A juíza Vanessa Aparecida Pereira Barbosa, da 2ª Vara Criminal de Ribeirão Preto, condenou oito agentes da antiga Fundação para o bem-Estar do Menor (Febem), hoje Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (Casa), por tortura de internos em três unidades da cidade em 2003 – Rio Pardo, Ouro Verde e Ribeirão Preto. Eles fariam parte do grupo que ficou conhecido como “Choquinho”, uma referência à Tropa de Choque da Polícia Militar.
Segundo a denúncia do Ministério Público Estadual (MPE), entre 7 e 28 de agosto de 2003, servidores expuseram adolescentes a violência física e psicológica com ordem sistemática de diretores. Os menores foram obrigados a tomar banhos gelados e a ficar nus nos pátios. Objetos pessoais como fotos e roupas foram destruídos.
As penas para os oito condenados variam de dez a 15 anos de prisão em regime fechado. Eles terão direito a entrar com recurso em liberdade. Outros 23 agentes foram absolvidos. Um dos réus teve a punibilidade extinta porque morreu. Em sua sentença, a magistrada confirma o teor da denúncia feita pelo MPE.
“Foram obrigados a andar seminus pelo pátio, em círculos, e tiveram seus corpos molhados com água gelada em dia de frio, bem como foram xingados e ameaçados, sendo evidente o sofrimento físico e mental que lhes foi impingido por mero deleite dos acusados”, diz.
Segundo a ação, uma rebelião ocorrida em 30 de julho de 2003, quando menores tentaram fugir, levou à troca da direção regional da antiga Febem e à intervenção de um grupo denominado “Choquinho”, com funcionários de outras unidades da fundação no Estado. A denúncia aponta que, a partir de então, houve tortura e humilhação de internos em três dias e três unidades distintas.
A primeira ocorreu em 7 de agosto daquele ano, na Unidade Rio Pardo, depois que internos se revoltaram com a proibição de uso de skate e arremessaram carteiras pelos muros da instituição. A situação, segundo o Ministério Público, foi controlada pelos agentes, mas os servidores acabaram colocando os jovens em condições vexatórias.
Em 12 de agosto, as cenas de violência se repetiram no núcleo Ouro Verde depois de uma tentativa de agressão, não consumada por intervenção dos próprios adolescentes, a um guarda que teria feito gracejos à namorada de um dos internos. Em 28 de agosto, diferentes agentes agiram violentamente nas unidades Ribeirão Preto e Ouro Verde “para castigar os menores e imprimir neles temor”, segundo a sentença.
Os atos ocorreram depois de uma reunião em que a direção coagiu funcionários a atuar caso quisessem permanecer empregados, de acordo com a Promotoria. Alguns adolescentes considerados problemáticos eram agredidos com mais frequência que os outros, segundo o MPE.
De acordo com as denúncias, todas as intervenções sucederam situações controladas dentro das unidades. O Ministério Público também registrou que, durante as atuações dos agentes, os sistemas de telefonia da Febem foram desligados de propósito.
Há ainda registros de provas forjadas por determinação de dirigentes à época para tentar legitimar as ações, bem como de que somente adolescentes com lesões menos graves foram submetidos a exames de corpo de delito. A ação tem 150 páginas foi baseada em relatos de vítimas, testemunhas e acusados, e com a confirmação de detalhes como os apelidos usados pelos agentes.