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Carmen Cagno – Salvemos nossos museus – I

Há poucos meses, perdemos praticamente todo o acervo do maior museu do país, o Museu Nacional, devorado por um incêndio, após anos de descaso em relação às péssimas condições de conservação em que se encontrava. Assim como ele, outras dezenas de museus brasileiros correm o risco de fecharem as portas ou serem igualmente destruídos.

Em Ribeirão, a situação dos nossos museus não é diferente. O abandono e as péssimas condições de preservação desse patrimônio apontam para um futuro desastre. Dois desses museus têm preocupado especialmente parte da população que conhece a importância da cultura local e de sua memória.

Localizados no campus da USP, o Museu Histórico de Ordem Geral Plínio Travassos dos Santos e o Museu do Café Francisco Schmidt enfrentam há anos inúmeros problemas de conservação, desgaste, infiltrações e corrosão de suas instalações e de seu precioso acervo.

O Museu Histórico, também conhecido como Museu Municipal, está instalado no casarão que abrigou uma das principais fazendas de café da região e do país durante várias décadas. Construído a partir de 1877 pelo fazendeiro João Franco de Moraes Octávio, tornou-se a sede da Fazenda Monte Alegre, aberta por ele.

Típica construção das fazendas de café paulista, a casa sede tem um traçado em éle, com a parte da frente assobradada e porões no nível do chão. Situada no que hoje é o campus da USP de Ribeirão Preto, a fazenda produzia milhares de sacas de café. E ainda que utilizasse mão de obra escrava, contou com uma administração bastante avançada, com a importação de máquinas modernas de beneficiamento e até a instalação de luz elétrica a partir de 1833.

Em 1890, a Monte Alegre é vendida para Francisco Schmidt, um imigrante alemão que aqui fez fortuna e foi considerado um dos “reis do café”. No auge do poder, ele chegou a pos­suir 62 propriedades (22.461 hectares), onde 7.361 colonos cultivavam mais de 16 milhões de pés de café. Em 1913, Fran­cisco Schmidt já era o maior produtor do Brasil.

 Na Monte Alegre, avarandou toda a sede, onde viveu com a família, construiu várias edificações como o belvedere, os jardins e casas para os trabalhadores e ampliou, junto com outros fazendeiros, os ramais da Estrada de Ferro da Mogiana, que então chegava às suas terras e facilitava o escoamento do produto até o porto de Santos e dali para o exterior.

Ali instalou também um pequeno engenho de açúcar e cunhou uma moeda própria que circulava inclusive na cidade. Mas o declínio do mercado cafeeiro, e a quebra da Bolsa de Nova York em 1929, levaram os filhos herdeiros de Schmidt  a venderem  aos poucos milhares de pés de café até passarem a fazenda para outro proprietário, na década de 30.

Em 1942, o governo do Estado desapropria a fazenda e monta em suas terras a Escola Prática de Agricultura, onde ergue várias construções, e mantém a sede original para utilização da escola.

Nesse período, o memorialista Plínio Travassos dos Santos já vinha desenvolvendo um minucioso trabalho de resgate da memória da elite cafeeira da cidade, com apoio da prefeitura e de vários cafeicultores.

Na década de 50, uma lei municipal desmembra o terreno da casa e seu entorno do resto da fazenda, que é doada à Faculdade de Medicina da USP, inaugurada em 1951 e até então ocupando um prédio na cidade. No mesmo ano, Plínio, numa iniciativa conjunta com a prefeitura e cafeicultores da região, instala o Museu na sede da Monte Alegre com o rico acervo que havia reunido. Através de compras e doações, reúne mobiliário, objetos, documentos históricos, livros, artefatos culturais, coleções etnográficas, fotografias e obras de arte como esculturas e pinturas, entre elas obras de Victor Brecheret, Bernardelli, José Pereira Barreto e Colette Pujol .

Além disso, normatiza o levantamento de material e documentos, identificação, restauração e conservação de todo o acervo. A partir daí, durante 65 anos, Ribeirão teve um local de preservação e divulgação da memória do auge da sua história.

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