Na maioria das vezes eles passam despercebidos por quem que não tem o hábito de acompanhar o dia a dia da Câmara de Vereadores. Entretanto, quem tem esse costume já deve ter percebido que vários temas de projetos de lei protocolados no Legislativo municipal causam a sensação de dejá vu [expressão francesa que significa: “Já visto”]. Para verificar a frequência com que um determinado tema é abordado no Legislativo, o Tribuna fez uma pesquisa no Portal da Câmara de Vereadores no período de vinte anos. A ideia era contabilizar quantos projetos haviam sido apresentados sobre determinados assuntos durante este período.
De acordo com a pesquisa dez temas recorrentes foram detectados em projetos de lei apresentados. Entre eles estão desde propostas parecidas de isenção do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), gratuidade no transporte coletivo e disponibilização de cadeiras de rodas. No total foram apresentados 47 projetos, dos quais vários sequer foram votados e acabaram sendo arquivados.
Foram contabilizadas nove propostas de isenção de IPTU protocoladas desde 2012, sete projetos concedendo gratuidade no transporte coletivo apresentados desde 2005, oito proposituras apresentadas desde 2001 visando a disponibilização de cadeiras de rodas e quatro propondo a implantação de programas de prevenção e controle da obesidade.
As propostas semelhantes estão presentes em todas as legislaturas do período analisado e não podem ser consideradas exclusivas de uma ou outra. Entre as mais recentes está, por exemplo, a sobre distribuição de absorventes que teve quatro projetos parecidos apresentados. Três pelas atuais vereadoras Duda Hidalgo (PT), Judeti Zilli (PT) do Coletivo Popular e Gláucia Berenice (Democratas). Em 2003 o então vereador Professor Lages já havia apresentado proposta sobre o assunto.

A iniciativa de Duda Hidalgo, por exemplo, visava implantar diretrizes para políticas públicas sobre a menstruação e propunha a distribuição de absorventes para mulheres em situação de vulnerabilidade. Já o de Gláucia Berenice estabelecia a distribuição, pela Prefeitura, de absorventes para estudantes em situação de vulnerabilidade e virou lei, depois de ter sido vetado pelo prefeito Duarte Nogueira (PSDB). Os vereadores derrubaram o veto e a lei foi promulgada pelo presidente da Câmara, Alessandro Maraca (MDB). Atualmente a lei está judicializada por uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) proposta pelo município no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP).
Outro tema que teve projetos semelhantes foi o que prevê a instalação de câmeras nos pet shops da cidade com o objetivo de coibir possíveis maus-tratos contra animais de estimação em estabelecimentos que prestam esse tipo de serviço.
O mais recente projeto teve como autor o vereador Brando Veiga (Republicanos) e acabou virando lei sancionada pelo prefeito Duarte Nogueira. Com a sanção da lei, a outra legislação que estava em vigência, de autoria da ex-vereadora Viviane Alexandre (na época no PPS), aprovada e sancionada em 2014 foi revogada. As duas leis eram parecidas.
A gratuidade no transporte coletivo também é um dos temas mais abordados pelos vereadores. O mais recente é de Igor Oliveira (MDB) e quer conceder gratuidade no transporte coletivo para pacientes em tratamento contra o câncer. A proposta considera para os efeitos da concessão, pessoas portadoras de câncer que estejam em tratamento de quimioterapia, radioterapia ou com consultas agendadas.
Para usufruírem do benefício os passageiros interessados seriam obrigados a portar documentos comprobatórios da doença de que são portadores, bem como atestados convocando-os para a consulta de tratamento, bem como comprobatórios de seu comparecimento, especificando os dias e horários dos procedimentos efetuados.
Segundo o autor do projeto, o vereador Igor Oliveira, os pacientes que sofrem da doença, necessitam de um melhor suporte, para que possam realizar o tratamento mais motivados. “Com a gratuidade do transporte, iremos atender a demanda e incentivar os mesmos a continuarem suas batalhas contra o câncer, e, assim, auxiliar o paciente nesta batalha tão difícil que é o tratamento desta doença”, justifica o parlamentar.
Atualmente têm direito à gratuidade no transporte coletivo da cidade, homens acima de 65 anos e as mulheres com mais de 60 anos, pessoas com deficiência e seus acompanhantes e estudantes da rede pública e particular. Os alunos de escolas municipais e estaduais não pagam nada e os da rede particular pagam 50% do valor da passagem.
A transparência sobre as obras municipais paradas ou paralisadas também teve projetos bem parecidos, mas com desfechos diferentes. O primeiro deles, apresentado pelo atual presidente da Câmara, Alessandro Maraca (MDB) previa a divulgação no Portal da prefeitura as obras paradas, os motivos da paralisação e a data quando elas seriam reiniciadas. Foi aprovado pelos vereadores, vetado pelo Executivo e teve o veto derrubado pelos vereadores. Acabou virando lei promulgada pela Câmara, mas foi parar na Justiça graças a uma Adin proposta pela prefeitura no TJ/SP.

