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‘Close’ revela, em detalhes sutis, os altos e baixos do amadurecer

Por Rodrigo Fonseca, especial para o Estadão

Preparar os pré-adolescentes Eden Dambrine e Gustav De Waele para o delicado jogo de atuações que levou o longa belga Close a receber uma indicação para o Oscar de Melhor Filme Internacional custou ao cineasta Lukas Dhont um dia de trabalho. Só um. Mas foi um dia de absoluta imersão, com os dois e demais candidatos.

Não que o processo, iniciado cerca de um ano antes das filmagens, tenha se esgotado ali. Aliás, no intervalo entre o verão do teste de elenco e o verão em que foi rodada a narrativa que conquistou o Grande Prêmio do Júri de Cannes de 2022, o realizador, hoje com 31 anos, ficou atento às mudanças (de voz, de estatura e de conduta) inerentes à passagem da infância à adolescência. O filme estreia nesta quinta, 2, nos cinemas brasileiros.

“Amizade era o ponto de arranque de uma história que evoluiu para o enfrentamento da perda, acomodação à dor do luto e a percepção de como seguimos adiante, apesar dos sofrimentos, sempre na perspectiva daquilo que nos é mais íntimo”, explicou Dhont aoEstadão em Cannes, logo após ter conquistado o Grand Prix, em um empate com a cineasta francesa Claire Denis, premiada por Stars at Noon.

Detalhista em suas descrições, ele frisa que a atenção dedicada a Eden e Gustav, durante uma espécie de oficina que fez para encontrar seu elenco, era cercada da certeza de que eles seriam seus protagonistas. Caberia à dupla estrelar o drama sobre dilemas morais da masculinidade, que vai chegar à grade da Mubi em 21 de abril. “Foi meu irmão, Michiel, quem produziu esse filme, que nasceu quando li a pesquisa de uma psicóloga americana, Niobe Way, na qual ela acompanhava o crescimento de 150 meninos, dos 13 aos 18 anos (uma coleta de dados que virou um livro, ‘Deep Secrets’).”

FRÁGEIS

Ao perguntar sobre as relações de amizade que eles desenvolvem com colegas de mesma idade, as reações mudam. Aos 13, eles deixam aparente todo o carinho que sentem e não temem expor que são frágeis. O mesmo não acontece quando ela volta a esses mesmos meninos quando estão com 16 ou 17 anos. Ali, falar de proximidade, em um universo de socialização entre homens, vira um problema e a ideia de fragilidade é descartada”, disse Dhont. “Fomos condicionados com o tempo para ver a intimidade entre rapazes sempre pela lente da sensualidade, sem perceber o quanto os tabus que nascem daí geram de solidão, exclusão.”

Quatro anos antes de Close, Dhont atraiu os holofotes da crítica ao desafiar os códigos do universo masculino, e outras cartilhas de identidade de gênero, em Girl (2018), aqui chamado O Florescer de uma Garota. Lançado também em Cannes, na seção Un Certain Regard, o longa deu ao realizador (então com 27 anos) o troféu Caméra d’Or de Melhor Filme de Estreia, o Prêmio da Crítica e a Queer Palm (láurea LGBT). Sua trama: Lara sonha ser bailarina, mas encara o desafio de estar confinada no corpo de um garoto.

“O cinema que tento fazer se debruça sobre o vocabulário do masculino e o modo como ele descarta palavras como ‘ternura’ e ‘fragilidade’ na relação com o outro”, disse o cineasta, que conheceu os atores centrais de Close em uma metodologia de escalação nada comum. “Gustav foi encontrado em uma escola de teatro em Bruxelas, mas a descoberta de Eden foi o acaso, ou sorte, se você preferir. Eu estava em um trem e vi um grupo de garotos conversando alto, na maior festa. Eden estava entre eles e tinha no olhar algo de angelical e de andrógino que eu buscava Quando botei os dois juntos pela primeira vez, eles gravitavam. Um falava o que o outro deveria fazer durante a dinâmica que eu estabeleci, ao longo de todo um dia. Não creio que um teste de apenas 20 minutos seja suficiente para mostrar o que um candidato pode fazer.”

Premiado com 38 troféus desde sua exibição em Cannes, em maio, Close é a cartografia dos afetos que marcam a vivência carinhosa de Léo e Rémi, estudantes de 13 anos que moram em uma bucólica região de Wetteren, na Bélgica, cercados por um campo de flores (as locações foram em Zundert, na Holanda). Inseparáveis, eles agem como irmãos.

BOATOS

No entanto, quando um novo ano escolar começa, a turma em que estudam passa a levantar boatos de um possível caso de amor entre eles. Essas palavras não são usadas, mas há insinuações acerca de homoafetividade entre eles, o que leva Leo a se afastar de Rémi, com consequências brutais. A presença de duas mulheres fortes, a mãe de Rémi, Sophie (Émilie Dequenne), e a de Leo, Nathalie (Léa Drucker), vai redesenhar a percepção do público sobre aquele mundo abalado por bombas hormonais e descobertas que é a adolescência.

“Se hoje faço cinema é porque, na minha infância, minha mãe me levou para ver filmes e me fez amá-los. Depois de Girl, queria muito um longa sob a ótica de meninos, mas que falasse de temas importantes. A maternidade era um deles, essencial”, diz Dhont. “Tinha visto Léa Drucker brilhar em Custódia, e me encontrei com ela na entrega de um troféu César, quando conversamos sobre trabalhar juntos. Émilie talvez seja hoje a maior atriz de sua geração na Bélgica.”

E acrescentou: “Juntei as duas e a alquimia foi plena. Trouxeram uma abordagem maternal que nos acolheu no set. Ampliaram a ideia de conexão emotiva que está na gênese do filme e que me permite discutir a intimidade”.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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