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CAÇADORA DE ASTEROIDES – Estudante de Medicina da USP RP é destaque mundial

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É entre microscópios e te­lescópios que a estudante de medicina Verena Paccola Me­nezes, de 22 anos, passa boa parte de seu tempo. Se, por um lado, o primeiro instrumento a ajuda nos caminhos que trilha para se tornar uma neuroci­rurgiã, é pelo telescópio que ela anteviu outra possibilidade: a medicina espacial, paixão que surgiu após, nos momentos de hobby, ter descoberto 25 aste­roides. Um deles, classificado como raro pela órbita diferen­ciada que poderá colocá-lo na direção da Terra.

Nos momentos livres, Ve­rena é uma “caçadora de aste­roides”. Mas a verdade é que ela, desde criança, sempre se considerou uma cientista. “A ciência sempre esteve presente na minha vida. Nem lembro quando comecei a me interes­sar. Brinco que já nasci cien­tista porque, para mim, fazer ciência e ser cientista é fazer perguntas, questionar o mun­do e ir atrás das respostas por conta própria, sem se conten­tar com o superficial. Sempre vivi dessa forma. Sempre fui uma criança muito curiosa para descobrir o mundo”, dis­se a estudante da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) em Ri­beirão Preto, que é também técnica de Enfermagem.

As oportunidades abertas pela astronomia à estudante de medicina estão fazendo-a repensar os planos para o futuro – FOTO: NEILA ROCHA (ASCOM/SEAPC/MCTI)

Brinquedo na escola
Verena ganhou o primei­ro microscópio quando tinha apenas 4 anos de idade. “Eu o levava como brinquedo para a escola, enquanto minhas ami­gas levavam bonecas e jogos”, lembra. O telescópio veio um pouco depois, aos 8 anos. “Te­nho ele até hoje no meu quarto principalmente para olhar a Lua”, disse a estudante, que há dois anos cursa a faculdade da USP em Ribeirão Preto, onde faz pesquisas sobre Alzheimer. Verena é nascida em Indaiatu­ba, interior de São Paulo.

“Microscópio e telescópio representam coisas diferentes na minha vida. O microscó­pio é mais voltado para mi­nha profissão porque envolve o que quero trabalhar, que é a medicina e a área acadêmica. O telescópio é mais um hobby, devido à minha curiosidade – o que abrange também céu e espaço. Sempre tive curiosida­de para saber o que existe para além do que a gente pode ver. Amo os dois instrumentos”, resume.

O curso técnico de enfer­magem foi feito durante o en­sino médio, na Unicamp entre 2015 e 2017. Foi ali que ela começou a viver o ambiente hospitalar de forma mais pro­fissional para, em seguida, já formada e no Hospital Albert Einstein (SP), fazer pesquisas na área de neurociência com­putacional para crianças do espectro autista.

Em 2019, representou o Brasil na Assembleia da Ju­ventude nas Nações Unidas (ONU) e se mudou para o Ca­nadá, onde iniciou graduação em neurociência. “Só que sem­pre sonhei em fazer medicina na USP, o que acabou voltando aos meus planos após ter de retornar ao Brasil porque, em termos financeiros, estava in­viável continuar no Canadá”.

Recomeço
O problema é que a jovem, que já era uma pesquisadora, teve de começar tudo de novo, para entrar na USP. “Fazia muito tempo que eu tinha feito o curso médio, e já não lem­brava bem do conteúdo. Tive de reaprender tudo do zero. Não foi uma fase legal, depois de fazer tanta pesquisa, voltar a estudar as matérias do ensino médio. Vivi muita pressão”.

A estudante ao lado de Patrick Miller, criador do programa Caça Asteroides da Nasa – REDES SOCIAIS

E foi exatamente a angústia de não praticar ciência que a fez avançar em uma outra paixão: a astronomia. “Eu precisava de algo científico para me estimu­lar. Foi quando me deparei, em um grupo de WhatsApp, com essa oportunidade de aprender a caçar asteroide”.

Ela fez então todo um trei­namento que a capacitou para o novo hobby. “Gostei muito disso. Depois de capacitada, comecei a usar o software que eles usam para caçar asteroi­des. Eu recebia imagens tiradas por um telescópio do Havaí. Cada pacote de imagens feitas pelo telescópio era composto de quatro imagens tiradas com diferença de segundos. Eu pe­gava esse pacote de imagens e o jogava no software que as piscava seguidamente, em or­dem. Como elas tinham dife­rença de tempo, dava para per­ceber se alguma coisa se movia no Espaço”.

