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Artigo da CLT responsabiliza Estado por indenizações

ALFREDO RISK

“Tem um artigo na CLT que diz que todo empresário ou comerciante que for obriga­da a fechar seu estabelecimento por decisão do respectivo chefe do Executivo (…) Os encargos trabalhistas quem paga é o go­vernador e o prefeito. Tá ok?”. A fala em questão é do presidente da República, Jair Bolsonaro, e foi dita em entrevista coletiva no final de março, no contexto da quebra de braço entre o pre­sidente e governadores e pre­feitos, em relação às ações de combate à pandemia do novo coronavírus. Bolsonaro defen­dia e defende a flexibilização na quarentena, enquanto prefeitos e governadores adotavam e adotam ações restritivas.

O artigo citado por Bolso­naro é o 486 da Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT (ver nesta página). Não demo­rou a ganhar relevância nacio­nal. O Tribuna repercutiu com juristas e com a Associação Comercial e Industrial de Ri­beirão Preto – Acirp, o assunto, que ainda é alvo de discussão e questionamentos.

O advogado Daniel de Lucca e Castro, sócio de Brasil Salomão e Matthes Advocacia, diz que a fala do presidente teve uma “vi­são muito simplista ou de falta de compreensão do texto legal”.
Castro cita outro artigo da CLT, o 501, o qual “entende-se como força maior todo aconte­cimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não con­correu, direta ou indiretamente”.

Daniel de Lucca e Castro: visão muito simplista ou de falta de compreensão do texto legal

“Aqui me parece ser quase que unânime a opinião segun­do a qual a pandemia do coro­navírus é, sim, um fato de força maior que autoriza a rescisão dos contratos de trabalho, e isso é até mesmo reconhecido pelo Governo Federal na MP 927. Contudo, atribuir ao Poder Pú­blico a responsabilidade pelo pagamento da indenização de que cuida o artigo 486, da CLT, requer uma análise mais pro­funda, a começar pela recepção, ou não, deste artigo pela Cons­tituição Federal de 1988”, diz o especialista.

O advogado completa que é importante uma análise sobre a presença ou não de motivação do Poder Público para a edição dos decretos legislativos e outras normas editadas. “E aqui nos parece muito claro que sim, qual seja, a pandemia reconhecida e declarada pela OMS – Or­ganização Mundial da Saúde, se fazendo necessárias, então, a adoção de medidas de isola­mento, fechamento temporário de estabelecimentos, e outras. Esta motivação, portanto, é um forte empecilho à aplicação do disposto no artigo 486, da CLT”.

Não há historicamente nenhum relato de fechamento determinado pelos governos como o atual devido à pandemia causada pelo coronavírus

O especialista deixa um alerta. “No caso da necessi­dade de rescisão de contratos de trabalho, acompanhada de dificuldade financeira para pa­gamento de verbas rescisórias, recomenda-se verificar se os sindicatos das categorias profis­sional e econômica assinaram aditivos à convenção coletiva de trabalho com cláusulas não apenas para enfrentamento da pandemia, mas também mais flexíveis no que se refere ao pa­gamento de verbas rescisórias no caso de rescisão contratual, por exemplo”, finaliza.

Segundo o advogado Gus­tavo Santana, nunca o artigo em questão foi tão comentado quanto nos últimos dias. “Não há historicamente nenhum relato de fechamento deter­minado pelos governos como atualmente devido ao caso da pandemia causada pelo coro­navírus (covid-19)”, diz.

Santana diz que é necessária que se verifique, primeiramen­te, a abrangência das indeniza­ções. “A abrangência não inclui de todas as verbas que teriam sido adquiridas pelo trabalho do empregado durante, como por exemplo, 13º salário, férias, horas extras, FGTS, mas so­mente referente às diretamente ligadas à demissão como por exemplo aviso prévio, multa de 40% sobre FGTS, multa por atraso na rescisão”.

