Condecorado e reconhecido no mundo acadêmico, o ribeirão-pretano, Norberto Peporine Lopes é membro da Academia Brasileira de Ciências. Autor de mais de 340 artigos científicos, o que é extremamente raro no Brasil – e muitos deles com impactos sociais –, Lopes é um jovem cientista altamente respeitado, e eleito presidente da Sociedade Brasileira de Química. O nome e trabalho de Norberto são referências, mas como foi a infância do cientista? Como surgiu esse interesse pela ciência e como ele construiu esse caminho.? Norberto contou isso ao Tribuna.
Segundo ele a principal marca da sua infância foi a curiosidade e o questionamento. “Lembro-me bem de deixar por várias vezes uma partida de futebol ou uma outra brincadeira qualquer para olhar, por exemplo, um inseto diferente movimentar-se. Lógico, mas, e o por que? de tantos insetos diferentes seria o passo seguinte, e isso resultou no meu primeiro insetário. Passava tardes andando por terrenos e matos procurando insetos diferentes e observando suas relações naquele micro ambiente e que alegria era ter a sorte de observar uma vespa atacando uma aranha ou ainda encontrar um pequeno animal passeando”, conta.
Com o passar dos anos passou a gastar boa parte da mesada, obtida através do trabalho de jardineiro, para montar criações de peixes, pequenos animais e até insetos. “A curiosidade sobre como poderiam funcionar essas interações começou a ser uma presença marcante na minha vida. Já no colegial comecei a prestar um pouco mais de atenção na química e na física e tentar correlacionar os conhecimentos adquiridos, nestas matérias, com o que eu gostava na biologia. As famosas “experiências” para as feiras de ciências eram o ponto alto, mas o que mais marcou foram as “engenhocas” que montava em casa para utilizar nos criatórios ou as soluções concentradas de azul de metileno para tratamento de micoses para peixes de aquário, além das cobras e outros animais que aprendi a embalsamar”, lembra.
E foi assim, nesse misto de curiosidade e paixão pela natureza, que começou a se envolver com algumas questões com características mais políticas. Nos anos pré-eleições diretas para presidente do Brasil, participou de grupos de discussão que culminariam na formação de um grupo ambientalista. “Nos meus 16 anos comecei a participar ativamente dos movimentos de diretas já e descobri o gosto ora doce, ora amargo do funcionamento do sistema político. Esse novo universo ajudou a criar um conflito interno, pois tudo o que mais gostava na infância era ligado à biologia e à química, e nas vésperas do vestibular entre paixões e sonhos surgia como algo místico, a sociologia. Como todo adolescente esse dilema tornou-se algo muito grande e essa dúvida, cruel e natural de todo vestibulando, foi resolvida graças ao lado mais marcante de minha personalidade”. Em 1986 ingressou na Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto.
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Na Faculdade se envolveu com vários projetos de pesquisas e teve uma oportunidade de estagiar na Universidade de Tübingen na Alemanha, após o estágio foi convidado a retornar como bolsista. “Talvez tenha sido o maior prêmio nesta etapa inicial da minha de formação”, diz.
Na Alemanha, Norberto teve a experiência de estar na cidade de Berlin, no dia da queda do muro. “Este fato histórico foi marcante e ainda lembro de cada detalhe daquele dia”.
No retorno ao Brasil e já fazendo mestrado, Norberto recebeu o convite para integrar-se a um grupo de pesquisa e trabalhar com espécies selvagens brasileiras. Participou de outros projetos importantes.
No início do doutoramento realizou estágio do tipo “sanduíche” nos laboratórios da Universidade de Washington.
Retornando ao Brasil, trabalhou mais em campo e realizou uma série de viagens para a Amazônia na busca de plantas e sementes para os estudos fitoquímicos e de biossíntese. “Posso dizer sem medo que essas coletas foram verdadeiras aventuras, a cada nova ida nós nos propúnhamos a alcançar um local mais distante, o que culminou com o nosso ingresso na tribo Wãiapi, bem distante da última cidade do estado do Amapá”.
Como recém doutor passou em dois processos seletivos para professor de Farmacognosia na FCF-UNESP e outro para Química Orgânica na FCFRP-USP, optou pela USP, por ser em Ribeirão. Iniciou a carreira docente no início de 1998..
No final de 2000 apareceu a oportunidade para o pós-doutoramento, visando implantar uma nova medotologia em produtos naturais e, em 2001, foi para a Universidade de Cambridge, na Inglaterra, realizar estudos de espectrometria de massas de produtos naturais. Norberto conquistou o respeito de demais pesquisadores ao resolver um problema. “Comprovados os resultados, as portas se abriram e a partir daí meu direcionamento investigativo foi aguçado e outros bons resultados levaram a produção de uma série de artigos. Devido a essa produção recebi um destaque no Departamento Química da Universidade de Cambridge, onde fui citado como um dos pesquisadores mais produtivos no ano”, conta.
A participação em sociedades científicas sempre foi outra característica marcante de Norberto. Ocupou cargos importantes na Sociedade Brasileira de Química. Com mais de 15 anos de história de envolvimento com a SBQ foi eleito presidente em 2016 e irá assumir o cargo em maio de 2018. “Mesmo com esse forte envolvimento com a SBQ também atuo, desde a fundação, na Sociedade Brasileira de Espectrometria de Massas tendo ocupado o cargo de Diretor Financeiro e atualmente ocupo uma cadeira no Conselho. Finalmente em 2015 fui nomeado Fellow da Royal Society of Chemistry o que nos encheu de orgulho”.
O resultado do envolvimento com pesquisa levou na indicação de Norberto para dois prêmios nacionais importantes a Medalha de Honra da Sociedade Brasileira de Espectrometria de Massas e a de Inovação Fernando Galembeck conferida pela SBQ. Em 2016 foi indicado e escolhido para a Academia Brasileira de Ciências.