Tribuna Ribeirão
Cultura

Antunes Filho morre aos 89 anos em SP

Um dos mais importantes encenadores do teatro brasi­leiro, o diretor Antunes Filho morreu aos 89 anos na noite de quinta-feira, 2 de maio. Ele estava internado no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, com câncer de pulmão. O dire­tor completaria 90 anos em 12 de dezembro. Nascido na capi­tal paulista, José Alves Antunes Filho foi um dos discípulos dos diretores do Teatro Brasileiro de Comédia.

Ficou conhecido por desen­volver um método teatral expe­rimental que formou diversas gerações de atores. Nos anos 1980, criou o Centro de Pes­quisas Teatrais (CPT), grupo de produção, formação e de­senvolvimento de métodos de interpretação para o ator, atual­mente localizado no Sesc Con­solação, no centro da capital. A última peça sob sua direção foi “Eu estava em minha casa e esperava que a chuva chegasse”.

Na ocasião, o espaço estava tomado por cadeiras espalha­das aleatoriamente e havia uma mesa de cor escura, colocada à frente, no centro. “Explicações? Não dou. O público tem que fazer sua própria dramaturgia: espero que cada um saia do es­petáculo com sua própria his­tória”, observou o encenador. “Todos saindo como uma es­pécie de Marcel Duchamp, ou seja, como alguém que trans­forma o banal em arte.”

Genial e controverso, Antu­nes desenvolveu uma obra for­temente ligada à política e à re­novação estética nos anos 1960 e 1970. Nos anos 80, a peça “Ma­cunaíma” projetou sua carreira, inclusive para fora do Brasil. Ele deu continuidade a seu proces­so de pesquisa em montagens como “Nelson Rodrigues – O eterno retorno” (1981), “Romeu e Julieta” (1984), com Giulia Gam e Marco Antônio Pâmio, e “Xica da Silva” (1988), entre tan­tas outras. Também foram mar­cantes seus teleteatros exibidos na TV Cultura.

Antunes Filho morreu como planejava: sem se afastar do pal­co. Sua última peça, “Eu estava em minha casa e esperava que a chuva chegasse”, estreou em setembro do ano passado no festival Mirada, em Santos. Era mais uma montagem no con­texto de uma carreira extensa – foram mais de 60 anos dedica­dos ao teatro. O diretor, porém, ainda tratava cada peça como uma situação de risco máximo, fazia e refazia as cenas ensaiadas à exaustão, exigia apuro em cada gesto e em cada voz, tinha ga­nas de mudar tudo mesmo que faltassem poucas horas para as cortinas se abrirem.

O encenador, cuja trajetória se confunde com a do moderno teatro brasileiro, não será lem­brado apenas pela sua geniali­dade. Antunes acreditava em trabalho – horas, dias, meses de dedicação, pesquisa e suor. E foi assim, exigindo sempre a potên­cia máxima de seus atores, que se tornou mestre de gerações: Laura Cardoso, Eva Wilma, Miriam Mehler, Raul Cortez, Stênio Garcia, Cacá Carvalho, Giulia Gam, Marco Antonio Pâmio, Luís Melo, Arieta Côr­rea, Lee Thaylor e tantos outros. O ator Paulo Betti escreveu em seu Facebook: “Adeus Antunes Filho! Sua direção em ‘Macuna­íma’ ficará pra sempre na minha memória! Viva o Teatro! RIP”.

Antes da revolucionária versão para a rapsódia de Má­rio de Andrade, que teve reper­cussão nacional e internacio­nal – “Macunaíma” tornou-se a peça brasileira mais vista e aplaudida no exterior –, tra­balhou no Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), onde esteve ao lado dos encenadores italia­nos Adolfo Celi, Ruggero Jaco­bbi e Luciano Salce.

À época, já era um acurado diretor de atores, mas criava peças bem-feitas, quase de en­tretenimento. São desse perío­do criações como “Plantão 21” (1959), obra em que explora re­cursos cinematográficos. Nesse começo de carreira, seu obje­tivo parecia criar com o maior realismo possível. Um caminho que começa a se inverter em “As Feiticeiras de Salem” (1960), uma controversa encenação do texto de Arthur Miller.

O encontro com Nelson Ro­drigues também foi um marco e o autor pairou como obsessão para Antunes pelo restante de sua carreira. Seu primeiro conta­to com essa dramaturgia se deu com “A Falecida” (1965). E irá frutificar em outras obras como “Nelson Rodrigues – O eterno retorno” (1981), “Nelson 2 Ro­drigues” (1984) e “Paraíso Zona Norte” (1989). Nelas, o diretor situou o grande dramaturgo no lugar que lhe é devido. Retirou-lhe do terreno das comédias de costume, chave em que muitos ainda leem suas criações, para situá-lo no campo mítico. Para o crítico Sábato Magaldi, Antunes Filho conseguia “colocar Nelson na altitude dos gregos”.

Em meio a tão vasta pro­dução, também merece um olhar cuidadoso sua incursão pelas tragédias clássicas: caso de “Fragmentos Troianos” (2000) e “Medeia” (2001). Ainda que não tenham sido unanimemente bem-recebidos, os espetáculos marcariam o seu vocabulário estético e vinham depois de um traumático episódio para o dire­tor: a saída do ator Luís Melo.

Desde “A Hora e a Vez de Augusto Matraga” (1986), uma aplaudida versão da obra de Guimarães Rosa, Antunes via em Melo o ator com o qual levaria seu método a uma po­tência máxima. Em “Drácula e Outros Vampiros” (1996) foi obrigado a retroceder em muitos de seus avanços e a buscar novas estratégias para continuar. Mergulhou nas ati­vidades do CPT e de lá a sairia a série Pret-a-Porter. Seria o caminho para Antunes sis­tematizar suas práticas esté­ticas e perseguir o seu sonho maior: ter o ator como senhor absoluto do palco.

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