O advogado salienta que muitos estudiosos entendem que na realidade o que determi­na o fechamento foi a existência da pandemia e não o governo, e que este somente estabeleceu o fechamento para evitar o mau maior. “Entretanto, entendo que a determinação do fechamento puro e simples sem adoção de medidas distintas de enfrenta­mento da pandemia, bem como o colapso ad eterno da saúde pú­blica por diversos escândalos de desvio de verbas, ensejam a res­ponsabilidade do(s) governos(s) que decretaram o fechamento. Entendo ainda que não só as empresas que tiveram seu fecha­mento decretado diretamente, mas também aquelas que de­pendiam das que foram fecha­das tem o direito de tentar que o Estado lhes ressarça ou pague diretamente o empregado pelos danos causados”, finaliza.

Acirp analisou pedidos e questionamentos
Em nota a Acirp afirmou que seu departamento jurídico analisou o artigo da CLT após questionamentos de associados “e chegou a um entendimento semelhante ao da maioria dos juristas: que as ações com esse objeto têm pequena chance de prosperar no judiciário”.

“Como se sabe, a pandemia do coronavírus foi reconhecida como motivo de força maior pela MP 927/2020. Por essa razão, o art. 486 da CLT, de­nominado de “fato príncipe” é de difícil aplicação em relação ao contexto da covid-19. Isso porque as medidas de restrição tomadas pelo Poder Público foram realizadas por motivo de saúde pública como forma de contenção ao coronavírus (força maior) rompendo com o nexo de causalidade entre a conduta estatal e o dano”, expli­ca a entidade.

A nota completa que o ar­gumento do fato do príncipe fica descaracterizado, “espe­cialmente quando o Poder Público demonstrar que as me­didas foram tomadas baseadas em pareceres das autoridades de saúde e dados científicos com o intuito de preservação da vida e da dignidade da pes­soa humana”.

A Acirp infomou ainda que algumas empresas procuraram a entidade para saber sobre o tema, “mas diante da análise jurídica exposta não quiseram insistir nesse caminho”.

Prefeitura apura notificações
Perguntada se algum em­presário ou empresa acionou a Prefeitura de Ribeirão Preto, a Secretaria dos Negócios Jurídi­cos informou que iniciou busca em sistemas internos, sem, no entanto, revelar se houve ações.

Confira o artigo 486 da CLT
Art. 486 – No caso de paralisação temporária ou definitiva do traba­lho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a conti­nuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável.

§ 1º – Sempre que o empregador invocar em sua defesa o preceito do presente artigo, o tribunal do trabalho competente notificará a pessoa de direito público apontada como responsável pela paralisação do trabalho, para que, no prazo de 30 (trinta) dias, alegue o que entender devido, passando a figurar no processo como chamada à autoria.

§ 2º – Sempre que a parte interessada, firmada em documento hábil, invocar defesa baseada na disposição deste artigo e indicar qual o juiz competente, será ouvida a parte contrária, para, dentro de 3 (três) dias, falar sobre essa alegação.

§ 3º – Verificada qual a autoridade responsável, a Junta de Conci­liação ou Juiz dar-se-á por incompetente, remetendo os autos ao Juiz Privativo da Fazenda, perante o qual correrá o feito nos termos previstos no processo comum.

Situação das empresas em Ribeirão Preto

Com portas fechadas, 60,5% das empresas precisaram realizar alguma demissão

A Associação Comercial e Industrial de Ribei­rão Preto, Acirp, fez em maio, uma pesquisa junto aos empresários da cidade em relação à situação das empresas durante a pande­mia. Entre as 306 respostas, se destacam:
– 43,1% das empresas seguem recebendo pedidos de maneira presencial, seguindo as regras de distanciamento;
– 55,6% das empresas seguem entregando mercadoria de maneira presencial, seguindo as regras de distanciamento;
– 55,9% das empresas buscaram crédito para enfrentar os efeitos da pandemia, das quais 58,2% tiveram o pedido negado;
– 27,1% das empresas negociaram com sucesso o parcelamento de salários dos colaboradores para o período da quarentena;
– 11,4% das empresas deixaram de pagar salários no período;
– 60,5% das empresas precisaram realizar alguma demissão;
– 42,1% das empresas demitiram 1 ou 2 colaboradores;
– 23,7% das empresas não puderam continu­ar funcionando, mesmo de maneira restrita.

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