Estudos recentes, realizados em diferentes países, têm examinado indicadores de saúde mental entre profissionais de saúde tratando pacientes com Covid-19. Neles, os pesquisadores entendem que uma melhor compreensão dos fatores modificáveis associados com a ansiedade relacionada ao surto da COVID-19, especialmente entre os médicos, tem se tornado um assunto de urgência. Na China, variados estudos têm encontrado alta prevalência de depressão (50,4%), ansiedade (44,6%), estresse (71,5%) e insônia (34%) entre diferentes profissionais de saúde atuantes na linha de frente.
Considerando o impacto dessas reações psicológicas no cotidiano hospitalar dos profissionais de saúde, particularmente dos médicos, Mosheva et al (2020, Anxiety and Depression Association of America) publicaram um estudo cujo propósito principal foi estudar os efeitos da ansiedade entre os médicos durante a pandemia da Covid-19, bem como, examinar o efeito da ansiedade sobre a resiliência dos mesmos. Definindo resiliência como o ato de enfrentamento, adaptação e manejamento da adversidade, buscaram verificar, também, se a mesma era um fator protetivo para saúde mental dos médicos. Para isso, foi aplicado um questionário, composto por oito itens que capturavam indicadores variados associados a ansiedade. Cada item sendo categorizado em cinco escores de respostas, variando de 1- nunca a 5-sempre. Outro questionário, por sua vez, avaliou o estresse, usando um inventário com 4 categorias de respostas, variando de 0-nunca a 3-sempre. Finalmente, a resiliência foi avaliada por uma escala de 10 itens, os quais foram pontuados de 0-não totalmente verdade a 4-totalmente verdade. Todos os questionários foram aplicados via plataforma online.
Um total de 1106 médicos israelenses, composto por 564 homens e 542 mulheres, completaram essas três escalas de mensuração, bem como, informaram suas características sócio-demográficas, incluindo idade, sexo, com ou sem crianças em casa, trabalhando ou não em hospitais, especialidade médica, nível de exposição à pacientes com Covid-19, carga de trabalho e se estava, ou não, em quarentena. Dentre os dados obtidos, uma alta incidência de médicos registrou elevada taxa de ansiedade sobre se poderiam infectar membros da família mais que a si próprios (52,8% versus 20,9%, respectivamente). Os fatores mais fortemente associados com ansiedade foram exaustão mental, ansiedade sobre ser infectado, ansiedade sobre infectar familiares e dificuldades para dormir. Os dados também mostraram que o escore médio de resiliência foi negativamente associado com ansiedade, o que foi interpretado como tendo valor heurístico para planejamento público e intervenções visando redução de ansiedade dos médicos e melhorar a habilidade dos mesmos para enfrentar os enormes desafios de tratar pacientes durante o surto pandêmico. Os autores observaram, também, que esses altos níveis de ansiedade são equivalentes à aqueles registrados entre trabalhadores de saúde mental, expostos à pandemia da Covid-19 na China. Ademais, ficou demonstrado que a resiliência promove um fator protetivo contra a ansiedade e contra o estresse relacionado ao trabalho, aos quais os médicos são submetidos ao longo de sua exaustiva jornada de tratar pacientes da pandemia.
Tomados em conjunto, o estudo identificou que vários fatores estressantes do cotidiano dos médicos na linha de frente de enfrentamento à Covid-19, incluindo a sobrecarga de trabalho e o medo da infecção, estão associados com um aumento dos indicadores de ansiedade, bem como, revelou que a resiliência está associada com uma redução dos níveis de ansiedade nesses mesmos médicos. Portanto, uma medida, ou intervenção, de política pública, visando a melhoria da saúde mental desses profissionais, deveria focalizar treino da resiliência, equilíbrio da carga de trabalho e uma comunicação de risco eficiente e cofiável.