Já o de autoria de Judeti Zilli e que obriga a Prefeitura de Ribeirão Preto a divulgar no seu Portal as obras municipais paralisadas na cidade e listadas pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE/SP) acabou sendo sancionado pelo prefeito Nogueira. A lei tem como argumento o fato da prefeitura já ter a obrigatoriedade de repassar as informações sobre obras paralisadas ao TCE. Ressalta que a disponibilização no Portal de Prefeitura seria mais uma forma de aumentar a transparência pública.
Desde janeiro de 2019, os órgãos da Administração Direta e Indireta do Estado e dos municípios passaram a prestar informações ao Tribunal de Contas sobre obras paralisadas ou atrasadas. A partir dos dados enviados pelos jurisdicionados, o TCE começou a monitorar as obras públicas com problemas de cronograma disponibilizando os detalhes para controle pela população.
Especialista em direito público consultado pelo Tribuna afirma que a duplicidade de assuntos em projetos de lei poderia ser evitada pela assessoria técnica dos vereadores. Ou seja, antes de propor uma lei, o parlamentar deveria realizar uma consulta junto à Secretaria Legislativa da Câmara para verificar a existência de projetos semelhantes anteriores ao seu. Se existisse, o que ele poderia fazer, seria tentar aprimorar a proposta ou lei já existente.
Projetos parecidos sobre um mesmo assunto
Isenção de IPTU
Propostas desde 2012: 9 projetos
Autores
Jorge Parada (PL 420/2007) Walter Gomes (PL 755/2015) Orlando Pesoti (PL 27/2017) Isaac Antunes (PL 88/2017) Mauricio Vila Abranches (PL 89/2017) Jean Corauci (PL 51/2018) Jean Corauci (PL 89/2018) Gláucia Berenice (PL127/2018) Igor Oliveira (PL 226/2018)
Gratuidade no transporte coletivo
Propostas desde 2004: 7 projetos
Autores
Marinho Sampaio (PL 15.161/2004) Marinho Sampaio (PL 20/2005) Fátima Rosa (PL 386/2005) Marinho Sampaio (PL 984/2007) Nelson das Placas (PL 27/2017) Igor Oliveira (PL 317/2017) Jorge Parada (PL 217/2018)
Disponibilização de cadeiras de rodas nos serviços públicos
Propostas desde 2001: 8 projetos
Autores
Corauci Neto (PL 18/2001) Cícero Gomes (PL 12/2003) Silvio Martins (PL 1.434/2004) Corauci Neto (PL 1.479/2008) Paulo Modas (PL 552/2014) Andre Luiz (PL 593/2014) Elizeu Rocha (PL 374/2017) Jean Corauci (PL 22/2018)
Feiras naturais e orgânicas
Propostas desde 2015: 5 projetos
Autores
André Luiz (PL 956/2015) Beto Cangussu (PL 1.289/2016) Fabiano Guimarães /Paulinho Pereira (PL 157/2017) Gláucia Berenice (PL 237/2017) Rodrigo Simões (PL 138/2020)
Prevenção e controle de obesidade
Propostas desde 2002: 4 projetos
Autores
Bertinho Scandiuzzi (PL 967/2002) Corauci Neto (PL 308/2005) Mauricio Gasparini (PL 245/2013) Paulo Modas (PL 1.036/2015)
Distribuição de Absorventes
Propostas desde 2003: 4 projetos
Autores
Professor Lages (PL 1.276/2003) Glaucia Berenice (PL 191/2020) Duda Hidalgo (PL 59/2021) Coletivo Popular Judeti Zilli (PL 163/2021)
Criação de cronograma para extração e poda de árvores
Propostas desde 2017: 3 projetos
Autores
Marinho Sampaio (PL 480/2014) Otoniel Lima (PL 279/2017) Marinho Sampaio (PL 20/2018)
Transparência sobre obras paradas
Propostas desde 2018: 3 projetos
Autores
Rodrigo Simões (PL 277/2018) Alessandro Maraca (PL 113/2021) Coletivo Popular Judeti Zilli (PL 223/2021)
Instalação de câmeras em pet shop
Propostas desde 2014: 2 projetos
Autores
Viviane Alexandre (PL 600/2014) Brando Veiga (PL 168/2021)
Prioridade de exames em diabéticos
Propostas desde 2017: 2 projetos
Autores
Alessandro Maraca (PL 167/2021) Marinho Sampaio (PL 218/2017)