessas tragédias amplamente divulgadas.”
Ana Paula aponta a necessidade urgente de que as escolas implementem as medidas previstas na Lei federal 13.185/2015, a popular Lei do Bullying. Para ela, é vital que as escolas tenham um programa de combate a este tipo de crime e programas de cultura de paz devidamente registrados e aprovados pelas autoridades competentes.
As ações, conforme estabelecido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) não são apenas uma recomendação, mas um mandato legal. Os pais e responsáveis devem ser proativos, cobrando das instituições a apresentação desses documentos, garantindo assim que estão em conformidade com a legislação vigente e priorizando o bem-estar dos alunos.
“A criminalização do bullying que está tramitando no Senado também é fundamental para que os casos sejam registrados adequadamente e a sociedade passe a ter estatísticas para poder combater o problema de maneira eficaz”, diz.
Ana Paula ressalta, ainda, que as escolas precisam estar cada vez mais preparadas para lidar com o bullying, seus agressores e suas vítimas. “Uma instituição que não tem o preparo necessário coloca em risco todos que fazem parte da comunidade escolar, especialmente seus alunos e deverá ser responsabilidade civil e criminalmente por suas ações e omissões”, completa Ana Paula Siqueira.
Ribeirão Preto aderiu ao projeto Justiça Restaurativa
A Prefeitura de Ribeirão Preto, por meio do da Secretaria Municipal da Educação, aderiu ao projeto Justiça Restaurativa, que visa a realização de círculos de construção de paz nas escolas da rede. O projeto, denominado “Re-Start: Práticas Restaurativas nas escolas” é realizado pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP) e pelo Núcleo Interinstitucional da Justiça Restaurativa.
O projeto tem como principal objetivo criar um sistema educativo com envolvimento comunitário, pela via restaurativa, ampliando o significado de justiça como sistema de valores, com a colaboração da Universidade, do Judiciário, Ministério Público e da Secretaria Municipal da Educação. A meta é transformar espaços que vivenciam situações de conflitos e violência, em espaços de diálogo e de resolução pacífica de conflitos, disseminando a Cultura de Paz.
“As práticas restaurativas funcionam como ferramentas para que o coletivo formado por estudantes, professores, corpo de apoio e manutenção das escolas possam se relacionar melhor, de maneira horizontal, criando um ambiente seguro e saudável, onde todos poderão aprender mais. Não se trata de tirar a responsabilidade, mas sim de reforçar os papéis sociais, individuais e coletivos, e de criar uma rede de apoio mútua quando observamos a necessidade de alguém de nossa rede”, explica Rafael dos Anjos, Chefe da Divisão do Centro de Referência em Educação para as Relações Étnico-Raciais da Secretaria da Educação.
A Justiça Restaurativa constitui-se em um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos, técnicas e atividades próprias. Por meio dela os conflitos que geram dano, concreto ou abstrato, são solucionados de modo estruturado, com a participação do ofensor, da vítima, bem como, das suas famílias e dos envolvidos, representantes da comunidade e um ou mais facilitadores restaurativos.
As escolas municipais também realizam palestras sobre o tema, e cada docente trabalha o assunto com os seus alunos. A Rede Municipal de Educação tem 139 unidades escolares com cerca de 50 mil alunos. São 31 escolas de ensino fundamental (Emef) com 23.296 estudantes 36 Centros de Educação Infantil (CEIs) e 43 Escolas Municipais de Educação Infantil (Emeis), além de 29 parceiras ou conveniadas, com 22.848 crianças.