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Cultura

Com sua luta para salvar a Terra, heroína Suzume chega ao Brasil

Por Rodrigo Fonseca, especial para o Estadão

Entre os grandes nomes do cinema japonês contemporâneo, ao lado de Naomi Kawase, Kiyoshi Kurosawa, Ryûsuke Hamaguchi e Hirokazu Kore-eda, há um realizador especializado em desenhos animados – lá chamados de animes – de 50 anos, que vem sendo o responsável pelas maiores bilheterias de seu país nos últimos dez anos: Makoto Shinkai. Seu filme mais cultuado, Your Name, chegou a desafiar blockbusters da Marvel e da DC em terras (e telas) nipônicas no seu lançamento, em 2016, quando faturou US$ 382 milhões, majoritariamente em salas asiáticas.

Hollywood ficou tão espantada que comprou os direitos da trama – sobre uma moça e um rapaz que trocam suas consciências, sem jamais terem se conhecido, e se apaixonam estando com os corpos trocados – para ser refilmada por J.J. Abrams. Meses antes da pandemia, ele emplacou outro hit: O Tempo com Você, que contabilizou US$ 193 milhões na venda de ingressos. Suas altas cifras já seriam o bastante para que ele despertasse a atenção da indústria. Porém, mais que isso, Shinkai virou uma unanimidade de excelência no gosto da crítica internacional: seus longas recebem cotações altíssimas pela originalidade de seus roteiros. Não por acaso, seu trabalho mais recente, Suzume, que estreia quinta, 13, nos cinemas brasileiros, recebeu uma distinção rara na animação: foi selecionado para concorrer ao Urso de Ouro do Festival de Berlim, em fevereiro, quando já somava cerca de US$ 138 milhões nas salas de exibição do Japão. Estima-se que seja seu maior êxito comercial.

“A animação é uma forma brilhante de comunicação, pois cada quadro que você desenha tem que carregar a essência de toda a história em si. Não é parte, é síntese. Para que um filme tenha a minha identidade, desenho sozinho cada storyboard, que carrega muito do que você vai ver no cinema”, disse Shinkai, em entrevista ao Estadão em Berlim, onde confessou ter gasto um ano e meio de trabalho esquadrinhando cada plano de Suzume, em ilustrações carregadas de detalhes.

CONDENSAR A EMOÇÃO

“O preço do ingresso no Japão é muito alto, adverte. “Quando uma pessoa decide ver um filme, com sua família ou amigos, investe um dinheiro considerável em um programa que tende a ser definido como lazer, passatempo. Por isso, tento condensar emoção, riso, ação e muita movimentação nos meus filmes, para que a plateia se sinta compensada diante do que vai ver.”

Já se passaram 21 anos desde que Hayao Miyazaki ganhou o Urso de Ouro da Berlinale com A Viagem de Chihiro. Grande influência viva de Shinkai, ele tem hoje 82 anos e está finalizando How Do You Live?, previsto para concorrer no Festival de Cannes, entre 16 e 27 de maio. Desde 2002, a animação japonesa não tem protagonismo nas competições dos grandes festivais, que preferiram abrir espaço para produções da China, como Art College 1994 (também exibido em Berlim), e Nº 7 Cherry Lane, melhor roteiro em Veneza, em 2019. Coube a Suzume mudar esse cenário, apostando (como já de praxe, com Shinkai), num enredo mirabolante, repleto de referências mitológicas do Japão e da Grécia.

REALIDADE

“A realidade tal qual a percebemos é muito complexa, o que me permite tratá-la em muitas camadas distintas. Escrevo pensando na literatura de Murakami e no cinema de Miyazaki, mas imprimindo o meu senso particular de que a morte está sempre ao nosso lado. Não é catastrofismo, mas a experiência pessoal de fazer parte de um país historicamente assolado por terremotos. Vivo sobre um pedaço de terra insular instável. Já vivemos o pesadelo de tragédias que decorreram das falhas tectônicas. Esse temor está em Suzume. Está na vida”, diz o cineasta, que escalou a atriz Nanoka Hara para ser a voz de sua protagonista.

Suzume é o nome de uma adolescente órfã, criada pela tia, que se vê obrigada a salvar o planeta de cataclismos. Um dia, sem motivo aparente, a jovem – que nunca conseguiu passar a limpo a morte de sua mãe, provocada por um incidente supostamente natural – percebe que há uma porta flutuando no céu. Há outras. Muitas. Cada porta que se abre provoca uma série de catástrofes expressas na forma de tremores de terra, tempestades e ondas de energia. O risco que esses eventos místicos trazem evocam em Suzume a doída memória de um tsunami associado ao luto que carrega. Ao mesmo tempo, ela se apaixona por uma entidade, em forma de homem, que tem por missão fechar essas portas. Mas um deus-gato vai cruzar o caminho deles e transformar o jovem em uma cadeira com uma das pernas quebradas. Uma louca que busca por esse gato e pelo segredo por trás das tais portas movimenta a jornada da reeducação sentimental de Suzume.

“Tentei ser bastante respeitoso em relação às lendas japonesas, recriando o tsunami que nos destruiu há 12 anos”, diz Shinkai. “Contar essa história pode envolver elementos de melodrama, mas não é um empenho consciente. Meus filmes têm um toque metafísico que até pode fazer alguém chorar. Ou rir. Mas não desejo a compensação pelo choro ou pelo humor, e sim pelo inusitado.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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