A diretoria colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou nesta sexta-feira, 4 de junho, a importação das vacinas Sputnik V e Covaxin em caráter excepcional, mas também estabeleceu uma série de limitações para o uso desses imunizantes contra a covid-19 no Brasil. Entre os critérios, o órgão regulador só autorizou aplicar doses em adultos, de 18 a 60 anos, sem comorbidade e ainda não vacinados, determinou monitoramento dos resultados e restringiu o público-alvo a no máximo 1% da população neste momento.
A Anvisa considera que ainda faltam informações sobre qualidade, eficácia e segurança dos dois imunizantes – motivo pelo qual o pedido inicial foi negado em março, no caso da indiana Covaxin, e em abril, para a russa Sputnik V. Entretanto, por votação de quatro a um, a diretoria colegiada decidiu que o atual momento da pandemia no Brasil justificaria aprovar a importação “com condicionantes”. A autorização com as recomendações para diminuir os riscos do uso havia sido sugerida pela área técnica da Anvisa.
“Não há dúvida de que vivenciamos o pior momento da crise sanitária”, afirmou o relator Alex Machado Campos, da Diretoria 5 da Anvisa. Em seu voto, argumentou que a média móvel de 1,8 mil mortes por dia é uma das mais altas do mundo. Também citou altas taxas de internação hospitalar e a presença de novas variantes do vírus, inclusive com a recente chegada da cepa indiana no Brasil. “Há quem fale em terceira onda e novo pico em 4 de julho, caso ocorra relaxamento de medidas não-farmacológicas e se mantenha o mesmo ritmo de vacinação no país.”
Para Campos, mesmo diante de “lacunas de informação” sobre os imunizantes, seria preciso “enxergar o dramático quadro sanitário” e “lançar mão de todas as alternativas”. “Não podemos desperdiçar opções vacinais. Pesa o receio de fulminar plataformas que podem vir a ser viáveis”, disse o diretor.
O relator foi favorável a liberar a importação da Covaxin, por parte do Ministério da Saúde, e da Sputnik V, solicitada por seis Estados – Bahia, Maranhão, Sergipe, Ceará, Pernambuco e Piauí. Pela decisão, no entanto, a primeira compra fica limitada a um quantitativo que só poderia atender 1% da população. Para a Covaxin, a margem é de até quatro milhões de doses. Já para a Sputnik V, cerca de 950 mil doses.
Essa etapa de controle também restringiu a aquisição a lotes provenientes de plantas que já foram inspecionadas pela Anvisa. As doses precisam ter certificado de análise que demonstre ausência de vírus replicante e laudo de estabilidade microbiológica, segundo o órgão regulador.
Apenas adultos saudáveis podem receber a vacina. Exceto gestantes, lactantes e mulheres que pretendem engravidar nos próximos doze meses, grupos que também foram excluídos da recomendação da Anvisa. Os lotes terão, ainda, de passar por análise do Instituto Nacional de Controle da Qualidade em Saúde (INCQS), ligado à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
O responsável pela importação fica obrigado a assinar termo de compromisso e divulgar relatório mensal dos resultados da vacina. Também tem de informar qualquer evento adverso ou novo alerta de segurança internacional sobre os imunizantes à Anvisa. Caso o uso emergencial seja reprovado pelo órgão brasileiro ou pela Organização Mundial da Saúde (OMS), os Estados devem suspender a importação, distribuição e uso dos imunizantes imediatamente.
O debate desta sexta-feira tratou de importação em caráter excepcional e temporário dos imunizantes, mas não discutiu o uso emergencial ou registro das vacinas no Brasil. No caso da Sputnik, os dados analisados foram fornecidos pelo Ministério da Saúde da Rússia. Segundo a pasta estrangeira, 100% dos voluntários teriam apresentado resposta imune estável após tomar o imunizante, com eficácia de 91,6% para casos graves.
Segundo Gustavo Mendes, gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa, há dados incompletos e há preocupação com a presença de adenovírus replicante e, por isso, os lotes serão avaliados. “Os lotes têm de ser aprovados pelo INCQS por meio de análise laboratorial que demonstre a ausência de adenovírus replicante, controle de agentes adventícios e qualidade. É preciso ter certeza da qualidade da vacina que está vindo para cá.”
Já os dados sobre a Covaxin ainda estão incompletos e o estudo de fase 3 ainda não foi concluído, mas sua continuação deve ser realizada no Brasil. Segundo a agência, a avaliação de imunogenicidade está prevista para ser entregue no próximo dia 15 e a avaliação estatística de 25,8 mil participantes, no fim deste mês.
Existe a preocupação com um dos componentes da vacina, embora os dados apresentados tenham apontado 96% de eventos não graves, como febre, dor no local da injeção e dor de cabeça. “É uma vacina de vírus inativado, mas temos uma preocupação com segurança, porque o adjuvante pode desencadear reações autoimunes. O estudo de fase 3 não foi concluído, mas há a solicitação e ele será feito no Brasil como continuação do estudo indiano”, detalha Mendes.