Todos nós sabemos que os indivíduos diferem em suas habilidades cognitivas, variando desde raciocínio abstrato até a capacidade para memorizar novos conceitos. Uma parte substancial dessa variabilidade é capturada pelas medidas psicométricas incorporadas nos testes de inteligência fluída ou de inteligência geral que agregam os resultados de variados testes de inúmeros domínios de desempenho cognitivo. Nos últimos anos, tem sido constatado que estas medidas são válidas, confiáveis e estáveis ao longo de toda a vida. Ademais, são também associadas com importantes desfechos na vida, incluindo desempenho educacional treinabilidade e eficiência no emprego, renda individual, criminalidade, longevidade e mortalidade.
Muitas pesquisas têm sido dedicadas ao entendimento de como as diferenças individuais no desempenho cognitivo emergem, bem como, se as mesmas podem ser explicadas por fatores ambientais, evolutivos, genéticos e neuroanatômicos. Uma hipótese clássica propõe uma associação positiva entre inteligência e o volume cerebral total. Por várias décadas, a única maneira de testar essa hipótese era usar abordagens indiretas para mensurar o volume cerebral, tal como a circunferência da cabeça. Todavia, como esperado, estes estudos empíricos foram controversos devido a problemas metodológicos e discussões acerca de vieses culturais e raciais.
Entretanto, com o advento das ferramentas não invasivas, tais como, a técnica de imageamento por ressonância magnética (fMRI) no final dos anos 80, ressuscitaram-se os estudos que diretamente examinaram a relação entre o volume cerebral total e a inteligência. Um dos primeiros estudos já utilizando esta técnica encontrou uma correlação de 0,51 numa amostra de estudantes universitários. Posteriormente, várias metanálises revelaram correlações que variaram de 0,24 a 0,37, indicando que, embora não muito elevada, havia indícios de existiruma correlação significativa entre o tamanho do cérebro e a inteligência de uma pessoa.
Recentemente, um artigo intitulado “Are bigger brains smarter? Evidence from a large-escale preregistered study”, publicado na prestigiosa revista Psychological Science (2018), mostrou que, controlando as variáveis sexo, idade, altura, status sócioeconômico e estrutura populacional, obteve-se uma robusta correlação de 0,19 entre o volume total do cérebro e a inteligência fluída. O estudo envolveu uma amostra de 13.608 participantes do Reino Unido que se submeteu a testes de inteligência fluída, de habilidade cognitiva geral e de desempenho educacional cujas imagens da estrutura cerebral foram calculadas somando-se os volumes da substância cinzenta, da substância branca e do fluído cérebroespinhal. Outro resultado interessante é que os autores também encontraram uma correlação positiva entre o volume total cerebral e o desempenho educacional (r=0,12), com efeitos similares para as variáveis sexo e grupos etários.
Importa destacar que, em suas discussões acerca das relações entre características anatômicas do cérebro e desempenho cognitivo, os autores chamaram a atenção para elas poderem ser mediadas por processos neurais que poderiam ser melhor capturados por medidas do funcionamento cerebral do que por medidas volumétricas. Em adição, muitos processos mentais distintos, tais como, atenção, percepção e memória, mostraram muito contribuir para o desempenho nos testes de inteligência. Assim considerando, nosso entendimento de como as diferenças individuais na cognição surgem pode, por certo, se beneficiar substancialmente de um mapeamento de medidas anatômico-funcionais do cérebro e de diferenças individuais nas habilidades mentais distintas.