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As três mortes de Geraldo Pereira

Para quem não o conhece, Geraldo Pereira é considerado um dos maiores sambistas brasileiros. Autor de sucessos como Falsa Baiana, Sem compromisso, Escurinho e Resignação, gravados por vários can­tores de renome, era além de sambista, um boêmio, e para alguns que o conheceram, até um malandro, que gostava de frequentar os bares e os ambientes boêmios do Rio de Janeiro.

Em 1955, após uma briga com José Francisco dos Santos, o Madame Satã, outro malandro famoso na época, no bar Capela, na região da Lapa, o sambista veio a falecer.

A partir da sua morte, construiu-se um mito em torno das causas da mesma, levando a interpretação deste episódio em três versões diferen­tes, que vou contar aqui, a partir da análise do jornalista, pesquisador e professor Carlos Nobre:

Versão 1
Pobre, preto e homossexual, Madame Satã desde a década de 1930 se tornara um mito na Lapa por defender pobres, enfrentar policiais e por possuir um soco poderoso com a mão esquerda. Muitos tentaram trazer a glória para si provocando Madame Satã e eram derrotados rapidamente por ele. No início de maio de 1955, Satã estava bebendo no Capela, que ficava então no Largo da Lapa, 30. Estava na mesa sozinho e usava seu tradicional chapéu Panamá. Nesse ínterim, chegou Geraldo Pereira acompanhado de uma mulher. Pereira tinha mais ou menos 1,90m. Era forte e esbelto.
Estava bêbado, mas reconheceu Satã. Foi até a mesa dele e pegou em seu copo com intenção de provocá-lo. Satã puxou o copo de volta das mãos do sambista. Para evitar atritos mudou de mesa. Pereira foi atrás e xingou Satã de viado. Chamou para a porrada. Satã não suportou mais as agressões. Se levantou e deu uma canhota no ouvido de Pereira. O sambista caiu de cabeça e desmaiou. Satã saiu de fininho do Capela. Chamaram a antiga assistência, hoje ambulância do Corpo de Bombei­ros, que demorou uma eternidade. No dia seguinte, Satã soube da morte de Pereira por terceiros. Resolveu sumir da Lapa. O laudo médico deu como causa da morte um derrame cerebral e livrou Satã da culpa.

Versão 2
O Taufic Lauar, cujo nome artístico era Raul Moreno, amigo de Pereira, diz que ele chegou no Capela acompanhado do sambista e de uma mulher. Satã estava bebendo. Geraldo, bêbado, avistou Satã. Foi até ele e jogou fora o chope. O mitológico malandro não se in­comodou e pediu outro chope. Pereira tornou a jogar fora. Satã ad­vertiu: “Olha, aqui, menino, eu sei que vocês são do rádio e eu gosto de vocês, meu negócio é brigar com a polícia, não quero encrenca com você”. Em seguida, pediu outro chope.
Mas Pereira jogou fora. Satã se levantou e deu umas bolachas no sambista até ele se acalmar, contara Raul Moreno. Ou seja, não tivera soco de esquerda nem o sambista batera a cabeça no chão. Ao ser levado para o hospital, Pereira morrera, na verdade, devido a proble­mas intestinais por conta da bebida. Segundo Rogério Durst no livro “Madame Satã” (Brasiliense, SP, 1985), essa briga pode ter acelerado os problemas de saúde que Pereira vinha passando. Depois de cinco dias internado, ele morreu.

Versão 3
Parece a versão mais fantasiosa e geralmente refutada. Pereira batia na mulher e esta acabou colocando vidro amassado numa de suas bebidas, que provocou sua morte no Hospital Souza Aguiar. Durst chega a duvidar que o soco de Satã causara a morte de Pereira. Segundo ele, a história de Satã ter matado um sambista valente rendeu muito para sua fama.
Ele gostava de trabalhar sua lenda como malandro de grande força física. Mesmo as pessoas da área científica, como os médicos, tiveram dificuldades com Pereira. Para a causa da morte do sambista houvera três atestados de óbito. Dois dão como causa da morte uma hemorragia intestinal e o outro fala de hemorragia cerebral.
O que interessa é que o mito foi construído e Pereira teve o privilé­gio de ter três versões para a sua morte.

Salve Geraldo Pereira, que este ano completaria 100 anos de vida.

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