O problema básico, que envolve a saúde, é a concepção que se tem da vida humana. Alguém pode desqualificar minhas considerações alegando que eu não entendo de medicina, ou seja, que eu não tenho diploma médico, enquanto eu posso desqualificá-lo, com a mesma razão, garantindo que ele não entende de vida humana. Isso equivale a dizer que seu diploma médico não o credencia a pronunciar-se sobre a natureza do ser humano. O Papa São Paulo VI, retratando uma História de dois mil anos, assegurou a todo o mundo, num discurso à ONU, que a Igreja é mestra em humanidade. Tem algo importante e indispensável a dizer. Não se pode tratar de medicina sem uma concepção a respeito do homem. Mata-se muito mais o ser humano pela ideia, que pela violência com que se elimina sua vida terrestre.
É sabido que, para se pronunciar acerca das qualidades gastronômicas de um bolo, não é preciso saber fazê-lo, como para degustar um bom vinho e se pronunciar a respeito dele, não se exige que se esteja em condições de fabricá-lo. Não me cabe, nem me arrisco, dar receitas para as diferentes doenças, – apesar de o provérbio garantir que de poeta e médico todos tem um pouco – mas não posso omitir-me, como pessoa humana e, principalmente, como ministro ordenado, sobre a situação atual da saúde e sobre as medidas que neste campo se tomam. Estamos em plena pandemia. E agora?
O primeiro questionamento, que me incumbe fazer, é que a nossa farmacologia está baseada na concepção de que o homem não é mais que um ser natural, composto dos mesmos elementos, que constam nos fármacos.
A visão antropológica cristã rebate essa concepção e garante duas vertentes básicas: vê o ser humano, ao mesmo tempo, a partir da natureza e a partir de Deus. É, em outras palavras, um ser natural aberto à transcendência.
Pondo em discussão a categoria de natureza, retoma-se e aprofunda-se, hoje, a questão da bioética e da biotecnologia. O ser humano é e deve ser visto em sua dupla referência: como imagem e semelhança de Deus e, como ser vivo, ligado à matéria. No momento em que eliminarmos a dimensão da transcendência, a dimensão pessoal do ser humano e o próprio conceito de pessoa desaparecem.
Lemos e ouvimos, como nunca antes, opiniões para não dizer palpites sobre medicamentos, procedimentos clínicos e receitas de tudo que se possa imaginar a respeito do combate ao novo Coronavírus. De repente, em cada esquina, encontra-se um médico “sem diploma” dando sua opinião ou o que é pior, intransigentemente tentando influenciar seus interlocutores, sobre o que é ou não eficaz para evitar a infecção ou curar a COVID-19.
Penso que já passou da hora de pararmos de brigar para impor opiniões pessoais, ideológicas e “bancar de médico e de cientista” diante de praticamente meio milhão de óbitos. Vidas humanas ceifadas por um vírus letal e traiçoeiro. Gosto de pensar que ninguém morre na véspera e nem atrasado. Quantas pessoas foram acometidas pela COVID e se recuperaram? Milhões de pessoas. Quantas dessas pessoas ficaram realmente sem nenhuma sequela? Ainda saberemos num futuro certamente próximo.
Como seria eficaz, de verdade, se todos os brasileiros se unissem em torno da defesa da vida humana, sem politizar a pandemia que assola o mundo inteiro. Se deixássemos que cientistas, médicos sérios e defensores da vida das pessoas cuidassem, com o apoio de todos os governantes eleitos para tal, cumprindo sua missão sem nenhuma interferência e pressão da vida humana!