Aldo Fornazieri é cientista político e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). Ele publicou um primoroso artigo no Brasil 247 esta semana intitulado “A penúria das esquerdas”. Trata-se de uma análise profunda e contundente sobre a desorientação política e falta de estratégia dos grupos de esquerda no Brasil frente à necessidade urgente de oposição firme ao governo Bolsonaro, o governo mais trágico e perverso da nossa história. Irei escrever aqui sobre isso, tomando como base e mesmo quase fazendo uma síntese do artigo de Fornazieri. Os bons conselhos nunca podem ser desprezados.
Para o articulista, as esquerdas entraram numa posição defensiva desde o golpe de 2016. E dessa situação não conseguiram sair até agora. As esquerdas não conseguem sair das cordas. Até conseguem fazer a crítica, “mas é uma crítica impotente porque não gera fatos, não gera lutas. Mesmo com a revelação de todos os crimes cometidos por Moro, Dallagnol […], os representantes dos partidos de esquerda não conseguem ir além da pesarosa indignação”. E só indignação não basta. É preciso uma tática e uma estratégia competentes de resistência, mas, ao mesmo tempo, de avanço. Só dessa forma seria possível falar de unidade do campo popular e democrático.
Essa posição defensiva e certa perda de rumo são muitas vezes percebidas nas mobilizações de rua. As grandes manifestações, focadas na questão da defesa educação, duramente atacada por Bolsonaro, tiveram maior impacto que outras com pautas mais amplas, incluindo a reforma da previdência, e que, por isso mesmo teriam o condão de mobilizar mais gente. As esquerdas mal sabem lidar com as redes sociais. Desde antes das eleições de 2014, a extrema-direita se articulava nessas redes, organizando grupos e recrutando seguidores, enquanto as esquerdas só recentemente se deram conta desse problema e ainda patinam tanto no seu uso, quanto na organização de grupos.
Falta às esquerdas, sobretudo, direção política. Desde o âmbito local até o Congresso Nacional. “No Congresso, se tornaram a cereja do bolo de Rodrigo Maia […] Enquanto são afáveis com o centrão e com Rodrigo Maia, estes auxiliam Bolsonaro e Paulo Guedes nas pautas econômicas.” Aqui em Ribeirão, a exemplo do que acontece também alhures, as lideranças de esquerda não conseguem uma atuação para fora do público interno, fazem um difícil diálogo com quem votou em Bolsonaro por “n” razões. Limitam-se a uma ação internista, centrípeta, que não cria condições de avanço e crescimento. E, com dificuldade, seguem a agenda nacional de mobilizações.
Para Fornazieri, “muitos dirigentes e parlamentares de esquerda são cristãos mansos. Assim se comportam diante do Judiciário […] Mesmo com todos os açoites que receberam dele, recorrem mais ao STF do que ao povo. Ainda por cima, são maus cristãos: nem combatem o charlatanismo manipulatório e anticristão de muitos pastores e nem interagem positivamente com os evangélicos pobres das periferias para livrá-los do engano e dos falsos profetas.” Este cristianismo manso e mau não serve para as lutas do povo. O Brasil não se libertará da elite predatória sem o exercício bravo do bom combate.
O que Fornazieri cobra das oposições é que não permitam que Bolsonaro continue destruindo o Brasil. Faço minhas as palavras desse articulista: “até quando Bolsonaro pode vandalizar a educação básica e universitária, destruir o meio ambiente, investir contra a saúde pública, desmoralizar os institutos e entidades de pesquisa, degradar o bom senso e a civilidade, atacar o Nordeste, ferir a Constituição e as leis, semear o ódio e o divisionismo? Até quando Bolsonaro seguirá nessa senda perversa sem que seja contido de forma firme?” As esquerdas e as oposições têm o dever de dar uma resposta a essas inquietações e sobressaltos de milhões de brasileiros.