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Ana Setton chega com brilho nas composições

Por Julio Maria

Ana Setton pode dizer que tudo, ou pelo menos a segunda parte daquilo em que ela se transformou nos últimos anos, se deve a uma pequena senhorita chamada Dora. Antes de Dora, Ana cantava. Já havia descoberto sua voz e os lugares onde ela se dava melhor. Cantou primeiro em um bar ao lado da PUC, em Perdizes, cantou samba e choro, foi ao cancioneiro norte-americano e se apresentou ao lado de Toquinho até chegar ao Baretto, do Hotel Fasano, Jardins.

Mas Dora nasceu e Ana, a mãe, começou a ver um mundo com cores que não via. “Ela nasceu e fez uma virada na minha história.” As cores viraram letras e Ana passou a escrevê-las para preencher harmonias e melodias criadas pelo marido pianista, Edu Sangirardi.

O primeiro álbum de Ana chega assim, com o frescor e o brilho de uma descoberta de criança. Ana e Edu fazem uma canção que habita o ponto tão difícil de se chegar: profundo e abrangente, luxuosa e sedutora. Em geral, artistas pagam o preço por caminharem em apenas uma dessas extremidades. Quanto mais sofisticados, mais se distanciam. Quando querem aproximar, ficam rasos.

Há algumas respostas para isso. A canção não tem harmonias jazzísticas intrincadas, mas sua embalagem foi pensada por Swami Jr, um músico que potencializa a alma de quem está a seu lado. E os músicos que criam as atmosferas são, além de Sangirardi, o violonista e guitarrista Fabio Gouvea, o saxofonista Jota P., o baixista Bruno Migotto e o baterista Jonatas Sansão. Uma gig afiada de jazz brasileiro que não desperdiça notas.

Uma das mais belas, com o mesmo impulso familiar e força de pertencimento rápido em quem ouve, é Toada. Minha Voz, Minha Vida, de Caetano, ganha outra vida e deixa na frente a beleza do timbre. Ela gravou ainda o standard Nature Boy, de Eden Ahbez, e A Lenda do Abaeté, de Caymmi. Roda da Sorte é de Sangirardi, Toquinho e Paulo Cesar Pinheiro. Há um single, que não está no disco, da canção Sim ou Não, de Djavan, com aqueles versos que sequestram pessoas nos primeiros segundos. “Um dia preciso ir / Na casa da solidão / Só pra saber / Se o que sofri / Dá pra beber / Outra paixão.” Uma regravação que surgiu no estúdio, depois que o disco estava pronto. Ana queria fazer uns vídeos com o repertório e, em um dia, sobrou tempo. Sim ou Não não poderia ficar de fora, ainda que a Casa da Solidão esteja tão distante desde Dora.

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