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Começou o “feliz” desmanche: quem ganha?

É tempo para reflexão. Com ironia (ou não).

Num concurso para a carreira de Juiz de Direito, aos can­didatos foi perguntado: o que é mais importante num proces­so? A resposta não veio de imediato. A banca examinadora então sugeriu: “por exemplo, a defesa, os depoimentos (das partes e das testemunhas), a sentença (decisão do juiz)…”

A maioria respondeu: “…a sentença”. O restante se dividiu entre as outras duas sugestões.
Resultado oficial: todos erraram.

Porque há um ato processual que sustenta o princípio da ideia de validade de todos os demais atos de um processo.

Ele se instala no início da tramitação da propositura judicial. É o ato que se encarrega de dar o sentido do pleno conhecimento da demanda ao demandado. E, por consequ­ência, chama-lo para vir a juízo se defender (dar sua resposta, versões e se dispor a apresentar suas provas, exibindo docu­mentos, provocando perícias, depoimento da parte deman­dante e das suas testemunhas, principalmente).

Esse ato (de pouquíssima complexidade) é de extremo valor para todo o processo, porque (bem realizado) possibili­ta acreditar que ao demandado foi dada a real oportunidade da lei para se defender. Recebe o nome técnico de citação (ou notificação, no processo do trabalho).

Nada se faz sem a certeza da citação ou notificação, con­forme o caso.

Portanto, até mesmo a sentença só tem validade se o refe­rido ato processual tiver ocorrido com absoluta regularidade, sem qualquer dúvida.

Para que assim seja, antigamente só era realizado através de um Oficial de Justiça, que ia ao endereço do demandado, falar pessoalmente, entregar cópia da ação, colher assinatura sua. Tudo para ter aquela certeza de que o Réu (demandado) tomou conhecimento da ação e foi chamado para se defender.

O rigor inicial foi, aos poucos, sendo amainado.

De 1943 até 1973 só a Justiça do Trabalho substituiu os Oficiais de Justiça, enviando a notificação pela via postal, confiando aos Correios colherem a “assinatura” do demanda­do no recibo (AR), que voltava para ficar no processo.

Essa prática em 1973 veio para o processo civil, foi am­pliada e, hoje, só é excepcionalmente serviço para Oficial de Justiça. Ficou mais simples, rápido e de menor custo.

No final do século os Correios deixaram de enviar o reci­bo para a Justiça, arquivando-o em suas dependências.

Agora, dias desses, um ex-empregado passou na empresa e falou aos ex-colegas: “Vocês são bobos. Entrei com ação contra o patrão, ele não foi à audiência, ganhei 200 mil. Vocês ficam aí trabalhando pra ele e não vão ganhar nada”.

A empresa ficou surpresa porque não sabia. Nada recebeu. Foi aos Correios e não encontrou o AR. Nem poderia encontrar.

A “notificação” foi enviada por correspondência simples. Ninguém sabe onde foi entregue, para quem, nada arquivado (Correios ou Justiça). Mas a audiência foi realizada. A revelia da empresa foi decretada. O Juiz vai sentenciar: quem não contestou…. Tem solução? Claro que tem.

Nos preocupa o descontrole do Judiciário do trabalho. É em função da idealizada modernidade? Com certeza reduziu cus­tos. Simplicidade que fragiliza: demandante perde a ilusão da vitória, Juiz trabalha para desfazer o que fez. Todos perderam através de um contrato (SED) entre a Justiça e os Correios.

Só o Estado hoje comemora um “feliz” desmanche da segurança jurídica dos brasileiros. Nós, não.

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