Por Ubiratan Brasil
Em uma carta em papel timbrado, datada de dezembro de 1949, o ator e diretor Charles Chaplin agradece o recebimento do primeiro número da revista Filme e promete escrever uma mensagem, que será enviada com uma foto autografada. Em outro papel, também timbrado mas sem data, um divertido Orson Welles reforça sua descrença nos jornais então editados por empresário William Randolph Hearst: “Eles noticiaram que eu caí de um andaime a três metros de altura e quebrei uma perna, mas, acredite-me, foi só um desejo”, escreve o cineasta, reforçando o convite para um novo almoço.
As duas correspondências foram endereçadas a Vinicius de Moraes (1913-1980), então cônsul brasileiro na Califórnia, nos Estados Unidos. Dois exemplos do vasto material cuidadosamente arquivado e catalogado, que compreende quase toda a produção intelectual do também poeta, músico, jornalista e dramaturgo e que estará disponível na internet – a partir do dia 27, mais de 11 mil documentos poderão ser consultados na íntegra no site www.acervo viniciusdemoraes.com.br.
São manuscritos e datiloscritos (material produzido em máquina de escrever), que revelam particularidades do processo de criação do poeta ao longo de quase 50 anos. Não haverá material em áudio e vídeo.
“O acervo é algo vivo, pois conta a história de uma vida e de como Vinicius percebia o mundo”, comenta Julia Moraes, neta do poeta.
Ela é a idealizadora e coordenadora do projeto Acervo Digital Vinicius de Moraes, que tem a coordenação técnica e design de Marcus Moraes, sobrinho-neto do artista.
“O conjunto dos documentos tem o tamanho da vida de Vinicius, que produziu poesia, além de material para cinema e teatro, e que, na vida pessoal, teve uma infinidade de amigos, com quem manteve uma vasta troca de correspondência”, continua Julia.
O acervo pessoal está guardado no Arquivo-Museu de Literatura Brasileira (AMLB) da Fundação Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro, e está disponível para consulta presencial desde 1992. Curiosamente, o AMLB foi criado a partir de um pedido de Carlos Drummond como um local para a memória literária nacional.
“A família, especialmente as irmãs Lygia e Laetitia e o próprio Vinicius, sempre foi cuidadosa com os documentos, que estavam na casa do poeta, no bairro da Gávea”, conta Marcus. “Minha mãe, que era bibliotecária, manuseava, maravilhada, os originais e ajudou na catalogação. Foi possível notar como Vinicius era um grande trabalhador da palavra – ele fazia e refazia os seus poemas.”
Segundo Julia, ele tinha sua rotina: trabalhava pela manhã e, à tarde, recebia os amigos, para longas conversas regadas a uísque As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.