Quando Verena encontra­va algum pontinho se movi­mentando, fazia a análise nu­mérica do objeto para ver se ele se encaixava nos padrões de um asteroide. Caso o resul­tado fosse positivo, ela gerava um relatório e o enviava para o centro internacional que estu­da isso em Harvard (EUA).

Foi dessa forma que ela descobriu nada menos que 25 novos asteroides. Diante do fei­to, foi convidada, em dezembro do ano passado, a receber uma medalha de ordem ao mérito, dada pelo Ministério da Ciên­cia, Tecnologia e Inovações, em Brasília, durante a Semana Na­cional de Ciência e Tecnologia.

Asteroide raro
“Acabei recebendo mais que uma medalha. Quando achei que a premiação tinha acabado, me chamaram nova­mente ao palco para receber um troféu. Foi ali que me con­taram que eu havia descober­to um asteroide importante e raro, que segue uma órbita di­ferente em torno do Sol”.
Normalmente os asteroides do Sistema Solar estão loca­lizados entre Marte e Júpiter, onde fica o chamado Cinturão Principal. Um dos asteroides descobertos por Verena seguia uma órbita diferente da dos demais, o que aumenta as pos­sibilidades de sua rota coinci­dir com a do planeta Terra.

“Agora a gente tem de ver para onde ele está indo, de for­ma a prever possíveis impactos com a Terra. Não sei se isso vai acontecer. A possibilida­de existe, mas se a gente olhar para as dimensões do Univer­so, vemos que a probabilidade é muito pequena”, diz ela, espe­rançosa de que sua descoberta não seja algo apocalíptico se­melhante à história contada no filme “Não olhe para cima”, no qual uma pesquisadora desco­bre um cometa com rota em direção à Terra, que dará fim à vida no planeta.

“Fiquei chocada com esse filme. Ele é muito bom até do ponto de vista científico. É também o retrato da sociedade e da mulher na ciência. Claro que me identifiquei muito com a personagem por também ser uma mulher na ciência. E, na ciência, as mulheres, além de não serem ouvidas, vivem em um contexto no qual é o ho­mem quem leva a maioria dos créditos. No filme, ela inclusive foi tachada de louca”.

Na avaliação da estudante caçadora de asteroides, o filme vai além, abordando a huma­nidade atual como um todo. “Fala muito sobre essa onda negacionista que vivemos no Brasil. Dá para relacionar a muitos assuntos, além de um cometa ou um asteroide. É também uma metáfora para a questão do aquecimento global, que os cientistas tanto falam que está acontecendo e que ninguém ouve. Mostra também o peso da economia em decisões”, argumenta.

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Futuro
As oportunidades abertas pela astronomia à estudante de medicina estão fazendo-a repensar os planos para o fu­turo. “Tenho certeza de que re­alizarei o sonho de me formar em medicina. Estou no segun­do ano do curso e tudo segue para que eu faça residência em neurocirurgia”, diz a caçadora de asteroides. “Só que agora eu tenho uma pulga atrás da ore­lha”, acrescenta.

Essa “pulga” foi colocada pelo presidente da Agência Es­pacial Brasileira, Carlos Mou­ra. “Depois da premiação em Brasília, visitei a agência. Lá, ele me falou sobre medicina espacial, que até então eu não conhecia porque não é uma área muito divulgada aqui no Brasil como especialização”.

O assunto despertou o in­teresse de Verena. “Comecei então a pesquisar e vi que tem médicos que estão no espaço agora, fazendo pesquisas em gravidade zero para ver como determinados tecidos se de­senvolvem; como algumas cé­lulas se multiplicam. É muito legal. E tem médicos desen­volvendo tecnologias para as pessoas irem ao espaço. É uma área muito grande que eu nem imaginava existir. Agora, é uma nova área para explorar e considerar para o meu futuro. Mas vamos ver”.

“Por enquanto, vou conti­nuar caçando asteroides e, se tudo der certo, ser também treinadora de caçadores de as­teroides para que outras pesso­as façam o mesmo e formemos equipes. Planejo fazer isso pelo meu Instagram”, finalizou.

Verena Paccola recebe medalha de ordem ao mérito do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações – FOTO: NEILA ROCHA (ASCOM/SEAPC/MCTI)

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