Feres Sabino *
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Há pouco mais de cinco anos, a ciência brasileira e as nossas Universidades sofriam os maiores ataques daquilo que viria a ser considerado como um subproduto tóxico do chamado “discurso do ódio”.
As Universidades oficiais do estado de São Paulo, através de seus reitores, tiveram de se explicar, em Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembleia Legislativa, que terminou laconicamente, porque a mediocridade apresentada como talento novo não suportou nem o tamanho nem a densidade do mérito de nossas instituições de ensino universitário.
Concomitante com esse ataque, servidor público servia de bode expiatório, para que a corrosão neoliberal afetasse o íntimo do Estado Democrático de Direito, sua fonte de solidariedade social, que tentaram, e em parte conseguiram impor em algumas áreas o individualismo malsão.
Logo em seguida, emergiu o surto da pandemia e, imediatamente, os servidores e servidoras como cientistas descobriam o que facilitava a compreensão da desgraça, e uma onda de solidariedade tomou conta do país, apesar do divisionismo criminoso pregado pelo presidente da república, que não só desacreditou o sistema vacinal do país, não considerou o sistema federativo e a repartição de responsabilidade comuns, como ofereceu o descanso da morte a milhares de brasileiros, pois foi fulminante o atraso calculado da compra das vacinas, como pelo incentivo ao não-vacinar que contamina até hoje número considerável da população brasileira.
Foi implacável a campanha contra o servidor público e seus direitos.
Mas, se na pandemia cresceu o valor dos servidores especialmente dos profissionais da saúde, essa forte visibilidade da categoria aconteceu pela gravidade inusitada do surto epidêmico, e diante dele a dedicação de todos, durante todo tempo. E, mesmo assim, são dirigidas críticas aos direitos constitucionais dos servidores públicos,sendo que o mais criticado é o direito à estabilidade. Na verdade, esse direito garantido pela Constituição coloca a figura do servidor protegida das pressões políticas ou dos poderosos do dia, emissários ou fazedores da maldita corrupção,enaltecendo a responsabilidade de servir a todos, igualmente, assim às pessoas, assim à sociedade.
E, agora, a estabilidade surge com todo esplendor diante dos diamantes, que não morrem, como no filme do 007, e que serve para desventrar e expor a patota da corrupção inesperada, sempre fantasiada de impolutos.
Joias de mais de 16 milhões, não declaradas à Receita Federal, quando de sua chegada, foram retidas por ela, apesar de contar com um almirante como seu protetor indireto, e um assessor seu como transportador.
Joias que teriam sido doadas pelo rei da Arábia Saudita ao Presidente e à sua mulher – disseram.Mas, esse suposto presente teria acontecido muito antes da viagem que fariam, como fizeram. Inacreditável!Sabe-se que para o encontro previamente marcado, os Chefes de Estado trocam justamente no encontro, não antes, nem depois, mas na hora e no dia dele,lembranças de sua terra, geralmente artesanato, geralmente um quadro de artista nacional, algo característico do país, e de valores razoáveis, nunca, jamais, valores vultuosos como as joias do Rei.
Valor de mais de 16 milhões, sem precedentes na história da diplomacia brasileiro e internacional.
Entretanto, tivemos o servidor da Receita Federal, que resistiu à pressão de quatro militares, iniciada pelo Almirante que era Ministro de Minas e Energia, que pressionou para que houvesse a entrega das joias até 48 horas antes da viagem do ex-presidente. E mais,esse servidor se negou a atender ao telefone até seu próprio Chefe da Receita, já que ordem ilegal ninguém é obrigado a cumprir.
Cumpriu-se a lei, e seu cumprimento deve-se ao servidor público civil,que com a segurança que lhe dá a garantia da estabilidade, pode confrontar os militares vestidos de civis, filmados em todo momento dessa vergonha.
A conclusão desse exemplo extraordinário desse servidor público federal reacende a certeza de que o Brasil tem jeito.
E, se os tais presentes são de valores fora dos padrões diplomáticos, e entregues muito antes da viagem presidencial, ganha-se a certeza de que tais joias estão mais para serem propina do que presentes.
Na verdade, só podem ser pertencentes ao patrimônio nacional do Brasil.
* Procurador-geral do Estado no governo de André Franco Montoro e membro da Academia Ribeirãopretana de Letras