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‘Bob Cuspe: Nós Não Gostamos de Gente’ ressalta a aura punk de Angeli

Por Redação, O Estado de S.Paulo

Os personagens Irmãos Kowalski estão no meio de uma zona árida, até mesmo desértica, quando uma criatura pequenina aparece. É baixinho, tem roupa extravagante e usa óculos de estrela. Um Elton John em miniatura? Logo em seguida, essa criatura coloca as garras e os dentes para fora para atacar os Kowalski. Tudo é interrompido, porém, quando Bob Cuspe, essa criatura verde punk, mata esse monstro do pop com um só tiro.

Esse é o começo da história de Bob Cuspe: Nós Não Gostamos de Gente, filme que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, 11. Dirigido por Cesar Cabral e inspirado nos personagens de Angeli, o longa-metragem é daquelas produções que borram os limites entre documentário e ficção. É claro que a cena de Cuspe matando um Elton John em miniatura não é real, mas sim as aflições que o cartunista brasileiro sente em sua vida.

Afinal, para além dessa trama ao estilo Mad Max com Bob Cuspe e os Irmãos Kowalski, há uma outra que costura o sentido da história. São depoimentos de Angeli colhidos por Cesar e que, transformados em animação stop-motion, dão profundidade. De um lado, temos esse cartunista em crise de identidade, tentando entender o que é sua arte, para onde vão seus traços. De outro, há o universo de personagens em sua mente – agora, deserto de ideias.

Há, assim, toda essa emoção de Bob Cuspe tentando sobreviver, mas também existe ali uma animação com ares de Anomalisa, em que a figura retratada tenta compreender quem é e quem são as pessoas ao seu redor. “Aos poucos, fomos construindo a história desse autor em crise que resolve olhar para o passado e eliminar o Bob Cuspe, que é seu grande alterego”, explica Cesar. “Ele tem essa figura punk, da periferia, vivendo nessa São Paulo periférica. A gente brinca que é o autor tentando enfrentar esse seu passado”.

Nessa mente de Angeli, dessa forma, acompanhamos os embates entre o punk (representado pelo bruto Bob Cuspe) contra o pop (no caso, esses monstros em formato de Elton John). “Fiquei pensando: qual o pior fim de um punk? É ser devorado pelo pop”, exclama o cineasta. “O pop acaba sendo uma metáfora com várias camadas da vida, de nossas decepções. A gente pegou o Elton John como símbolo do pop. A história do Bob é construída nesse deserto pós-apocalíptico, já que o Angeli não desenha mais o Bob”.

ESTÉTICA

Além da história cheia de brincadeiras metafóricas e metalinguísticas, Bob Cuspe: Nós Não Gostamos de Gente também chama a atenção por seu visual marcante. O longa-metragem entra em um panteão de outras animações brasileiras que não investem no óbvio. É o caso de O Menino e o Mundo, Uma História de Amor e Fúria e Tito e os Pássaros. Aqui, no caso, César usou a técnica existente em todas as suas produções até o momento: o stop-motion.

Segundo ele, foram cerca de 50 pessoas trabalhando de maneira recorrente no projeto por três anos – no total, desde as primeiras conversas com Angeli, foram cinco anos de produção. A demora é explicada pelo processo altamente artesanal. Eram produzidos cerca de um minuto de animação por mês por animador. A cada quadro, entrava um animador, fazia as modificações necessárias na cena e, logo depois, registravam aquele breve frame.

Tudo ganha ainda mais vida com o trabalho de voz de Milhem Cortaz, Paulo Miklos e do próprio cartunista. Os diálogos do Angeli foram todos retirados de entrevistas, de trechos de conversas que César teve com ele. Nada de dublagem no pós-produção. “No final, eram personagens eternizados na memória das pessoas por conta das publicações da Chiclete com Banana, das tirinhas”, diz.

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