André Luiz da Silva *
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O mês de março se despede, mas sua essência permanece: a reflexão sobre a luta e o legado das mulheres na história. Entre tantas trajetórias que merecem ser resgatadas, a de Antonieta de Barros surge como um marco de resistência e pioneirismo. Nascida em Florianópolis em 11 de julho de 1901, Antonieta desafiou todas as barreiras impostas a uma mulher negra em um Brasil marcado pelo racismo e pelo machismo estrutural.
Desde cedo, entendeu que a educação era o caminho para a transformação social. Em 1922, criou o Curso Particular Antonieta de Barros, um espaço dedicado à alfabetização da população carente. Seu sonho de cursar Direito foi frustrado por uma legislação excludente, mas isso não impediu que se tornasse professora e diretora do Colégio Estadual Dias Velho, cargo que perderia em 1951 por perseguição política.
Mas Antonieta era muito mais do que uma educadora. Como jornalista e escritora, usava as palavras como arma contra as injustiças, abordando temas como educação, desmandos políticos, condição feminina e preconceito racial. Sua coragem ecoou no Parlamento quando, em 1935, tornou-se a primeira deputada estadual negra do Brasil, ao assumir uma vaga na Assembleia Legislativa de Santa Catarina. Era uma era de mudanças: em 1934, as mulheres finalmente conquistavam o direito ao voto e a serem votadas, e Antonieta se inscreveu na história ao lado de Alzira Soriano (primeira prefeita) e Carlota Pereira de Queirós (primeira deputada federal eleita).
Seu mandato foi interrompido pelo Estado Novo, que dissolveu os parlamentos em 1937. Mas a democracia ressurgia em 1947, e Antonieta voltou a ocupar uma cadeira na Assembleia Legislativa catarinense. Desta vez, dedicou-se à defesa dos direitos dos professores e da educação, tendo sido a autora da Lei Estadual nº 145, de 12 de outubro de 1948, que instituiu o Dia do Professor em Santa Catarina, posteriormente adotado em todo o país.
Antonieta cunhou frases que até hoje devem ser compartilhadas e vivenciadas. Sobre as mulheres: “Foi a revolução quem fez a mulher brasileira o indivíduo que ela é hoje; foi a revolução quem deu à mulher o direito de ter cérebro, de deixar de ser sombra da criatura e ser a própria criatura”. Quanto à missão dos profissionais da educação: “O professor, tem que ser mais que instrutor: – o arquiteto apaixonado do futuro, o plasmador consciente das individualidades, um idealista impenitente. Trabalhar com a alma e o coração, postos no futuro, e ser, desse alvorecer deslumbrador – que se divisa, além, muito além, ainda, o sol, e a própria vida”.
Antonieta faleceu em sua cidade natal em 28 de março de 1952, mas sua história não se perdeu. Pelo contrário, nos últimos anos, seu legado tem sido cada vez mais reconhecido. Em 2019, um mural de 32 metros de altura foi erguido em sua homenagem no centro de Florianópolis. Em 2023, foi oficialmente declarada Heroína da Pátria pelo governo brasileiro, tendo seu nome inscrito no Livro de Heróis e Heroínas da Pátria.
Ao lembrarmos de Antonieta de Barros, reafirmamos a importância de resgatar histórias de mulheres negras que desafiaram o silenciamento e abriram caminhos para tantas outras. Seu exemplo permanece vivo, reverberando na voz de cada mulher que se levanta pela educação, pela justiça e pela igualdade. Concluo com outra magnifica frase de sua autoria: “Há flores e sombras em todas as estradas. Há música em todas as veredas. Não há, minhas queridas filhas, as mais das vezes, é sensibilidade, para percebê-las”.
* Servidor municipal, advogado, escritor e radialista